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Tuesday, April 14, 2015

Conversando com Raul

CONVERSANDO com meu amigo Raul há pouco no departamento profissional da empresa onde trabalhamos, talvez no começo da manhã, nosso assunto começou em aposentadoria e voltou até o tempo em que cada um, a seu modo peculiar, enfrentou as agruras dos primeiros empregos e ocupações. Somos de gerações diferentes; tivemos formações, residências e práticas diferentes. No entanto, tudo fica parecido demais quando se começa a trabalhar: nada é fácil, cada dia é uma luta. E rimos também: ele não tem a menor aparência fisionômica do que se imagina (em pré-conceito) da figura de um homem aposentado.

Caminhar pelo sol a pino, enfrentar clientes beligerantes que possuem toda a razão porque “estão pagando”, encarar filas intermináveis, percorrer quilômetros até a hora em que uma cliente generosa ofereça um pedaço de bolo ou um copo de água, atravessar a Baía de Guanabara às duas da manhã depois do expediente ter sido encerrado (teoricamente) às dez da noite. Tudo isso é menor diante dos milhões de brasileiros que diariamente encaram as piores condições de trabalho nos piores cenários e ambientes possíveis – o noticiário está cheio deles. Por nossa imensa sorte e alguma competência, estamos longe dessas mazelas. Não trabalhamos no melhor lugar do Brasil? Não sei dizer, mas acho difícil que nossa casa de trabalho não esteja entre os dez – ou cinco – melhores points profissionais a cinco mil léguas do coração do Rio para qualquer direção da bússola. Somados, temos quase meio século de vida profissional na empresa e isso quer – ou pode – dizer alguma coisa.

Desde que comecei lá longe a estudar Estatística, debaixo de muitas adversidades no fim dos anos 80 do século passado – um país em completo abandono e desemprego; uma inflação de 70% ao mês; a luta para se conseguir ficar entre os primeiros lugares de uma universidade concorridíssima; a dificuldade de se conseguir um estágio numa carreira que mal era (e é) disseminada na economia -, o mundo mudou demais. Isso valeu para o futebol que amo e escrevo (vendo-o agora de maneira diferente, por sinal), a própria sociedade, a vida cotidiana, as inovações tecnológicas, os noticiários, os embates políticos, tudo. Mas minha diversão no emprego não mudou. Incrível. Pensar que já se passaram quase vinte e três anos é uma preocupação, mas, ao mesmo tempo, permite olhar o que aconteceu – e posso dizer que o saldo é absolutamente favorável: excelentes e confortáveis condições de trabalho, relações humanas gerais excelentes, silêncio na hora de calcular (o que é fundamental), todos os direitos trabalhistas absolutamente impecáveis e visíveis no computador, salário impecavelmente depositado na conta com precisão britânica, dezenas de histórias divertidas que dariam até um pequeno livro: garotas bonitas, chefes engraçadíssimos, diretores que hoje são saudade. Claro que houve percalços, pois a vida não é feita só do arco-íris, mas são absolutamente desimportantes diante do contexto da obra (em se tratando da casa a que me refiro, literalmente expresso); para um profissional da Estatística, não se permite o erro de inferência.

ÀS VEZES um admirável e querido maluco passa falando em usar as sobrancelhas no “estilo Madame Satã” (sabe-se lá o que o interlocutor quis dizer com isso). Outro recita poemas intermináveis. Alguém faz piada boa com a voz em alta escala, alguém fala num idioma próprio e divertidíssimo. Gente com sotaque divertido, daqui e de fora. Pequenas e divertidas barbaridades verbais. Gente suadíssima, vindo da rua depois de horas de esforço, beneficiando inclusive os companheiros da casa. Nas salas dos setores, é difícil constatar a ausência de riso, mesmo diante de tarefas mais complexas e que exigem atenção. Pessoas erram e acertam muito – aliás, é de bom tom jamais confiar em quem nunca errou, dado que os mentirosos não são lá essa coisa toda em termos de confiabilidade, por motivos óbvios. Geralmente o ar condicionado funciona muito bem, a internet idem e não tem lista de convocados ao DP para o desligamento a cada mês, praxe nas majors por aí. Tudo tão confortável que, ao apertar os horários de almoço, pude me tornar até um escritor publicado. A sede é linda e tem detalhes seculares, que geralmente impressiona os visitantes. À tarde servem lanche sala a sala.
Boa parte do elenco dos funcionários tem duas ou três décadas nas costas; os “especialistas” dizem ser contra isso e me sinto do direito de questioná-los: oh, senhores da exatidão, já estiveram aqui para avaliar o quanto a coisa funciona? Nenhum deles foi pago por vinte anos para exercer as especialidades em lugar algum, é natural que não aprovem. Gosto dessa coisa de defender uma camisa por muitos anos, isso me remete ao genial Nílton Santos.

