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Friday, December 28, 2007

Mais do mesmo

Entra ano, sai ano, as coisas não mudam muito, a não ser pela aceleração do crescimento (que é também uma pequena reação aos anos de estagnação d'outrora) e pela nova geração de celulares.
Este ano já nasceu morto.
Perdi minha mãe na terra com quatro dias.
O resto, foi quase lucro.
Vi os mesmos jogos de futebol e gostei de quase todos. Futebol é bom; desagradável é o que o cerca. O Fluminense ganhou o Brasil, o Fluminense é o que há.
Alguns shows, alguns filmes, muitas músicas.
Namoros que vão e vêm, namoros de uma noite somente, namoros de meia noite. Agora sou sério. Acho.
Lá fora, faz um calor danado e deve ter cem, duzentas mil pessoas na orla. Praticamente nenhum tumulto. Traficantes também tiram férias, acho. Nem tanto.
Acho estranho quando as pessoas falam de feliz natal e de boas festas.
Festa?
Não quero ser um chato, mas há um ano os bandidos incendiaram o ônibus com gente dentro, ninguém mais fala. Arrastaram o menino por quilômetros, ninguém comenta. Bala na cabeça do garoto no Clube Federal, cadê? Onde está a memória insana dessa gente?
Festa?
Final de ano, fui bem recepcionado por uma querida num daqueles apartamentões da Atlântica. Teve amigo oculto. Um amigo da turma, educado, começou a prosear. Outro camarada chegou. Falavam de Lula, do roubo, da corrupção, coisas que me deixam até cansado. Tudo bem. Problema foi quando um defendia a ditadura como meio de "salvação do país". O outro dizia que "tem que remover essas favelas inteiras".
Aí eu me assustei.
Perdi meu tio por conta da ditadura, já estudei o tumor que foi na vida carioca a remoção noutros tempos. Entendo quem defenda isso por desespero com as coisas de hoje ou ignorância com o passado. E só.
Noutros tempos, eu ia defender o meu discurso. Ali, naquela altura de dezembro, desisti. Susto em um segundo; silêncio, noutro. Melhor ver o mar de Copacabana, a construção do palcão onde vai ter muito fânqui na "festa da virada".
Virada?
Não passou a CPMF. Que maravilha. Ô. Tudo em nome do "povo" que é sacrificado porque já paga impostos demais. Certa verdade. Imposto para o refrigerante, o pão, o jornal, a luz, o gás. Mas a matemática me pareceu um tanto esquisita: boa parte do povo não paga CPMF porque simplesmente não opera com conta corrente. Verdade seja dita: uma pequena parcela do condado brasileiro não gostava desse imposto porque ele é mais enrolado de sonegar.
Os brasileiros estão aí. As televisões mostram seus programas de retrospectivas e seus "colar, colou!" - os pilotos de séries que, se derem alguma audiência, entram no ano que vem em grade fixa. A maioria não dá.
O doismileoito terá seu carnaval encolhido. Carnaval, para os pouco afeitos, não é somente o tempo de desfiles, mas sim todo o período compreendido entre primeiro de janeiro e o dia seguinte ao Desfile das Campeãs. Aí, o ano finalmente começa - e com desconto mas sem CPMF.
Ao que tudo indica, Bob Dylan vem cantar no Brasil, é sinal de alento.
Um bom campeonato de futebol, o carioca, e os times na Libertadores. Será divertido.
As pessoas vão encher a cara no dia trinta e um, muitos não abrirão mão do pó. Uma ou outra suruba, uma ou outra devassidão. Males diversos, creio.
Eu não faço planos.
A vida tem dois dias letivos: um quando você nasce, outro quando você vai embora. O resto é intervalo para amor, dor e pensamentos ao longe.
Eu queria ter visto Ana Klein, mas não consegui. Alessandra, felizmente sim.
O Zé vai casar, finalmente ouviu algo que eu disse.
Conseguindo viajar um pouco nos finais de semana, vendo o Fluzão e namorando normalmente, além de pagar as contas, estou quase satisfeito. Nada de grandes ambições.
Tomara que não me encham muito o saco com essa baboseira de "O governo do Lula é uma vergonha com toda essa corrupção"; já li e pesquisei muito sobre o assunto, muito além da leitura de jornais rasteiros e da falácia de senadores que têm a carteira profissional virgem.
Tomara que os traficantes matem menos e trafiquem menos. E que as pessoas cheirem menos pó.
Tomara que se roube menos.
Tomara que, daqui a um ano, tenha menos gente hipócrita falando em união, amizade, fraternidade, enquanto se nega a dar um real para o mendigo ou sonha com a remoção daquelas malditas favelas lá de cima.
E basta. Mais do mesmo já melhora alguma coisa.
Um beijo a quem devo.
Até.
Paulo-Roberto Andel; 28/12/2007

Thursday, December 13, 2007

Boa ação

Ontem, tarde da noite, estive refestelado no sofá enquanto girava incessantemente os canais da tevê. Houve um estalo, e lembrei-me de que ocorria a votação da CPMF transmitida pela TV Senado - sempre um bom programa para se rir ou chorar, dependendo de cada caso. Deixo claro que acompanhar a trajetória dos nobres parlamentares é fundamental, por mais inacreditáveis que sejam seus argumentos para votar nas questões á, bê ou cê, "pelo povo".

Certa hora, apareceu o Presidente Sarney, hoje Senador, em seu discurso. Naquele instante, esqueci-me das bazófias senatorais - até porque a CPMF, que desagrada mil vezes mais a classe empresarial (e dela cobra) do que o "povo" propriamente dito. Assisti um pouco e mudei de canal, sem prestigiar o cinismo do Sr. Virgílio e a posterior "comemoração da vitória", como se a vida de milhões de pobres nada valesse.

Sarney ficou na cabeça. Lembrei dos tempos de presidência. Confusos, por sinal.

Alguém me contou que a eleição era de mentirinha, somente no Congresso, e todos sabíamos que Tancredo venceria - o Brasil era caótico, mas Maluf era demais. Eu voltava da praia quando alguém gritou num bar da Domingos Ferreira:

- O Tancredo venceu!

Nada perto da ampla movimentação meses antes, por conta das manifestações pelas eleições diretas.

Tumulto mesmo foi quando Tancredo passou, era noite de 21 de abril. Entrou o Brito na televisão e comunicou. O enterro parou o país, era gente de todo lado. Menos pela boa trajetória de vida e mais pelo que significava aquele momento, Tancredo entrou para a história. E Sarney, que nem pensava em ser vice-presidente poucos meses antes, ocupou a cadeira.

Veio a febre do Plano Cruzado e a esperança de se controlar a inflação. Graças ao dinheiro doado por meu querido tio, que viria a falecer um ano e meio depois, consegui até fazer uma faculdade particular com os preços das mensalidades sob "congelamento" - se a memória não falhar, eram quatrocentos e sete mil cruzeiros em fevereiro, e passaram para quatrocentos e sete reais durante o ano todo. pelo menos, até a eleição, quando o "descongelamento" de preços foi para o espaço e a inflação voltou invencível.

Tempos de Sarney eram também tempos de Moreira Franco no Rio de Janeiro, e a promessa de acabar com a violência em 180 dias. O resultado, todos sabemos.

Eu não arrumava emprego, a não ser temporariamente na gigante Mesbla, a mesma que depois foi posta a pique pelo Sr. Mansur. Consegui a duras penas, nem tão duras assim, passar para a escola pública de qualidade. Dureza mesmo, era no bolso.

Tudo isso me veio à tona com a simples vista do discurso do Senador.

Agora, marcante mesmo, nos tempos do Sarney, foi uma certa noite, que deve ter sido no segundo semestre, depois do fracasso na Copa do Zico. Estudava em Niterói; para voltar, pegava o velho 996, velho mesmo, modelos Mercedes Benz dos anos 60. O caminho rotineiro de sempre: Ponte, Rodoviária, Santo Cristo, Santa Bárbara, Laranjeiras e Botafogo, até saltar na praia em frente à Sears. Ali, novo ônibus, em geral o 434, para saltar na Siqueira Campos e rever a turma no Bar do Seu Manel - o Xuru, Coruja, Pedro, Henrique, Ana, João.

Numa das voltas, eu saltei do 996 e, prestes a fazer a baldeação, uma senhora me pediu ajuda. Era bem velhinha, redondinha, tinha um quê de Tia Anastácia, mas com certa dificuldade para falar. Carregava uma bolsa grande, parecia vir de longe, de viagem. Estava com um papel rascunhado, mal-traçado, que tinha um escrito de uma secretaria que parecia ser um órgão público, mas sem o endereço, e procurava pelo filho que estava no trabalho.
E começou a chover.

A primeira coisa que pensei foi em tomar um táxi, só que eu não tinha um tostão no bolso que não fosse a passagem de ônibus. Arrisquei, estiquei o braço e um sujeito parou. Expliquei o fato de que estava tentando ajudar a senhora, já eram cerca de onze da noite, ele topou colaborar. Descemos São Clemente, Real Grandeza e Voluntários, até que lembrei de um antigo arquivo que funcionava na Praia, entre Voluntários e São Clemente, justamente, e pedi ao motorista para que fôssemos para lá. Na porta, comparamos o rascunho e era exatamente o local procurado. Saltamos, o motorista veio conosco. Depois de minutos de espera à porta, fomos atendidos. Ela balbuciou e, felizmente, o filho dela estava lá mesmo, trabalhando como vigia.

