Começou o ano de 2023 de fato no Rio. Uma semana depois do fim do Carnaval, os últimos blocos ainda arrastam multidões no Centro da Cidade e, a seguir, ficam para trás as festas, os abraços, os beijos românticos e o frenesi das ruas. Deixa um gosto de quero mais, aguçado por aqui devido à pandemia. Este Carnaval foi além da celebração, servindo também de desafogo contra a opressão que invariavelmente nos cerca. Por isso mesmo, muita gente o viveu ainda mais intensamente, um fato que não deixa de ser absolutamente compreensível.
Depois que as serpentinas foram varridas do chão, vem a realidade e ela não é nada fácil para nós, cariocas, da gema ou não - tanto faz.
A esperança que já sopra noutros lugares do Brasil, motivada pelo novo governo que, goste-se dele ou não, já dá seus primeiros sinais de ação, ainda é bem rara no Rio.
Talvez nunca tenhamos sido uma cidade tão partida como agora, onde a questão econômica dói como faca rascante.
A miséria está estampada a olhos nus, basta um pouquinho de atenção. O tal normal, que viria depois do controle da pandemia, nunca chegou. Salvo o tradicional bolsão elitista da Zona Sul e de outras localidades como a Grande Tijuca, o desemprego sugere a cidade num grande feriadão, vazia. Mesmo em locais de grande circulação comercial como no Méier e em Madureira, a diferença de público circulante é nítida quando comparada ao passado. Ok, o transporte público continua lotado, então como explicar isso? Simples: o sucateamento, a ineficiência e a desorganização.
O coração do Centro bate descompassado, inchado, com risco de morte. A região continua sofrendo com seu completo esvaziamento. A hora do rush às vezes sugere que você está num feriado, de tão vazia. Com mais de dez mil unidades fechadas, muitas antes da pandemia, o Centro tem uma reação muito lenta com alguns retrofits que mais parecem gentrificacão. Aliás, a própria história do retrofit é bastante imaginativa, porque muitos prédios da região possuem apenas um banheiro por andar, típico de modelos construtivos de outrora. Como transformá-los em habitação?
O subúrbio mantém sua luta pela sobrevivência e identidade. Cada vez mais as ruas estão vazias, salvo os tradicionais pontos de concentração. Não é surpresa alguma que, se você resolver vir de Cascadura para o Centro às 21 horas, não passe por uma viatura policial sequer. A política comercial está deteriorada. A insegurança é a regra principal. Nossa sorte é que brotam iniciativas populares próprias, como a maravilhosa Livraria Belle Époque no fígado do Méier - cada bairro suburbano precisava ter uma Belle também -, porque a única saída que temos está na conscientização social e ela depende dos livros, dos discos e da arte em geral. É claro que, do calçadão de Madureira à batata frita de Marechal Hermes, o subúrbio carioca nos oferece momentos maravilhosos - o problema é que são para poucos habitantes.
Que 2023 desafogue o nosso nó na garganta.
No comments:
Post a Comment