Outro dia mesmo, a empresa parou cedo para que tivéssemos o almoço de Páscoa. Um bacalhau espetacular, dos melhores do ramo, repetido com louvor a cada ano. Lembrei-me dos rapazes trazendo o peso-pesado em bandejas por três ou quatro quadras, correndo para que tudo chegasse absolutamente quente do forno da padaria. Tive vontade de rir de quem reclamou do atraso de cinco minutos da festa: sorvete, bebida, comida, ar refrigerado, dinheiro na conta, cadeiras confortáveis, tudo a um ou dois quilômetros de comunidades carentes onde pessoas ainda deixam de almoçar para que o jantar possa existir. Ou num mundo onde a cada três segundos uma criança morre de fome. Uma a cada seis pessoas na Terra não tem sequer água, elemento quintessencial da vida. Uma vez por dia, tento tirar cinco minutos para ir a algumas salas, falar com os camaradas, saber como estão, trocar pequenas grandes ideias. O mundo lá fora é doloroso, injusto e cruel enquanto ainda me divirto em minha cadeira preta em frente a um computador preto.

Queria falar mais da festa, das pessoas, do bacalhau. Tudo isso foi só um pretexto para lembrar que, enquanto estamos por aqui, nossa vida é farta e especialíssima em se tratando da média no planeta Terra afora. Conversei com Raul e me lembrei do quanto nos divertimos. Antes da conversa, meu objetivo era entregar a ele um cálculo de juros qualquer. Noutros lugares, parece sacrifício. Calcular por aqui é diversão para mim.

Dizem que os empregados ficam mais felizes quando recebem um prêmio extra ou alguma benesse. Seria fácil demais. Digitei isso na hora do almoço de hoje, com o público querendo minha cabeça porque o CUB não foi publicado, gente rosnando no telefone e no e-mail. E daí? O trabalho é sério e me divirto com ele do mesmo jeito. Daqui a pouco tudo estará bem. Agora mesmo dois colegas de labuta conversam fraternalmente em frente à mesa de café a centímetros da porta da minha sala de trabalho. 

Muita gente, ao olhar o passado, diz que gostaria de ter feito outra coisa na vida. Se fosse o caso de escolher, eu talvez estudasse e trabalhasse bichos, que gosto muito, embora não saiba dizer se me divertiria o tempo todo, ainda mais num trabalho em que perdas e mortes são inevitáveis no cotidiano. Então fico admirando os bichos de longe e continuo muito feliz aqui pela rua do Senado com meus números: desde aquele 1992, quando vim com vinte estudantes disputar uma vaga de estágio e venci, eu não moveria uma vírgula sequer. Tudo exatamente como tem sido.

Há livros que já nascem prontos, deve ser isso.

@pauloandel

Thursday, April 09, 2015

É tudo mentira...

O limite da irresponsabilidade

Mendonça de Barros liga para Ricardo Sérgio pedindo uma carta de fiança do Banco do Brasil para o consórcio liderado pelo Banco Opportunity. Ricardo Sérgio diz que acabou de dar. E afirma estar no "limite da nossa irresponsabilidade".




O presidente grampeado

Em conversa com FHC, André Lara Resende (BNDES) critica a composição do consórcio Telemar, que disputava a Tele Norte Leste. FHC concorda:



Conheça os envolvidos



Muita emoção...



Dez anos de impunidade (11/11/2008)

A repórter Elvira Lobato publicou na Folha deste domingo reportagem sobre os dez anos de impunidade para os crimes flagrados no grampo da privatização das teles, no iluminado Governo do Farol de Alexandria, Fernando Henrique Cardoso, aquele do “quanto pior melhor” (*).