Deu certo. Ainda cheguei a ver pela fresta do portão mãe e filho se abraçando.

Despedimo-nos, o taxista me deu carona até em casa - ficou até emocionado, ele disse que era do Norte, que não via a mãe desde muito tempo e queria voltar à terra. Deixou-me na Siqueira. No bar, não tinha ninguém, eu resolvi subir logo para casa. Minha mãe estava sozinha pois, naquele tempo, meu pai tinha tentado uma experiência de trabalho em São Paulo, devidamente fracassada a posteriori.

Cheguei e dei o tradicional abraço na bolinha mãe, para depois contar do fato. Ela ficou contente e emocionada, até porque durante cinquenta anos procurou a família perdida (naqueles tempos, eram trinta). E disse que tinha ficado orgulhosa de mim. Fiquei contente também. A metros dali, a velhinha também estava abraçada ao filho, feliz. No fundo, foi apenas uma boa ação, daquelas que a gente devia fazer a toda hora e que eu, compromissado com a causa pelo fato de ainda ser escoteiro, buscava a todo instante. Quando não buscava, a chance da boa ação surgia logo em frente.

Hoje, nesse meio de dezembro, uma vez que ninguém vai me dar o caminho para eu reencontrar minha mãe, e nem eu vou poder mais ver a velhinha abraçando o filho, não deixa de ser uma boa associação de idéias que a imagem do Senador Sarney na tela me traga algo tão bom - e não exatamente o que eram aqueles tempos para muitas pessoas.

Um gosto de abraço infinito, uma boa lembrança. Excelente.

Daquele tempo de escassez, talvez uma das únicas.


Paulo-Roberto Andel, 13/12/2007

Friday, December 07, 2007

Pré-conceitos

Era tarde duma quarta, eu conversava ao telefone com um amigo que mora no Planalto, não necessariamente na sede do Governo Federal. Nada de i-meios ou emessêni, telefone da antiga, falar pra escutar e vice-versa. Contava-me ele das pressões que recebe, na condição de solteiro bon vivant, para celebrar um compromisso oficial, fato que o incomoda pelo preconceito que envolve este tipo de situação.
Eu compreendo.
O fato de ser solteiro, gostar de poesia e arte contemporânea rendeu-me e rende muitas pechas.
Tenho outro amigo que crê piamente em que eu seja virgem, por mais patético que isso possa ser, dado que ele não me viu com namorada a tiracolo, isso porque não somos companheiros de vigília noturna e nunca fomos - mas, além de amigo, ele ganha desconto porque também crê piamente em outras coisas que eu, nem sob o efeito dos mais potentes entorpecentes, colocaria fé. Por outro lado, cada um que regule a sua vida e saúde sexuais. Virgindade é direito, abstenção sexual ou mesmo luxúria plena, cada um que cuide de seu corpo.
Pensei em fazer uma listinha para entregar-lhe, mas soaria cafona e desrespeitoso com quem já amei - e com quem amo. Vida que segue.
Estamos em 2007 (ou, ao menos, deveríamos estar sob o ponto de vista cronológico), o velho modelo do eu-te-amo-para-sempre-e-vou-viver-junto-com-você tem seus desgastes - ainda que a mulher amada seja dádiva da natureza - e o resultado é que, num mundo de gente mal-casada, mal-namorada, mal-apaixonada e conformada com a mediocridade, poucos pares das novas gerações podem realmente falar da essência do eu-te-amo (Dara, argh). Amar é bom, mas não é para todo mundo.
Amor, sexo, casal homem-mulher. Tudo isso está envolvido pelo manto do preconceito. O casado que tem má vida sexual, o solteiro que deve ser gay por que não casa, o gay bonito que não fica com mulheres por mais que elas insistam em "regenerá-lo", as mulheres que não se separam para a família não apedrejar. A família que não conversa sobre sexo porque tem "respeito". Esqueci do sujeito que casa ou namora longamente para mostrar aos outros que não é um "encalhado", mesmo que a relação em si não seja das mais emocionantes. Melhor dizendo, uma porcaria.
Telefone desligado, pensei em preconceito. Outro. Outros.
Eu tinha uns nove anos de idade. No intervalo entre um outono e outro, mudei de um apartamento de 300 metros quadrados (onde poderia apresentar ótima forma na capa duma "revista" Caras) para um quarto-e-sala de 40. Tinha um garoto da terceira série, chamava-se Márcio, morava na Lacerda Coutinho. Encontrei-o na rua, chamei-o para jogar botão em minha nova minimansão. Ele apareceu. Lembro-me de como ele olhava aterrorizado para as paredes, para a cozinha, que eram humildes mas extremamente limpas e bem-cuidadas por minha amada mãe - estava acostumado ao gigantismo do antigo apartamento. Ficou lá em casa uns dez minutos, foi embora com cara de horror. Amada mãe até se assustou. Eu não tinha entendido muito bem, muito tempo depois é que saquei: preconceito contra a pobreza. Um sujeito de nove anos ser amigo do apartamento de outro é algo que desafia definições - e, talvez, quem sabe, possa explicar um pouco do que é o Brazyl e o Rio de Janeiro em que vivemos hoje. Primeira vez que me deparava com algo ruim desse jeito - até ali, minha vida era refrigerante, praia, botão, futebol e andar por Copacabana, desimportando quem era filho de barão ou porteiro.
Preconceito. O conceito prévio, normalmente embebido em ignorância.
Colégio, crianças, show de crueldade. Eu nem tinha onze anos, os galalaus de quinze, dezesseis enchiam a paciência porque minha voz era fina e eu tinha um metro e meio. Culpa minha dos caras serem reprovados três, quatro vezes. De vez em quando reencontro um pelo caminho, e incomoda ver que o dito fala das mesmas coisas, sem evolução, feito tivesse ficado em congelador tal como um Buck Rogers, só que sem o menor traço de heroísmo.
Era escoteiro, o pessoal dava gritinhos na rua, acho que por andarmos de uniforme. Estranho, pareciam as mesmas vozes daqueles caras que, passando de carro pela avenida Atlântica, xingavam os transeuntes em alta velocidade.
Faculdade, quando eu citava algum escritor ou poeta, alguém franzia a testa, com certa reprovação. Era o Instituto de Matemática e, em mais de uma vez, ouvi alguém dizer que ali era lugar de se calcular, não de ler. Deve ter sido uma das três maiores besteiras que ouvi na vida. Ou quatro. Oito. Teve uma outra criatura feminina de ofício que xingou meu nome aos quatro costões, e faz isso há dez anos, mesmo devidamente casada, apaixonada e feliz: tomou raiva de mim porque não a beijei e fiz certa força para não beijar. Era feia, um fato, mas não foi a principal razão do esforço: o problema mesmo era que fedia. As que eu devo ter beijado bem até hoje me chamam de Paulinho, me convidam para almoçar, nunca me xingaram. Grapete: quem bebe, repete. Deve fazer algum sentido.
Falaram mal de mim quando emagreci dez quilos e quando engordei trinta, com dez anos de diferença. Quando era moreno de praia, me chamavam de vagabundo; agora, branco, virei "esquisito".
No Brasil, o que não falta é segmentação. Gente disposta a tudo por quinze minutos de fama, a largar mão de qualquer senso ético em prol de bens materiais, luxúria e pequenas riquezas. Tudo raso, falho, trôpego. Você tem que ser bonito, rico, desejado, poderoso. Você tem que ter o mundo aos seus pés, não pode broxar, não pode falhar, não pode chorar, não pode deixar de mostrar aos outros o que tem de melhor. Você tem que ser o máximo, mesmo que isso signifique ser a maior lorota da semana, mês ou ano.
Falar de pobreza, um dos pontos-fortes do preconceito é simples. Basta procurar um nobre no meio do povo pelas grandes avenidas cariocas nestes tempos de pré-natal.
Solidariedade? Que tal começar por abraçar os mendigos, tão seres humanos como nós? Eles podem até feder, mas você não precisa beijá-los na boca.
Encheram meu saco por trinta anos. Agora é a minha vez. Arrá!
Eu não gosto de funk. Eu não gosto de viajar de avião. Eu não gosto de Arthur Virgílio. Eu não gosto de dirigir carros. Eu não gosto de bares cheios, de barulheira e da mais abominável expressão ideomática contemporânea: "galera", que não significa mais os velhos barcos. Dou gargalhadas quando falam que Ivete Sangalo é a maior cantora brasileira. Do Mainardi, quase não se fala porque ninguém o conhece. Eu não gosto dos jornais "Meia-Hora" e "Extra". Eu não gosto dos arroubos intelectuais da Luciana Gimenez. Eu não gosto da mídia que impõe a novela, o Flamengo, os vespertinos da televisão de domingo, o axé, o pagódi, os neo-sertanejos. Eu não me interesso pela carreira solo de Sandijúnior. Eu não gosto de suruba e de gente descontrolada pelo uso de drogas, legais ou não. Por isso, sou preconceituoso?
Tomara que sim.
E que o Márcio não tenha se tornado um boboca.
Paulo-Roberto Andel, 07/12/2007

Saturday, December 01, 2007

IMPRESSÕES - A pátria da debilidade

Tal como tantos outros brasileiros, senti-me humilhado e chocado ao pensar sobre o que seria a chamada cidadania num país que, por força de "contingências", permite que uma adolescente detida por furto seja presa numa cela com uma dezena de detentos, sendo estuprada várias vezes ao dia em troca de comida, água ou outras necessidades básicas, e ainda sendo filmada por "policiais" através de aparelhos celulares, que registraram criminosamente o horror do pior crime contra a mulher - conforme soubemos ocorrer no Pará, após ampla divulgação na mídia. O Estado, que deveria garantir segurança a qualquer cidadão, preso ou não, é promotor de tamanha crueldade através da polícia - inspetores e delegado (a), que conduziram o nefasto processo.

