Translate

Friday, March 30, 2007

Caminho de vida

vida que te quero vivida
nos frutos das árvores iluminadas
pelo vespertino sol da primavera

vida acesa, quente, alvissareira
cheia de exclamações, reticências
choros e risos, imprecisos

vida em que a derrota
não passa de fraco opaco
e a vitória tem brilho intenso
na claridade da cidade alta
na poesia da beleza em riste
no ledo engano do novo encanto

ah, vida

certas vezes, tu me parecestes
tão sofrida, ferida em pesar
que quase te abandonei
por teimosia, perseverei
agora, estou diante de ti
sou ferido pássaro na solidão
perdido, avoando todo mar
enquanto o ninho não chega
o repouso dos justos
breve alvorada da travessia mor
inevitável



Paulo Roberto Andel, 30/03/2007

Ossos do ofício poético

quando quiseres ser poeta
deves atirar uma, vinte, mil pedras de liberdade
numa multidão assustada
tendo em mãos as dálias
que melhor sejam desfolhadas
e ofereça cada pétala
ao sabor do carinho

quando quiseres ser poeta
precisas desfraldar teu peito nu
e abalroar o sentimento de frente
amores, ódios, compaixões
repulsas, alívios, serenidades
para que a palavra escorra em teu corpo
advinda de tuas lágrimas e suores

quando quiseres ser poeta
basta embebedar-se de vida
quente, morna, viva, rígida
e não é o caso de sorver goles
mas sim embriagar-se nas canecas, pelas tabernas
e brindar o entorpecer do amor


Paulo Roberto Andel, 30/03/2007

Saturday, March 17, 2007

Nau capitânia

faço as vezes de um rio caudaloso
e nele desço correnteza abaixo
não tenho onde me apoiar, equilibrar
e nem imagino onde vai ser a parada
são as águas que me levam, vigorosas
pelos quebrantos do desconhecido
cabe-me o medo natural de marujo novo
entretanto, vivo mesmo é conforto
que venham mais águas, puras
que tudo deságue no mar, eterno


Paulo Roberto Andel, 17/03/2007

Friday, March 09, 2007

Dois amores do Atlântico Sul

I)

Houve um dia
Em que fizestes chuva de prata
No espelho d'água que beijou Copacabana, cândida
Enquanto o sol era nosso ardor
Nossa bênção, lúcida
Eu repousei
Para fazer do meu coração o teu
Teu berço esplêndido
Canto das sereias, lembranças
Cicatriz e dor de amor
Há de haver um dia
Que farei da tua prata
Meu ouro branco de pote
Abrilhantando o luar
Deleitando-me no gosto leve
Açucarado, preciso
De te reencontrar, tão minha
E beijar-te, beijar
Até que o mesmo dia
Seja sintoma de eterno
Vire século, milênio
Todos os tempos, aconchegantes
Para ficar mais junto de ti
Minha chuva de prata
Meu pote d'ouro
Quero tudo que sirva
Para ver-te novamente em mim
Serena e permanentemente
Filha

II)

Dá-me tua mão, teu calor
Dá-me teu beijo
Que traz afago em minha face
Teu abraço que não cessa
Teu carinho infalível
Redivivo, definitivo incenso
Dá-me tua companhia querida
Longe da colina imprecisa
Que nunca servirá de amparo
Nem quando o sol incendeia
A tarde duma quinta de verão
Minha, mãe tão minha
Dá-me tua cor, tua voz
Teu colo de alicerce
Dá-me teu sorriso sem par
Perfeito ser
Dá-me tua presença
Teu caráter, vigor
Rigor de humor cativante
Dá-me tua mensagem
Um sinal, uma passagem
Para que eu possa buscar-te
Dá-me tua mão, teu calor
Na porta do palácio branco
Oxalá
Meu amor

(Dedicado a Maria Isaura, sua mãe e a minha)


Paulo Roberto Andel, 05/03/2007

Sunday, March 04, 2007

Entes

objetiva
a mente da gente que mente
e finge que não sente
o desencanto, de repente
da massa audiente
feito um sol de poente ausente
desnaturadamente
um falso encanto da serpente
truque reticente, inconsistente

objetiva a gente que mente
despudoradamente
desnecessariamente
escorada num dormente decadente
anestesiada, doente
ávida por tratar a gente
como se não fosse a gente
impróprio agente

obsessivamente, gente
objetivamente, gente
obsessiva mente que mente
demente gente
de mente, gente que desmente gente


Paulo Roberto Andel, 04/03/2007