Luiz Carlos Mendonça de Barros, André Lara Rezende, Pérsio Arida, Elena Landau, Pio Borges, Ricardo Sergio de Oliveira (que foi, além de tudo, caixa de campanhas de Fernando Henrique e de José Serra), Daniel Dantas, Geraldo Brindeiro, Jair Bilachi, e Fernando Henrique Cardoso, ele mesmo – eles não têm nada a temer.

Estamos no Brasil, como diz o Mino Carta, o “país do futuro” !

Carlos Salinas de Gortari (México); Alberto Fujimori (Peru); e Carlos Menem (Argentina) privatizaram as teles e passaram o resto da vida a enfrentar a Lei (Fujimori chegou a ir em cana e Salinas fugiu do México).

São os heróis do neoliberalismo e da privatização na America Latina.

Aqui, ao contrário, levam o Fernando Henrique a sério, e lhe pagam US$ 50 mil por palestra, para ouvir ele pregar o “quanto pior melhor” (*).

Aqui, dez anos depois, os únicos que correm o risco de ir para a cadeia são os suspeitos de fazer o grampo.

Mas, na Justiça brasileira, aquela que tem seu ponto culminante no Supremo Presidente Gilmar Mendes, na Justiça brasileira é assim: quem se dá mal é o cano e, não, a água que por ele passa.

Para aderir às celebrações dessa Data Magna, o Conversa Afiada republica reportagem da Carta Capital de 25 de novembro de 1998.

A Carta divulgou o conteúdo do grampo: a água...

Acompanhe abaixo a reprodução de parte da matéria veiculada na Carta Capital, em 25 de novembro de 1998.

SOB SUSPEITA 

Bob Fernandes (reportagem originalmente publicada na edição 87, de 25 de novembro de 1998) 

O negócio tá na nossa mão, sabe por que Beto? Se controla o dinheiro, o consórcio. 

Se faz aqui esses consórcios borocoxôs, são todos feitos aqui. O Pio (Borges, vice-presidente do BNDES) levanta e depois dá a rasteira. (Luiz Carlos Mendonça de Barros, ministro das Comunicações, em conversa com o irmão José Roberto, secretário executivo da Câmara de Comércio Exterior.) 

Temos que fazer os italianos na marra, que estão com o Opportunity. Combina uma reunião para fechar o esquema. Eu vou praí às 6h30 e às 7 horas a gente faz a reunião. Fala pro Pio que vamos fechar (os consórcios) daquele jeito que só nós sabemos fazer. (Luiz Carlos Mendonça de Barros para André Lara Resende, presidente do BNDES, sobre a intenção de operar em favor do consórcio integrado pelo banco de investimentos Opportunity e a Telecom-Itália.) 

Vai lá e negocia, joga o preço para baixo. Depois, na hora, se precisar, a gente sobe e ultrapassa o limite. (André Lara Resende para Pérsio Arida, sócio do Opportunity.) 

A revista CartaCapital ouviu fitas gravadas na presidência do BNDES. A revista Veja conta ter tido acesso às duas fitas que o governo enviou para a Polícia Federal. São muitas as fitas. Fala-se em 27, mas certeza só tem quem participou dos grampos. As fitas ouvidas por CartaCapital têm trechos – os explosivos fragmentos acima – que, pelo relato de Veja, não constam das fitas repassadas pelo governo à Polícia Federal.

É certo que são fitas editadas, como tem repetido o ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, mas é certo também que os diálogos ouvidos por CartaCapital existem e, claramente, não são uma montagem. Têm uma seqüência – sem espaços – e uma lógica que indicam extrema dificuldade para uma edição de diálogos. 

FILHOS CORRETORES

Das fitas que se conhece, as gravações mais importantes foram feitas entre 21 de julho e 12 de agosto últimos, mas os grampos na sala da presidência do BNDES (os diálogos em celulares são capturados) foram instalados no início deste ano. 

O alvo principal era o ministro Mendonça de Barros, então presidente do BNDES. 