Dias depois, para tentar explicar o inexplicável, foi a Brasília o então chefe da Polícia Civil paraense, cujo nome não será citado neste texto por absoluta indignação. Coroando o show de atrocidades que envolveu tal caso, o dito chefe referiu-se à adolescente torturada como uma "débil mental", por, em nenhum momento, ter afirmado ser "de menor". Em suma, a culpa de todo o sofrimento que a garota sentiu, para o dito chefe delegado, era dela mesma. Sabemos que, no Brazyl, quase tudo é possível - mas aí, neste caso, passaram da conta. Palhaçada tem limite. O chefe perdeu o cargo. Que descanse em paz.

Será que é preciso comentar o desrespeito constitucional quanto ao fato da proibição de homens e mulheres presos dentro de uma mesma cela?

No próprio Pará, outros casos semelhantes foram denunciados. Não é problema de lá, bem sabemos. Procurando-se, acha em outras praças.

Dizem ser o Brazyl um país pacífico. Não temos guerra.

Com as cadeias que temos, e certos policiais, não precisamos de nenhuma Bagdad.

No mais, o dito chefe desrespeitou um coletivo de portadores de necessidades especiais, relacionadas a questões de saúde mental.

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Alguém imaginaria Suzane Von Richthofen numa cela com homens? Isso aconteceria hipoteticamente?

Nunca.

Suzane, que não está presa por furto, como a pobre menina paraense, mas pelo vil assassinato de seus próprios pais a pauladas, é um símbolo de perversidade.

Loura, bonita e rica. Jamais passaria por situação semelhante de estupro na cela, a não ser que quisesse.

A prisão no Brasil tem várias faces. Cada uma delas, de acordo com a condição financeira do detento - e isso faz pensar sobre o que é realmente no Brazyl a chamada "livre iniciativa".

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Apesar de cobertura televisiva compatível com o tamanho da atrocidade, a vergonha registrada no Pará perdeu terreno de mídia para os chamados "devaneios" de Chávez.

"Ditador" de plantão, segundo as autoridades jornalísticas.

Olhando para nossas próprias cadeias, deveríamos pensar sobre a tortura nelas praticada - provavelmente muito pior do que o resultado de todos os possíveis atos ruins de Chávez até a data de hoje, como comandante bolivariano.

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Juvenal foi um bom zagueiro. Sofreu o pão que o diabo amassou na Copa de 1950.

Naqueles tempos, boleiro não ganhava milhões de dólares.

Juvenal parou, ficou pobre, doente. Depois, miserável. Ainda vive, numa casa de pau a pique, oitenta e nove anos. Tem artrose, não anda. Deu no Fantático. Juvenal não viu, pois não tinha televisão. Depois ganhou uma velha, de presente.

O Brazyl é sede da Copa de 2014. Juvenal jogou no Flamengo e no Palmeiras.

De Parque Antactica, a única notícia é a de venderem um kit com pedaços de grama do Estádio Palestra Itália, mais um poster e um CD com o hino do clube, cantado pelos cracks da pelota. Setenta reais.

Márcio Braga, presidente do CRF, afirmou que "se o clube não puder ajudar Juvenal pessoalmente, ele mesmo o fará do próprio bolso". O Flamengo quer comprar o Maracanã e não pode ajudar Juvenal?

Palhaçada tem limite.

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A CBF, claro, não se manifestou.

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Somos ou não uma pátria marcada pela debilidade?

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Paulo-Roberto Andel, 30/11/2007

Thursday, November 08, 2007

Missa dos escravos (Slaves' Mass)

a missa dos escravos
era quilombo disfarçado
num veloz yorubá,

era fuga do inferno
para a bênção de oxalá,

a missa era canto,
era pranto de dores,
desesperança em fé

a missa dos escravos
era o alívio das almas
fatigadas, estupradas
sem piedade ou compaixão,
almas dispersas,
malversadas no riso do sinhô

era missa, era fuga
era passo ao cadafalso,
a corda, aos olhos era fim
missa diadorim
noite dos náufragos
era silêncio de amém, obá!
a missa dos escravos
era sempre a nação zumbi.


(Para Hermeto Pascoal)

Paulo-Roberto Andel, 08/11/2007

Ultimamente

era certa noite de terça-feira, eu fitava uma morena
e lembrava de minha mãe,
minha querida mãe, que se escondeu no infinito,
no longe d'orizonte preto
que não tinha Xuru, nem João e nem Luiz
ou Bustamante,
um disparate.

as pessoas têm morrido demais, de forma que só as vejo em mim,
em meus pensamentos que perambulam nas calçadas,
entre os passos apressados das grandes ruas,
pelo aperto das gentes nos veículos coletivos,
nos corredores de acesso aos estádios de futebol,
nos carros engarrafados nos arredores da orla azul de mar.

as pessoas têm morrido nas conversas de bar,
onde outrora é hoje,
e falecem nos dias de sol, com música de rua
em alto-falantes e batidões

as pessoas têm fenecido no funk, no rock,
sem axé nem bênção, sem cânfora nem bálsamo

as pessoas morrem nos feriados, nas férias
e numa terça-feira qualquer, aos olhos duma morena

e justamente por morrerem muito, são fagulhas de vida,
permanentes, e faíscam pelo eterno breve.


Paulo-Roberto Andel, 09/11/2007

Wednesday, November 07, 2007

Baticum

cada
passo curto
que eu peço
ao rosa firme
da tua boca
parece um eco
de caverna
e bate fundo
no meu coração
baticum de cuíca
samba lento
que sorvo
feito bebida
é um cale-se de amor

Paulo-Roberto Andel, 07/11/2007

Penta em pencas

O que não falta no futebol brasileiro são equívocos das mais variadas naturezas, e a recente discussão sobre o propalado pentacampeonato dos flamengos contra os são-paulinos vem bem a calhar como reforço de tese.

Primeiro ponto, a bobagem de se discutir a origem do que se chama de “campeonato brasileiro” – o que, para alguns, data de 1971. Levando-se em conta, por exemplo, que a Taça Libertadores começou em 1960, tendo como participantes os representantes nacionais dos países sul-americanos, é claro que havia um meio de representação para tal acontecimento. E assim foi: em 1960, o E.C. Bahia, campeão brasileiro de 1959, disputou a Libertadores, na condição de campeão da Taça Brasil. Dali em diante, o campeão da Copa Brasil foi sempre o representante oficial. A Taça era disputada pelos campeões estaduais de todo o país, com a diferença de que os times do Rio de Janeiro e de São Paulo entravam automaticamente na fase final do certame, em modelo muito parecido das primeiras disputas da Copa do Brasil, torneio criado em 1989.

A Taça Brasil teve dez edições, com a seguinte distribuição de títulos: Santos, 5 (1961 a 1965); Palmeiras, 2 (1962 e 1967); Bahia, 1 (1959); Botafogo, 1 (1968); Cruzeiro, 1 (1966).

No mesmo ano de 1967, o então Torneio Rio-São Paulo recebeu uma ampliação, com o convite de times das regiões Sul e Nordeste, como Grêmio, Inter, Atlético Paranaense e Santa Cruz, passando-se a se chamar Torneio Roberto Gomes Pedrosa, o popular “Robertão”. A Taça Brasil permaneceu como torneio paralelo até o fim de 1968 – a partir de então, o Robertão tornou-se a única competição nacional do Brasil Em 1969, o torneio passou a ser denominado Taça de Prata. Em suas quatro edições, os campeões foram: Palmeiras (1967/1969); Santos (1968) e Fluminense (1970). Até aqui, já tínhamos 11 anos de competições nacionais, inclusive com anos em que um time havia ganho duas competições nacionais (Palmeiras em 1967) e que havia dois campeões no mesmo ano (Santos e Botafogo, 1968).

Então, em 1971, criou-se o chamado “Campeonato Brasileiro”, que já existia de fato há mais de uma década. E deveria ser chamado de torneio ou copa, pois o campeonato pressupõe jogos de ida e volta entre todos os participantes, com acesso e descenso, e isso jamais ocorreu de forma correta entre 1971 e 2003 – mesmo depois, como veremos a seguir. A dita nomenclatura de “Campeonato” Brasileiro nem era unânime à época; álbuns antigos de figurinhas daqueles podem mostrar os nomes de “Taça Brasil” ou “Copa Brasil” em seus títulos. Posteriormente, “Taça de Ouro”.