Seus adversários buscavam, com os grampos, conversas entre Mendonça e seus filhos, Marcello e Daniel. Nas fitas por ora na praça não há registros de tais conversas. 

Os filhos do então presidente do BNDES tornaram-se sócios-proprietários de uma corretora na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F). A Link Corretora de Mercadorias Limitada, registrada na Junta Comercial em 2 de fevereiro, quatro meses depois, em junho, já era a terceira operadora no ranking de volumes de operações no mercado de Índice Bovespa futuro. 

Cerca de 40% desse índice, então, era composto pelas ações da Telebrás. Empresa sob comando do ministro. E que seria privatizada em operação de R$ 22 bilhões pilotada por Mendonça de Barros, o pai. 

PÉRSIO E OS ITALIANOS

O leilão de privatização do Sistema Telebrás deu-se no dia 29 de julho. O central e incisivo numa seqüência de mais de 30 conversas grampeadas é a tentativa de favorecer um consórcio que uniria o banco de investimentos Opportunity e a Telecom-Itália. 

"Os italianos", como diz o ministro Mendonça de Barros inúmeras vezes ao longo dos diálogos. Favorecer "os italianos" em detrimento do consórcio Telemar, formado pelo Grupo La Fonte (do empresário Carlos Jereissati), a Andrade Gutierrez, a Brasil Veículos, Macal e Aliança do Brasil. O Fundo de Previdência do Banco do Brasil, a Previ, é peça decisiva nas negociações e nos telefonemas. 

Mendonça de Barros, o presidente do BNDES, André Lara Resende, Pio Borges, vice-presidente do BNDES, e Pérsio Arida, sócio do Opportunity, combinam como pressionar a Previ para que feche com "os italianos" e o Opportunity. 

Enfim, a explosão. Nos telefonemas, o presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, chamado de "a bomba atômica", é instado a pedir à Previ que feche com o Opportunity. O mesmo se dá com o diretor do Banco do Brasil, Ricardo Sérgio de Oliveira. 

As conversas e a montagem de pressões chegam ao auge quando Mendonça de Barros sugere: 

—— Temos que falar com o presidente. 

E André Lara Resende responde: 

—— Isso seria usar a bomba atômica. 

André Lara Resende usa a bomba atômica. Em telefonema, pede ao presidente Fernando Henrique Cardoso: 

—— Precisamos convencer a Previ. 

Na conversa com o presidente (que também não consta na reprodução das duas fitas em posse do governo), Lara Resende não cita o interesse dos "italianos" que freqüentam seus diálogos com Mendonça de Barros. Ao presidente da República, repassa outra informação: 

—— Os portugueses (Telecom Portugal) estão interessados... 

No mesmo telefonema para Fernando Henrique, o presidente do BNDES tece considerações sobre a "necessidade de um operador estrangeiro" etrata como "aventureiros" os integrantes do Telemar, que não disporiam de "capacitação técnica". 

Ao final do telefonema, o presidente diz que vai falar com a Previ. Não se sabe se falou ou não. A Previ ajudou alguns dos seus sócios no consórcio Telemar a bancar o pagamento da compra da Tele Norte Leste. Já o Opportunity ficou com os italianos na Tele Centro Sul. 

QUESTÕES SEMÂNTICAS

Outro trecho que parece ausente nas fitas do governo – ao menos de acordo com o relato de Veja –, é a referência ao ministro da Fazenda, Pedro Malan, e ao secretário executivo Pedro Parente. Conversam Mendonça de Barros e Lara Resende. O ministro das Comunicações refere-se aos companheiros de governo Malan e Parente como "babacas". 

O ministro Mendonça de Barros, em suas versões orais editadas para a imprensa, tem relatado apenas o carinhoso diminutivo "babaquinha", e dedicando-o apenas a Parente. 

O ministro Malan e Parente seriam "babacas" por terem aceitado argumentos do consórcio Telemar e, quiçá (aqui trata-se de uma ilação não obtida em fitas), por divergirem do conjunto da obra. A propósito de divergências, há outras entre o que ouviu CartaCapital e o que se divulgou das fitas do governo. 