A cada ano, houve uma fórmula de disputa do torneio. A cada temporada, o inchaço provocado pelos interesses políticos da ditadura militar, num princípio de se “integrar” o Brasil. Depois de anos incríveis, como 1979 (com 96 clubes e os times paulistas entrando automaticamente na fase final de disputa) e 1982 (onde o Corinthians, advindo da “Taça de Prata, espécie de segunda divisão, chegou às semifinais do torneio no mesmo ano), a campanha pela ética e a moralidade no futebol brasileiro foi deflagrada em 1987, logo após o torneio de 1986, vencido pelo São Paulo, em março do ano seguinte – o atropelo deveu-se a confusões administrativas e a continuação da fase final deu-se após o carnaval. Os times de maior apelo popular reuniram-se e resolveram bancar um campeonato por conta própria, a chamada (corretamente) de Copa União. Importante dizer que tudo isso começou porque a CBF resolveu reduzir o número de clubes de oitenta para vinte e oito e, com isso, Botafogo (co-campeão em 1968) e Coritiba (campeão em 1985) ficariam de fora da competição. Ambos os clubes interpelaram a CBF judicialmente e, com isso, surgiu o Clube dos 13 (Atlético Mineiro, Bahia, Botafogo, Corinthians, Cruzeiro, Flamengo, Fluminense, Grêmio, Internacional, Palmeiras, Santos, São Paulo e Vasco). O América, terceiro colocado da competição de 1986, foi alijado da competição por decreto, recusou-se a jogar qualquer torneio que não fosse o de elite (com absoluta razão, já que a chamada Copa NÃO foi elaborada com base em critérios técnicos) e, daí, iniciou longa jornada de dificuldades até hoje. O mesmo aconteceu com o Guarani, campeão em 1978 e vice-campeão do torneio de 1986 – porém, os de Campinas concordaram em disputar o que se convencionou chamar de Módulo Amarelo.

Dado o impasse, pois certamente o formato da Copa União contrariava os interesses dos clubes que, em tese, conquistaram suas vagas nos critérios supostamente técnicos (classificação no ano anterior), a CBF interveio com a decisão de cruzar o chamado Módulo Verde (Clube dos 13 mais Coritiba, Goiás e Santa Cruz) com o Módulo Amarelo, composto pelos demais times alijados da disputa pela chamada elite. Esta intervenção deu-se meses antes da fase final da Copa União – que, embora com um discurso renovador, permitiu situações curiosas como a de um time que não tivesse ganho nenhum dos turnos de classificação chegasse às semifinais, que foi exatamente o caso do Flamengo (o Atlético Mineiro foi o primeiro colocado nos dois turnos de classificação, e o time da Gávea entrou como o melhor segundo). Recorde-se que, dez anos depois, uma final de Taça Guanabara previu uma partida final entre o primeiro e o segundo colocados e muitos gargalharam, atribuindo um ar grotesco ao método de disputa. Certamente, se eram rubro-negros, deviam ser para lá de esquecidos.

Particularmente, não tenho dúvidas de que, naquele ano e com aquela fórmula de disputa, o Flamengo seria o grande favorito ao título nacional e a uma das vagas da Libertadores em 1988 – ainda que de forma estranha, alijou o Atlético da conquista da Copa União e bateu um limitado Inter na final do Módulo (este sim, o time gaúcho, tinha todo interesse em “melar” o cruzamento de módulos, pois temia o confronto contra Sport e Guarani, devido ao péssimo momento em que se encontrava tecnicamente). Sport e Guarani nem chegaram a decidir quem seria o campeão do Módulo Amarelo, tamanha era a importância maior de se ir para o quadrangular final – embora isso não diminua a aberração da decisão em aberto após um incontável empate nos pênaltis.

O que atrapalhou os da Gávea foi o gigantismo e a prepotência. O mesmo que se revela de forma agressiva na mídia ainda hoje, que vende a idéia de um time somente no Brasil, o que sabemos há muito ser uma balela. O mesmo que faz uma auto-exaltação diária, como se futebol pudesse ser jogado sem adversários e sem outras torcidas, outras diferenças. Recusaram-se a disputar o quadrangular final e deixaram que a competição começasse, não comparecendo aos jogos e perdendo por W.O. Tinham a certeza de que seriam nomeados por decreto para a disputa da Taça Libertadores. Mas não foi o que aconteceu. E perderam a vaga para a competição sul-americana mais fácil de sua história.

De lá para cá, passaram vinte anos, desordens e muita confusão no futebol brasileiro. O Flamengo viria ainda a conquistar duas Copas do Brasil, em 1990 e 2006, competições nos mesmos moldes que seus antecessores nos anos sessenta o fizeram – e que a chamada massa rubro-negra insiste ingenuamente em não reconhecer, como se o Santos de Pelé, bicampeão mundial em 1962-1963, por exemplo, tivesse chegado à Libertadores por acaso ou convite – e não há um brasileiro vivo ou morto que conheça futebol e não saiba do Santos de Pelé. E ganhou um torneio brasileiro também, em 1992 – cujo sucessor inauguraria uma nova era de ascensões, promovendo doze times à chamada divisão principal.

Anos depois, por motivos até parecidos, em 2000, foi instituída a Copa João Havelange, vencida pelo Vasco, na final contra o São Caetano. Os times vieram de módulos diferentes e, teoricamente, o Vasco poderia sentir-se prejudicado por chegar à final contra um time que enfrentou adversários de nível técnico menos apurados. Mas nem mesmo Eurico Miranda cogitou de não realizar os jogos de cruzamento, ainda que a partida final em São Januário tenha sido suspensa. E o que dizer do Cruzeiro, que terminou o Módulo Azul daquele ano com 45 pontos, seis à frente do Vasco? Imaginem se os oito times que classificaram-se na divisão de elite recusassem-se a disputar a fase final com os demais das outras chaves? Teríamos perdido a oportunidade histórica de ver um time como o do São Caetano, que eliminou em casa Fluminense, Palmeiras e Grêmio, até chegar à grande final.

Patético ainda imaginar que o Flamengo possa “apresentar” protestos por um título que não requereu durante quinze anos. E sabedor que a Conmebol e a FIFA não lhe dariam amparo em tal reivindicação.

O São Paulo, se olharmos bem a história, nem é o primeiro pentacampeão brasileiro. Basta olhar o passado. Mas pode comemorar que ganhou cinco títulos no campo, no que merece absolutos parabéns.

Para finalizar, lamento que Zico, jogador de grande categoria, mas içado ao pantheon de maior de todos os tempos por opiniões duvidosas, tenha expressado o sentimento de que a comemoração são-paulina pelos cinco títulos possa ter sido uma “palhaçada”. Vi Zico jogar, e testemunhei muitas vezes sua categoria em campo, embora tenha presenciado falhas também. O sentimento de comemoração de uma torcida por um título é sempre nobre. E, queira ele ou não, o São Paulo venceu os cinco títulos no campo, sem tapetões ou tentativas frustradas de demonstração de força. E que o Flamengo comemore os quatro títulos, mais as duas Copas do Brasil, porque a competição de 1987, mesmo que para alguns de forma imerecida, foi do Sport - e ele foi reconhecidamente o representante nacional do Brasil em competições, junto com o Guarani.

Zico ressaltou que “quem ganha títulos é o time em campo, e não os dirigentes”. Teria toda razão, não tivesse omitido sua opinião num lamentável episódio da Taça Libertadores da América em 1981, quando o árbitro José Roberto Wright encerrou o jogo decisivo contra o Atlético-MG, após ter expulsado mais da metade do time alvinegro com meia hora de partida. Queira ou não Zico, a trajetória de gala de seu time tem remendos rasteiros, da mesma maneira que todos os chamados grandes times brasileiros. E trata-se apenas de um exemplo.

Paulo-Roberto Andel, 07/11/2007

Wednesday, October 24, 2007

O concreto da festa

todos reunidos
todos reunidos
festa da ilusão
solidão

todos estão rindo
debochando e rindo
tudo soa em vão
depreciação

música gritada
corpos seduzidos
inaptidão
desvinculação

copos, tragos, fumos, balas
degeneração

putas, trouxas, broncos, vis
representação

festa da ilusão

decadência em vão

alma em contramão


Paulo-Roberto Andel, 23/10/2007

Velas ao vento

minha vista é caravela
que navega
nas águas claras
do teu olhar

nas turquesas que brilham
mares, ondas
feito fossem
tarde-noite do Leblon

eu suspiro pela bela vista
que namoro em teu olhar

mar de amparo, relicário,
com moldura dos teus louros,
tuas madeixas

eu me perco no mar
e procuro o fim do mundo,
o crepúsculo,
profundo na imagem santa, louca
que leva-me ao caminho
dos teus inesquecíveis lábios


Paulo-Roberto Andel, 23/10/2007

Rap Reto

tudo no manto reto, completo,
exceto o incerto,
para intervir discreto,
repleto no ato secreto,
retrato do fato incorreto e concreto;
portanto, noves fora nada,
tudo perto e deserto.


Paulo-Roberto Andel, 23/10/2007

Friday, October 19, 2007

O taxista

É o sol do meio-dia em plena Rio Branco e eu, homem antigo, daqueles que nem sempre usam o eMule para obter as músicas dos artistas prediletos, volto da tradicional loja de cedês da rua do Rosário.
Discos, mesmo compactos, hoje já se tornam obsoletos; contudo, eu quero o produto, a capa, as fotos, o encarte, tudo me interessa. Bons preços, uns de rock, um de blues, outros de jazz - diferente de tudo, apenas o de hip-hop português, de Portugal mesmo. A loja tem sempre boas ofertas, e ainda fica num endereço categório. Pela direita, terreno que sobrou de velho motel que ali desabou anos atrás, logo acima de um bar onde o Xuru adorava encher o pote, com drinques e drinques. Pela esquerda, Rosário 65, tradicional casa onde as garotas só dizem sim. Volta e meia vejo um amigo por aquelas bandas, cd na sacolinha é só comigo, todos os outros de mãos livres. Dizem que foram comprar pão, cortar o cabelo ou buscar o resultado da loteria. Eu acredito. E rio.
Braço à frente, chamo um táxi. O motorista, atencioso, pára imediatamente. Entro e peço o destino, rua do Senado. Muitos não gostam, acham que o caminho é curto e pode ser mais vantajoso ficar à espera de um apressado executivo que queira pagar sessenta reais por uma corrida até a Barra. Ele, não. É um senhor, vindo do Nordeste, talvez por volta de seus sessenta anos, ouvindo música clássica dentro do carro refrigerado. Eu gosto. Tem algum engano, de toda forma.
Em vez de tomar o caos de congestionamento pela rua da Carioca, o motorista toma iniciativa de seguir em frente, usando Almirante Barroso e imaginando usar Lavradio para chegar à Senado. Moro por ali há alguns anos, e gosto dessa coisa de uma única rua ter diversos nomes. Afinal, Conde de Bonfim, Haddock Lobo, Henrique Valadares, Relação, Chile e Almirante Barroso são seis nomenclaturas para a mesma super-via. Acho. Da Tijuca ao Centro, o que não falta é terra e gente homenageada. Chile é um pedacinho, Relação também. Tudo em nome da democracia.
Esquina de Chile com Lavradio, o sinal fecha. Na direita, IBGE e suas estatísticas. Noroeste, o veterano prédio da Tribuna da Imprensa, sobrado, quase centenário. Silencio, para dar vez ao taxista.
"O senhor sabe daquele prédio ali, da Tribuna? Olha, em 1950, eu era um menino, tinha nem trinta anos, menos até, e vivi uma história naquele lugar. Tinha uma moça, que era jornalista e casada com um policial. Uma vez, ela pegou uma corrida comigo, já que eu passava sempre aqui. Passou a ser minha cliente. Eu a levava até Piedade, Cascadura. Ela sempre me falava da casa, do trabalho, dos ciúmes que o marido sentia, e eu calado. Era mulher bonita, mas eu só espiava de esguelha, nada de me engraçar, nem tinha coragem naquele tempo. Levei a doutora muitas vezes em casa, tarde da noite, acho que ela ficava até o final cuidando das matérias, eram os tempos do Lacerda. Um dia, o policial ficou doente; fiz uma corrida para ela da Lavradio até o Hospital dos Servidores. Chegando lá, ela pediu que eu subisse com ela, para que o marido visse que não tinha nada de mais, e eu era somente o taxista - parece que ele morria de ciúmes do sujeito que levava a patroa todo dia em casa. Subimos, dei boa tarde ao moço, que nem era tão moço. Era, sim, um senhor, que devia ter uns quarenta, cinquenta anos, era velho para ela. Devia ser enciumado mesmo, porque mal balbuciou cumprimento. Terminou a visita, a dona pediu para eu levá-la até Piedade, era bom serviço. Aí é que a coisa entornou: quando chegamos lá, ela pediu para que eu entrasse na casa, bonita, grande, para tomar um café, tudo já de noite. Fiquei cabreiro, mas fui. Entrando, ela cumprimentou as crianças, a babá, pediu para a empregada que nos fizesse sanduíche e chocolate quente. Quando ia começar o lanche, botou toda a turma para dormir. Eu, trêmulo, naquela casa, com aquela mulher bonita, sem saber fazer as coisas direito, eu só sabia lidar com as quengas da Mimosa. Daí que a moça puxou a cadeira para perto de mim, começou a roçar a coxa e, quando vi, estava com a mão dentro da minha camisa e me beijando. Era uma mulher pra lá de bonita e de danada, fiquei amalucado, me levou pela mão para o quarto. Linda e safadinha. Quando fui embora, me deu um beijo na boca que até hoje eu sinto o gosto. Peguei o carro e voltei para Marechal Hermes. Tomei banho, deitei, quase não dormi, só pensava naqueles louros, naquela pele de seda, naqueles seios. No dia seguinte, me chamou de novo para a corrida. O marido, que ia ficar uma semana no hospital, acabou ficando meses - e eu ia para Piedade todo dia. Naqueles tempos, telefone era coisa difícil; um belo dia, a danada me ligou e pediu para não passar perto da Tribuna e nem de Piedade - a empregada, revoltada, foi ao hospital e contou para o corno o que estava acontecendo, sendo que o mesmo estava para ter alta. Quando desliguei, perdi dez quilos: imagina um policial armado atrás de mim. Nem pensei duas vezes: arrumei minha muda de roupa, paguei a despesa do quarto onde morava, deixei algumas coisas no quarto dum amigo e mudei para São Paulo. Fui trabalhar com frete e sumi do Rio, foi a única vez na vida em que deixei essa terra. Me escondi por um ano, deixei o buço crescer, o cabelo, imagine se o hômi vem atrás de mim. A saudade foi grande, mais uns três meses, não aguentei e voltei. Quando cheguei em Marechal, o amigo de volta me deu alguns recados, eu tremendo: quem será que poderia ter ligado? Policial, nenhum. A jornalista, umas três vezes. Retornei a ligação para o jornal. Acabei encontrando-a umas cinco, seis vezes, só para chamego, coisa da boa. O policial estava em casa, aposentado, ela disse que largava ele para ficar comigo. Achei que era loucura demais, mudei de Marechal, ela nunca mais me achou, eu conheci minha esposa e a vida seguiu. Tem cinquenta e sete anos, seu moço, isso foi em 1950, depois da tragédia do Maracanã."
Todo mundo tem suas histórias de amor, uns mais, outros bem mais. Por um instante, lembro das minhas, as distantes e as próximas. Noutro, assusto-me com a idade do taxista, e esse é o engano lá de cima: oitenta e três anos. Eu chutei uns sessenta. Ótima forma, no batente e com lucidez espetacular do contador de boas histórias. Se chegasse lá, aos oitenta, setenta mesmo, daquele jeito, seria feliz. Acho.
Chega a rua do Senado, 213, meu destino. A corrida não dá dez reais. O motorista merecia o dobro, só pela prosa, pela crônica que descreveu sobre o amor safadinho dos tempos de Vargas. Começou corrida às oito, ainda tem tarde e noite toda para trabalhar.
Eu agradeço e me despeço. O carro parte, decidido e sereno rumo à rua do Riachuelo.
Adentro o prédio antigo, de porta verde e alta.
Fico pensando no amor, na alcova, na mulher que não era só minha, tudo coisas que eu já vivi um dia.
O que será do amor do taxista? A bela mulher que hoje pode estar muito morta, mas que está tão viva naquele diálogo.
Lembro de coisas que nem deveria, mas me dão uma baita saudade. Acho.
Paulo-Roberto Andel, 19/10/2007

Thursday, October 18, 2007

A pátria sem chuteiras

Ontem foi dia de seleção de futebol no Maracanã. Fosse nos tempos idos, Nelson Rodrigues diria ser a "pátria de chuteiras", com mais de cem mil torcedores presentes ao estádio.
Não é mais assim, ainda que a festa seja marca registrada em qualquer evento carioca que não seja tiroteio.
Mário Filho esteve abarrotado ontem, com seus oitenta mil torcedores. Reduziram a capacidade de ingresso, pois a geral foi extinta e as cadeiras ocupam mais espaço do que os outrora espremidos torcedores. Viver, espremer.
E a seleção voltou ao Maracanã, sua casa de fato e que não precisa necessariamente ser o "estádio oficial da CBF", como tem sido comentado na mídia. Curioso é que, há menos de um ano, Ricardo Teixeira, o presidente da confederação, disparou que se o Brasil sediasse uma Copa do Mundo, o Maracanã não serviria como sede e deveria ser implodido. Agora, cogita-se da CBF administrar o Maracanã. O que mudou de fato? A incoerência das declarações passadas? A das atuais? Ou ambas? Tudo bem, exigir coerência no futebol é um pouco pesado.
O Maracanã é do futebol mundial. Qualquer ato de privatização ou de cessão do estádio a particulares significará grave agressão à memória do torcedor de futebol. Desimporta se Vasco tem São Januário e o Botafogo, Engenhão. A casa dos gigantes, dos grandes jogos é o Maracanã. E um jogo não pode ser gigante com apenas uma torcida.
Ao que tudo indica, não houve problemas de violência no confronto entre integrantes de torcidas organizadas no jogo de ontem. Proibiram a cerveja vendida, embora meu amigo Catalano tenha informado que a nata VIP no camarote montado pela cervejaria "oficial da seleção" - e que impedia a passagem de torcedores pelo anel de circulação do estádio - esbaldava-se com seu malte n'água. Dizem que proíbe-se a cerveja para minimizar a violência - se isso realmente desse certo, seria preciso estabelecer a Lei Seca por toda a Guanabara.
Favorecimentos à parte, foi bom o fim da ausência dos canarinhos no Maracanã. Sete anos. Um pouco exagerado. Espero que não tenha nenhuma relação com os propósitos antigos do Sr. CBF em botar as arquibancadas abaixo.
Quem ler ou leu as manchetes de hoje dará de cara, ou deu, com um impactante cinco a zero. Contudo, o placar não conta a história do jogo, modorrento que foi em sua grande parte.
Primeiro tempo, uma chatice só. Bela a jogada de Robinho e o ímpeto de Maicon para o gol solitário de Wagner, debaixo das traves vazias. Ele, também, Wagner, quase fez outro gol numa jogada de oportunismo pela esquerda, com a bola batendo no pé da trave direira. Robinho estava incrivelmente errando jogadas, o Gaúcho com um preciosismo que não cabe em sua vocação de craque. Kaká, o de sempre, arranque na direção do gol, objetividade. Um a zero bastou.
Segundo tempo, mais pachorra em vinte e cinco minutos, até que o forte chute do Kaká encontrou o Gaúcho pelo meio do caminho, e saiu o segundo gol. A esquadra equatoriana, limitada e já desgastada, aí se entregou de vez. Kaká fez um golaço, veio o quarto na jogada maravilhosa do Robinho e, despretensiosamente, Kaká de novo fez o quinto com a ajuda penosa do arqueiro equatoriano. Pronto. A seleção correu quinze minutos, jogou como seleção brasileira, aquela dos tempos em que se vencia e jogava bonito, fez quatro gols. É isso que esperamos, e não sufoco contra os colombianos para se conseguir um "bom resultado fora de casa", empatando sem gols.
Para a seleção brasileira, empatar nunca pode ser bom resultado.
O pessoal gostou, foi bacana, está certo. Para mim, entretanto, não tem mais pátria de chuteiras. Foi-se o tempo.
O circo pega fogo mesmo é hoje, com Vasco e Flamengo, jogo que é anunciado com ares de redenção para o vencedor. A verdade, mesmo, é que o derrotado penará nas proximidades da zona de rebaixamento.
Jogo de duas torcidas.
É disso que o Maracanã precisa.
De toda forma, agradeço ao Kaká pelo chutaço o ângulo. E ao Robinho, pela jogada maravilhosa de dois segundos, que nos faz perceber que o futebol brasileiro está vivo. Mesmo que, por vezes, respirando com auxílio de aparelhos.
Paulo-Roberto Andel, 18/10/2007