Mendonça de Barros, nas fitas, chama integrantes do consórcio Telemar de "ratada", e não "rataiada", conforme relatos oficiais do próprio reproduzidos pela imprensa. As já anunciadas investigações do procurador-geral da República, dr. Geraldo Brindeiro, por certo esclarecerão essa pinimba semântica quanto a roedores. 

Algumas contradições. Mendonça de Barros, que iria ao Senado prestar esclarecimentos na quinta-feira, 19, nesta segunda quinzena de novembro tem repetido, em conversas, os argumentos da incapacidade técnica da "Telegangue", da "ratada " – ou, "rataiada". Informa, ainda, que gestões suas, suprimidas nas fitas gravadas, foram feitas também em favor da formação do consórcio Telemar. 

Restam, então, duas questões. 

Por que o ministro, ou quem de direito, não se valeu das regras do processo de privatização para desqualificar uma empresa que não tinha "capacidade técnica"? 

Por que, uma vez que se tratava de uma "Telegangue", a empresa, mais uma vez, não foi afastada do processo? 

A intervenção deu-se apenas no instante em que o Telemar comprou a Tele Norte Leste, com suas 16 operadoras de telefonia fixa na faixa entre Rio de Janeiro e Amazonas. 

Na hora da liquidação da compra, o BNDES interveio e arrebanhou para si 25% das ações do Telemar, alegando tratar-se de um consórcio "chapa-branca", devido às seguradoras terem capital estatal. Mais uma vez, pergunta-se: por que o consórcio não foi desqualificado a tempo? 

A PEÇA-CHAVE

Vale lembrar. O Tribunal de Contas da União determinou inspeção no BNDES para apurar a legalidade e a regularidade dos atos dos dirigentes da entidade nessa operação. Se o consórcio é "chapa-branca", a ação do BNDES o tornaria ainda mais chapa-branca. Não fosse, é claro, a intenção do ministro em fazer a Telecom-Itália entrar no jogo. 

Peça-chave em todas as negociações, e nos diálogos grampeados, é a Previ. 

Recordemos, então, outra porção do processo de privatização, a da Vale do Rio Doce. 

À época, a Previ, que parecia compor-se com o grupo capitaneado por Antônio Ermírio de Moraes, à última hora bandeou-se para a nau pilotada por Benjamin Steinbruch. 

O mesmo Opportunity integrou também o consórcio vencedor na privatização da Vale. Mais: o mesmo banco Oppportunity, do mesmo Pérsio Arida, ex-presidente do Banco Central no atual governo, tem assento no conselho de administração da Vale. Segundo palavras do próprio ministro Mendonça de Barros, quando do leilão da Vale, o mesmo grupo de senhores "estimulou a competitividade". 

O BEM DA PÁTRIA

Revela o ministro que, então, procurou a Previ – que negociava com Ermírio – e pediu que o fundo entrasse no consórcio da CSN. Tudo em nome da competitividade e, é claro, pelo bem da Pátria. 

Naqueles dias, em entrevista à Veja, Antônio Ermírio bateu duro na operação e cutucou o presidente Fernando Henrique. No domingo, 21 de setembro de 1997, a caminho de Fortaleza, vindo de Sobral, o ex-ministro da Fazenda, Ciro Gomes, disse a CartaCapital: 

- O Antônio Ermírio é inteligente. Viu que querem engoli-lo, e berrou a tempo. Agora, pode dizer ao presidente que não é bem aquilo o que ele disse, mas não vão mais atropelá-lo. 

Ermírio não mais foi atropelado. Nos leilões de privatização do setor elétrico no Rio Grande do Sul e São Paulo, a Previ estava ao lado do Grupo Votorantim. 

No caso do Telemar, em que pesem as pressões de integrantes do governo para que a Previ jogasse preferencialmente com "os italianos" e o Oppportunity, é preciso recordar que o Fundo do Banco do Brasil – que terminaria integrando o Telemar – tem antigas e extensas relações de negócios com o Grupo La Fonte, de Carlos Jereissati. 

E o que diz a lei? Nas fitas, o sócio do Opportunity, Pérsio Arida, não apenas surge em conversas com André Lara Resende, como é anunciada sua presença durante um diálogo. Mendonça de Barros, enquanto negocia com Jair Bilachi, presidente da Previ, para que o fundo se una ao Opportunity informa: 

- Estamos aqui eu, André, Pérsio e Pio... 