Tuesday, October 09, 2007

Passatempo de Maracanã

Cheguei ao Maracanã por volta de sete da noite de ontem, ainda bem cedo para o jogo entre Fluminense versus Corinthians, que iria começar lá pelas dez da noite, tal como manda o catecismo televisivo.
Um ritual que tenho mantido há muitos anos, o de chegar cedo.
Gosto de adentrar o Maracanã silencioso, reparar as nuances do estádio; perceber o silêncio absoluto de um lugar onde, poucas horas depois, milhares de torcedores se esgoelam e, findo o jogo e estampado o "boa noite" nos telões, em minutos volta toda a calmaria de antes.
Celebrei um bate-papo com uma simpática senhora, aos pés da rampa do metrô, a rampa da UERJ, tudo minha velha casa, enquanto esperava o amigo Dória. Ela, a senhora, gosta do Thiago Neves. Respeitei. Tive mais cerimônia ainda quando ela comentou que tinha visto o título mundial do Fluminense no Maracanã, ainda garota - feitas as contas, cinquenta e cinco anos atrás. Está perto dos setenta. Aplaudiu o Telê. Viu tudo.
Antes da velhinha, foi divertido ver o carro de transporte de cargas vivas da PM, leia-se cavalos. Vários soldados apoiando pelas pernas um outro, que tentava sem sucesso abrir a porta-rampa para a descida dos bichinhos - que fique bem claro, os cavalos. Há tanto cheiro de desrespeito, corrupção e morte nos arredores da PM, que não deixa de ser interessante os sujeitos em uma ação quase hilária para quem pôde ver.
Prestes a comprar o ingresso, nova piada. Veio o cambista, oferecendo o tíquete a quinze mangos. Dória mandou chamar o chefe, passou-lhe meia dúzia de safanões verbais: o cambista-mor não tinha vendido-lhe o ingresso do jogo de estréia do Engenhão, Fluminense versus Botafogo, por quarenta mangos. O atravessador considerou as palavras justas e, constrangido, cotou o ingresso a dez reais. Justiça social, se é que me entendem.
Adentramos Maracanã.
A eterna rampa, ladeira para caminho de glórias e dissabores, emoções de vida. Um frio cortante. Resolvemos, eu e Dória, dar voltas pelo corredor circular do estádio e manter o aquecimento, enquanto os Sussekinds não chegavam. Uma, duas, várias.
Quando finalmente acessamos as arquibancadas verdes, bem do lado da tribuna, veio-me um sentimento distante, de uns vinte e cinco anos precisamente, provocado pelo vazio do estádio. Era outro Fluminense e Corinthians, era 1982, era o Torneio dos Campeões vencido pelo América. O TC foi disputado antes da Copa do Mundo, e o Flu vivia mergulhado em crise: tinha sido apenas o quinto colocado do certame nacional, eliminado pelo Grêmio que viria a ser campeão do mundo no ano seguinte. E já estava há dois anos sem títulos. Ria você, que é jovem; naqueles tempos, era assim. Enfim, veio o dito Torneio e a pequena torcida Tricolor preparou nas gerais, hoje extintas, a cerimônia de "enterro" do então presidente Silvio Kelly. Naquele dia, fui sozinho, meus amigos não quiseram ir; o ingresso era por demais barato, bebia-se mini-leite CCPL e o velho Geneal estava de pé. Mesmo com um caixão fake, foi a primeira vez que vi algo parecido com um enterro em minha vida, e tive medo. Era um sábado à noite, baixíssimo público e o Corinthians acabou vencendo por um a zero, cujo artilheiro não me lembro. De toda forma, o futebol tem a velocidade horária de Mercúrio: menos de dois anos depois, os mesmos clubes estaria decidindo uma das semifinais do campeonato brasileiro - e o Flu venceria.
A dez minutos do jogo, devem ter chegado umas cinco mil pessoas, mais os dois Sussekinds, fato que espantou a hipótese de eu ver um jogo dos mais vazios de minha história esportiva. Lembro de três. Fluminense vencendo o Americano por uma a zero em 1981, com uns 1.300 pagantes. Fluminense vencendo a Portuguesa de Desportos por dois a um, de virada, gols de Djair, pelo campeonato brasileiro de 1994 - e seiscentos pagantes. Teve também um América e Bangu, isso mesmo, muito vazio, 1982. Desse, não recordo.
O primeiro tempo foi melhor do que o segundo. Fizemos um belo gol com o Pantaneiro e poderíamos ter feito mais, não fossem a desplicência Tricolor e o excelente goleiro corinthiano Felipe - que, aliás, cairia muito bem nas Laranjeiras para a Libertadores. Desplicência. Estamos ainda lutando por uma colocação de ponta no campeonato, e isso é bom. Porém, quando o Corinthians empatou, em mais uma falha do goleiro Fernando, faltou força para reagir. Pontos perdidos, desperdiçados mesmo.
No fim das contas, o desempenho Tricolor e a raça do limitadíssimo Corinthians foram os parâmetros para o empate final em um tento. Renato Gaúcho é um Deus Fluminense, mas entendo que não foi bem nas substituições: quando colocou Gabriel, deveria ter deixado Fabinho - que, rara e incrivelmente, estava bem e com bom poder de desarme. Arouca veio mais para trás e isso tirou o arranque do time, sem contar a ausência de Thiago Neves, provocada única e exclusivamente pela mesquinharia que domina o empresariado do futebol. Perto do fim do jogo, juntos estavam o extenuado Alex, mais Somália, Soares e o repatriado Adriano Magrão - o quarteto não inspirava nem velocidade, nem toque de bola ou criatividade.
Durante o jogo, um torcedor perto de nós gritava a cada bola parada um "É gool! É gool!" de tal forma que parecia um cachorro em latidos profundos, ou mesmo o cantor de uma banda de death metal. Particularmente, acho que isso espantou o segundo gol de Laranjeiras. No mínimo, atrapalhou.
Estar desde já na Libertadores é um grandioso conforto. Contudo, podemos ir mais à frente. Podemos e devemos.
Quando o jogo acabou, eu pensei basicamente em duas coisas.
Uma, o velório do Sílvio Kelly, e tudo o que veio depois daquele sábado à noite vazio no Maracanã, com derrota.
Outra, o Fla-Flu.
O Fla-Flu está por perto, muito perto. Precisamos, como sempre, nos agigantar.
Paulo-Roberto Andel, 04/10/2007

Wednesday, October 03, 2007

A casa em chamas

quando dei por mim
as chamas ardiam
em minha antiga casa
e o fogo alaranjado,
ávido lambia
as paredes em cinza,
enquanto a fumaça
subia aos céus
sem discrição,
na contramão do bem
era incêndio, domingo
mau sinal da nova semana
colocaram fogo na casa
minha antiga casa
enquanto eu chorava
ao longe
no exílio voluntário
e a massa de ar frio
do Maracanã
nem se incomodava
era tarde de domingo
alvinegros choraram
alguém sofreu num velório
e tudo o que eu via
era minha casa
em chamas
ardendo profana,
sofrida mas viva

Paulo-Roberto Andel, 03/10/2007

Friday, September 28, 2007

Nos tempos da laranja

Domingo passado, repeti um velho ritual que me acompanha há cerca de trinta anos, que é o de ver o meu amado Fluminense no Maracanã. Mais de quinhentos jogos in loco. Comecei nisso em tempos onde ainda era criança de colo, e lá estou eu, por hoje, com meus cem quilos, nas velhas cadeiras e arquibancadas do quase sexagenário estádio.
De uns tempos para cá, virou moda falar mal do Maracanã. Tem que derrubar. É uma porcaria. Velho. Retocado de enfeite. Tudo balela de quem nunca viveu a dor e glória de uma vitória ou derrota no estádio.
Algumas cousas realmente mudaram. Umas para melhor. Outras, não.
Noutros tempos, eu, pequenino de metro e meio, criança imberbe, comprava facilmente num guichê o ingresso para a partida das cinco da tarde. Quando divulgavam o público, havia mais de cem mil pagantes. Reconheço que não havia televisão na concorrência dos jogos; contudo, seria fácil atrair o torcedor colocando ingressos mais baratos, acessíveis ao povo. E sem precisar de uma hora na fila. Basta organizar. E nada de sacanagem.
O futebol mudou muito, mas creio que, em alguns lances, é possível ver resquícios do que, um dia, foi o nosso grande amor, o nosso colosso da vida brasileira.
Acho o chamado Engenhão uma obra-prima, bonito, faceiro. Porém, quando não havia Maracanã, o palco carioca dos jogos era o belíssimo estádio de São Januário, até 1949. Em 50, vieram a Copa e a tragédia nacional que, em vez de nos soterrar para sempre, levou-nos aos cinco títulos mundiais. Seis, porque a seleção de 82 foi mais campeã do mundo do que a Inglaterra de 66 ou a Alemanha de 90, por exemplo. Voltando, fizeram o Maracanã e então todos os clássicos daqui passaram a ter sua casa lá. Era outra estrutura e os jogos abarrotavam.
Hoje tem violência, tem ingresso caro, tem mau futebol. Mas ele, futebol, é amor do carioca. E não vejo sentido em se colocar clássicos, nossa marca bonita dessa cidade, em São Januário e nem no Engenhão. Jogo de cores e torcidas é no Maracanã, com todo respeito às arenas menores.
Outra coisa me chamou atenção, caminhando pelas cadeiras azuis.
Vinte e cinco anos atrás, cadeira era mais cara que arquibancada. Ali, frequentavam os torcedores de "carro" e prestígio. Imagino que fosse o dobro do preço: eu, menino, economizava a mesada para ir em cima, ou na boa e velha geral, onde tantas gargalhadas dei.
Vi calmaria e civilidade, fluminenses e botafogos andando abraçados, brincando, sem essa coisa torpe de inimizade, de destruição. Maracanã é para gritar canções de amor, mesmo que tenha um palavrãozinho ou fânqui. Famílias, crianças, namorados. Uma coisa me faltou ali entretanto: pobre.
Falta pobre no Maracanã como antigamente, pobre de verdade e não classe média esmagada. O ingresso mais barato é de dez reais, e isso impede muita gente de ir. No tempo da laranja não era assim.
Meu pai me puxava pela mão. Vínhamos de Copacabana. Não sei ao certo a razão, mas tomávamos o trem na Central do Brasil. Saltava-se em Derby Club. Rampa descida, com a multidão de gentes, ao pé do caminho tinha sempre o primeiro de muitos vendedores de laranjas. Você podia escolher: inteira, cortada ou descascada. Acho que as tarifas eram diferentes para cada caso.
No acesso à geral, era um verdadeiro mercado cítrico. Para todos os lados. Eu sempre dava a volta para chegar até a rampa do Bellini, e lembro de muitos geraldinos - apelido dos então frequentadores do setor - comprando as suculentas laranjas. Eu também pedia uma ao pai. Agora, não me perguntem porque laranja era coisa pobre naqueles tempos, pois hoje em dia é bem cara. E, justamente agora que ficou cara e, consequentemente, mais ao gosto do atual público do Maracanã, ela sumiu. Ninguém vende. Só churrasquinhos, cachorros podrões, cerveja e refrigerantes. Nada de fruta.
E, por faltar genuinamente a figura do pobre no estádio, mais o nefasto horário de dezoito horas e dez minutos, a nós imposto pela audiência televisiva da cidade de São Paulo, mais a dificuldade incrível de se adquirir ingressos no Maracanã, entraram trinta mil pessoas, umas vinte mil pagando, quando se podia ter oitenta mil.
Tem algo errado.
Parece a história do sujeito que chega no hospital público (pode ser privado também) com o braço quebrado e, para "salvar a vida do paciente", algum médico desses que gostam de festas na cobertura do Souza Aguiar diz:
- Amputa!
Em vez de trazer a torcida de volta para o estádio, cogita-se jogar num campo menor.
Sou justo. Os banheiros melhoraram, os assentos também. O telão é bonito, mas quase inútil, pois reproduz praticamente o que se passa no jogo. Ridículo é também quando escalam um jogador cuja "figurinha" não foi ainda entregue aos Suderjes. Resultado: nome do craque com uma cabecinha em branco, parecida com ausência de foto no Orkut.
Do jogo, falo pouco. Um massacre Tricolor no primeiro tempo, digno de goleada histórica. No segundo, calmaria e um Botafogo apático a ponto de, na continuação da jornada, ter levado a chinelada ontem do River Plate na Argentina. Bons os Thiagos, mais o Silva. Não precisou muito, vitória justa de Laranjeiras.
Na saída, peguei meu táxi.
E deu saudade danada de voltar ao Derby Club e, antes, comprar uma descascada laranja.
Paulo-Roberto Andel, 28/09/2007

A última quinta-feira de setembro

hoje
é a última quinta-feira de setembro,
ao passo em que as flores despertam
acesas, tão precisas
e nascem até pelos escombros
duma velha casa abandonada
ou debaixo de falsa noite fria
hoje é quinta de setembro,
onde minha cama é rasa
e meu amor não dorme,
sequer descansa ao léu
dança a valsa da brisa
para um coração perdido
é nascedouro de solidão morena
encouraçado de guerra e paz
é meu coração, meu herdeiro
que mora numa cidade escura
de temporária penumbra,
é meu coração enterrado
numa praia deserta, pequena
ao longe
hoje é a última quinta de setembro,
a primeira das flores e frutos,
e meu coração é repleto de silêncio
em reverência ao violão
de um certo São João
é a última quinta, a última guarda
tem a vista da Avenida Portugal
e serve de modesto presságio
para flores e frutos, flores e cores
que tragam ventos ligeiros
de qualquer sonho bom


Paulo-Roberto Andel, 27/09/2007

Friday, September 21, 2007

Guerra de bar e a primavera

Flanava pelas ruas de Botafogo, quando firmei ponto num boteco da rua Farani, velho ponto de concentração dos universitários de Santa Úrsula. Ficam os jovens de um lado para o outro, vagando, buscando flertes com a juvenília das moças, formosas, esculpidas nas academias de ginástica, mas que não dispensam uma cerveja dourada.
Era começo de noite, eu batucando de leve numa das mesas algum samba dos cinquenta, esperando por velha amiga linda dos tempos idos. Era calma de bar: algum burburinho, ir e vir das gentes ao mictorium, um ou duas mesas ainda não ocupadas.
A amiga veio, matamos saudades, trouxe outra linda a tiracolo e trocamos de mesa. Conversa leve, bate-papo furado que é uma das especialidades cariocas. Pastéis, drinques, o simpático vendedor de amendoim.
De repente, tumulto. Gritaria. Guerra de bar.
Um rapaz, que dificilmente tinha mais de vinte e cinco anos parecia possesso. Urrava. Xingava quem passasse por perto. Sinceramente, não sei como não apanhou, nestes dias de hoje. Todos os próximos foram por demais calmos. Um senhor veio apartar, quase levou uma cabeçada. Socos não.
Metros à frente, dois brilhantes membros da Guarda Municipal de Maia, a que prega o "choque de ordem na cidade", assistiam a tudo, silenciosos. Eles pensam que não lhes cabe intervir. Na verdade, medrosos porque não estão armados. Mesa ao lado da nossa, um rapaz bradou:
- Esses manés só sabem é multar carro!
Vários minutos, consegui entender a briga: o possesso reclamava troco de oito reais não recebido. Babava. Algo anormal. Custos a custos, tiraram-no do bar. Uma outra moça bonita, menos do que a da minha mesa, com uma criança de colo, assistia a tudo, silenciosa, impassível. Era a esposa do babão.
Quem faltava? A PM. Abriram a porta, apareceram feito cor de som. Encostaram o babão num canto, nada muito significativo. Foi embora. Antes, gesto típico dos cariocas: sonora vaia dos frequentadores. Aí, gostei.
Alguém cochichou que o pai do babão era freguês do bar, amigo da dona. E o vociferante estava, a princípio, "cheio de pó". Parecia mesmo.
Quase tudo normal, bebericamos mais. A loura linda da mesa foi embora mais cedo, a amiga linda ficou e, mais tarde, surgiu um gaúcho cheio de bossa para falar de futebol. Rimos a valer, muito bom. Ganhei até uma aposta, a de que Alessandra Negrini tinha mais de trinta e quatro anos de idade. Cinquenta reais por saber dados de uma belezoca? Caiu bem.
Fim da noite, despedida dos amigos, parei em casa para escutar um Mingus depois do banho tomado.
A tal da droga é uma porcaria mesmo. Torna qualquer Zé Arruela um machão desafiador por conta de oito reais. Tira o respeito aos mais velhos, à esposa, ao filho de colo. Expõe os populares a uma perspectiva de violência desagradável e inútil.
Ainda por cima, demostra de uma só tacada a inoperância da PM e da GM.
Lembrei também que, numa mesa perto, umas outras meninas bonitas sentaram-se à mesa mais próxima do que, segundos antes, havia ocorrido o tumulto. Uma delas perguntava para minha amiga o que ocorrera, foi esclarecida. Depois, segundos, estava a tirar muitas fotos digitais, a posar com suas belezas e as amigas, a viver um pouquinho de paz entre os tempos de dor que vivemos, entre tudo o que aí está.
As ruas precisam de mais meninas bonitas sorrindo e posando.
E menos cheiradores de pó. Glamour da cocaína é coisa de otário.
Mingus usava drogas, mas fazia arte.
Ouvi o resto do disco e dormi. Um sono quase justo.
Exceto pelo fato de que mal alertei para as flores, a chegada da primavera.
Paulo-Roberto Andel, 21/09/2007

Friday, September 14, 2007

IMPRESSÕES - 14/09/2007

Museu de grandes novidades (ruins)
Sou do tempo em que, pra te assaltar, o pivete num ônibus perguntava antes qual era a tua rua de residência ou a rua da tua turma. Fosse de "aliados", isenção do crime. Não fosse, e grana captada, ele saía correndo. Isso não tem cinquenta anos, nem trinta. Uns vinte talvez.
Pouco tempo para justificar a era de barbáries que vivemos hoje no Rio.
Praticamente ninguém mais fala que, nove meses atrás, queimaram gente viva dentro de veículos coletivos na avenida Brasil. Inhúma, um pouco antes.
O menino João Helio, assassinado estupidamente, será lembrado hoje pois, há poucos minutos, morreu uma enfermeira da mesma maneira na rua - arrastada por um carro com bandidos em fuga. A mesma triste sina, amparada pelo descaso do poder público e de boa parte da população - aquela que acredita estar tudo "resolvido" porque "paga impostos".
Esse tipo de situação, a repetição de assassinatos cruéis sem a menor justificativa, o prazer em matar, destruir, é muito assustador para mim. Creio que seja também para milhões de outras pessoas.
O que eu tenho feito para impedir isso?
E você?
As coisas pioram e estamos todos dentro de um museu de grandes novidades, aquele de Cazuza.
A morte da enfermeira vai ajudar a vender jornal e excitar a audiência televisiva.
Que mais?
Mais do mesmo, feito Renato Russo.
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Menos inacreditável do que a crueldade dos frios assassinos cariocas, mas inacreditavelmente também, foi o desfecho do caso Renan Calheiros.
Ele tinha a força. E sabia disso.
Não deixou a presidência do Senado, tinha certeza da absolvição.
Tenta-se vender a falsa imagem de que a vitória de Renan é também do PT - embora, claro, outro presidente poderia trazer problemas aos anseios do Governo Federal nas votações do Senado.
Renan já está há muitos anos nisso.
Quando a sessão secreta iniciou-se, certamente muitos dos que abstiveram-se ou votaram pela absolvição tiveram o que ouvir de Renan.
O que foi dito, jamais se saberá.
Mas os quarenta e um votos não foram à toa. E nem somente do PT. Ou da coalisão.
É incrível. Mas as cartas já estavam marcadas, marcadíssimas.
E o final do jogo, vergonhoso.
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Onze de setembro.
Enquanto Bush apropria-se do petróleo de uma terra sem lei, sob a singela justificativa da força de paz, Osama ostenta sua nova barba e "aparenta boa forma", parafraseando texto típico de revista de fotos muito "lida" no Brasil.
Falava-se muito de segurança, mas a verdade é que, na noite de dez de setembro de 2001, não havia um só americano que pudesse crer em toda a tragédia que aconteceu, ainda mais organizada por um milionário saudita que fora treinado no passado pelos próprios EUA.
A soberba de Sam custou caro. E custa.
Na ausência de galhos, Osama pula de pedra em pedra afegã (ou não) e continua a ser uma ferida aberta para todo o mundo.
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Toda forma, Nova York tem muita coisa boa. Um de seus grandes produtos é o Steely Dan, grande banda setestista que apostou numa fórmula quase única - misturar jazz com música pop.
Donald Fagen, um dos Steelers, lançou ano passado o disco "Morph the cat", vigoroso passeio no que há de mais bem-feito na música "comercial" nova-iorquina. Steely Dan puro, para quem conhece.
Ed Motta deve ter vibrado.
Quem gostar da fina iguaria musical, deve ser bem fácil o dáumlôadi.
Ou mesmo comprá-lo no original, tranquilo, por bons dez reais, encalhado que anda pelos sebos do centro do Rio.
Grade novidade de verdade. E boa.
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Tuesday, September 11, 2007

Para os que estão cansados

eu e minha cara cansada
de tanta gente imersa
na falsidade dos sorrisos fáceis
que não sabem entender madrugada
que não servem gente desamparada
que se prestam ao vazio no meio do nada

eu e minha cara cansada
de frases feitas, arrumadas
e palavras decoradas
que me dizem quase nada
que me espantam pelo enfado,
pose fácil, mal parada

eu e minha cara, minha cansada
d'estampidos virulentos
dos que não respeitam nada,
cansados da maré mansa d'água

eu e o tédio, eu e o reflexo
eu e a contemplação forjada
aos que falam, falam, falam
repetem jogos de jograis
cantam velas e castiçais
põem roupa suja na corda
e não dizem uma só palavra


Paulo-Roberto Andel, 11/09/2007

Friday, September 07, 2007

IMPRESSÕES - 07/09/2007

Bichos escrotos
As coisas não mudam. O brasileiro deixa a jangada navegar ao sabor da brisa.
Vejamos o caso de mais tragédias envolvendo cães da raça pitbull - inclusive, a dita serviu de inspiração de apelido aos jovens da noite carioca que vivem para a violência estúpida e gratuita, travestidos de praticantes de artes marciais - os pitboys. Quanto mais crianças, adultos e idosos dilacerados pelas cidades brasileiras, mais cães proliferam.
Quem já teve a oportunidade de ver um pit na tevê em ação de mordedura, sabe bem o que quero dizer. Parece uma boca de jacaré - e a diferença é que não vemos jacarés com facilidade, soltos, nas ruas metropolitanas, acompanhados pela candura de seus donos que chamam-nos de bonzinhos.
Até quando será preciso haver a mutilação gratuita de pessoas para que se pense a respeito do controle destes cães?
Focinheira é tão inócuo quanto dizer aos populares para que se abaixem em caso de passar por um tiroteio.
Nada contra a raça canina em especial, apenas o fato de que não me sinto confortável em andar perto deles soltos nas ruas, como também não me sentiria se leões e tigres tivessem o mesmo, digamos, "direito".
Um pitbull não é capaz de fazer coisas feito os semelhantes mordedores do parágrafo acima? Justo e razoável. Porém, isso não é motivo para que se dê a mão a eles, tal como se fazia no tempo dos populares cães pequineses e, ainda hoje, com o sensacional basset, o popular "salsicha".
O pitbull é um cão perigoso, já proibido em vários países e deveria haver uma reflexão mais profunda a respeito. Não colam as balelas de seus admiradores, defensores de que a agressividade do bicho é "reflexo do dono".
Para mim, hoje, quem tem esse cão e anda com ele nas ruas sem focinheira está mal-intencionado.
De toda forma, o pitbull é um cão que, necessariamente, precisa de um dono relapso para agredir e matar pessoas, como acontece noite e dia no Brazyl.
Talvez seja melhor a focinheira no dono.
Bichos escrotos, voltem para os esgotos.
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O dito promotor Tales Ferri Schoedl, assassino confesso de um jovem há três anos atrás, continua livre, não julgado, não preso e ainda com a possibilidade de vir a ser mantido como procurador de justiça pelo restante de sua vida. Atrelado a tudo, um garboso salário de dez mil reais.
É para deixar qualquer ladrão de galinhas com as orelhas em pé.
Tales tem o perfil típico de quem não vai para a cadeia: branco, rico, bem-nascido e, como os jornais hipocritamente disfarçam em seus classificados, de "boa aparência". Além de tudo, tem prestígio no poder público: foi reprovado em etapa pré-admissional para o cargo por questões psicológicas mas, ele, o jeitinho, resolveu tudo.
A violência no Brazyl é tema de susto para qualquer pessoa de bem. Dissestar a respeito passa sempre pelos caminhos da droga, da banalização das armas e do crime, da estupidificação dos tempos. Contudo, é um disparate imaginar que, por mais que os códigos formais venham a permitir, um procurador de justiça do Estado possa permanecer impune após ter cometido um ASSASSINATO por motivo mais do que vil.
Ainda temos jeito. Mas ele só começará quando, antes de prendermos todos os "negros" banguelas, os "analfabetos", os "rústicos", os "paraíbas" (classe preferida dos Cansados) e deixarmos que apodreçam à espera da morte, sem assistência do Estado, começarmos a punir exemplarmente a "turma de cima" - os que tiveram tudo para não pertencerem à face marginal do Estado, mas por ela optaram.
É indigno que o povo paulista pague com o sacrifício de seus impostos o salário imenso de Tales.
É indigno que um sujeito como Tales permaneça livre.
É a imundície do Brazyl.
Assassinar um jovem à queima-roupa por idiotice é coisa de bicho. Não o de zoológico, mas outro. O bicho escroto, bicho-semi-homem.
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Caso Renan Calheiros, o senador, perca seu mandato face em vista as inúmeras, digamos, "irregularidades" que cometeu do ponto de vista do decoro parlamentar, é possível imaginar que o ex-presidente Collor pensará a respeito?
Renan largou Collor em 1992, depois de ter sido um de seus fiéis escudeiros, ao perceber que a sorte do persidente-atleta já estava selada.
Quinze anos passam rápido. Vida e vingança, pratos gelados.
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"Cansei", o movimento dos cansados que lutam pelo resgate do Brazyl verdadeiro, puro d'alma, livre e feliz, que existiu entre 1500 e 2002, não se pronunciou contra Tales, os pitbulls, os pitboys. E, é CLARO, nem contra Renan Calheiros.
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Sete de setembro, dia da independência. Que independência?
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