Ainda nas fitas, ao comentar os mandados de segurança contra o leilão, Mendonça de Barros, em conversa com Lara Resende, cita o jurista Celso Antônio Bandeira de Mello, a quem se refere como "aquele pavão". A propósito de juristas, talvez seja útil recordar alguns artigos da Constituição, da Lei de Improbidade Administrativa e da Lei de Licitações.”

[Acrescenta PHA]:

(*) Não é à toa que a PolÍcia Federal demonstra certa dificuldade para decifrar os 12 HDs que encontrou atrás da parede falsa do apartamento de Dantas. E o HD do servidor do Banco Opportunity. Já pensou, caro leitor, se o FHC, o José Serra e a filha dele aparecem lá, num desses HDs, protegidos por uma senha criptografada?”

Tuesday, April 07, 2015

TUDO BLUES FESTIVAL - Na UFF



O TUDO BLUES FESTIVAL tem a proposta de mostrar vários estilos do blues, além de referências do jazz e do rock, ritmos que surgiram através do blues.

O Teatro da UFF traz ao público, durante oito dias, músicos e bandas nacionais que diretamente representam o blues aqui no Brasil ou tem no seu repertório influências do blues.

O Blues tem origem nas raízes musicais e na memória oral dos griots – contadores de histórias – dos cantos e danças dos povos da África. Um gênero marcado na história do sul dos Estados Unidos (do final do século XIX) e combinado com a música europeia-americana, que se traduz num canto melancólico e na poesia simples dos escravos das plantações de algodão que usavam para embalar suas jornadas de trabalho. Em temas populares – como religião, amor, sexo, traição e trabalho – eles expressavam seus sofrimentos, angústias e tristezas.

O blues, ao longo do tempo, foi se fragmentando em tendências e sonoridades de seus intérpretes, ora mantendo as tradições acústicas, ora conduzido para território jazzy.

O som eletrônico produziu novos e diferentes estilos, como: o Delta Blues, o Jump Blues, o Texas Blues, o Rhythm and Blues e o Country Blues, entre outros.

Na programação do TUDO BLUES FESTIVAL estão:

16 de abril – Quinta-feira | 21h

GLAUCUS LINX & ANCESTRAIS FUTUROS – Convidado: Altay Veloso

17 de abril – Sexta-feira | 21h

MAURÍCIO SAHADY

18 de abril – Sábado | 21h

BIG GILSON

19 de abril – Domingo | 20h

VICTOR BIGLIONE

23 de abril – Quinta-feira | 21h

CRISTIANO CROCHEMORE & BLUES GROOVERS

24 de abril – Sexta-feira | 21h

SOULSHINE JAM BAND

25 de abril – Sábado | 21h

BIG JOE MANFRA

26 de abril – Domingo | 20h

BLOODY MARY & THE MUNSTERS


Serviço: 6, 17, 18, 19, 11, 23, 24, 26 e 26 de abril

Quinta a sábado 21h / Domingo 20h

Ingresso: R$ 30,00 (inteira) R$15,00 (estudantes, maiores de 60 anos, menores de 21 anos e pessoas com deficiência)

Censura: Livre

Teatro da UFF – Rua Miguel de Frias, 9, Icaraí, Niterói, RJ – Tel.: 3674-7511 
Informações: 3674-7512

Saturday, April 04, 2015

A arte norueguesa no Centro Cultural dos Correios

No Centro Cultural dos Correios no Rio de Janeiro, a exposição da vanguarda norueguesa na gravura com 100 peças. Trata-se de uma homenagem norueguesa aos 450 anos do Rio. 

A exposição tem entrada franca e fica disponível até o fim de abril.






@pauloandel



Friday, April 03, 2015

Romão: racismo, tristeza e uma bala na cabeça

Era uma tarde qualquer de outono na Copacabana de 1975.

Por alguma razão que jamais saberei, provavelmente muito simples, minha mãe resolveu me puxar pela mão - o que ela adorava - e saímos de nossa casa, na rua Santa Clara, até o Lido, mais precisamente na rua Ronald de Carvalho, no prédio art déco que hoje serve de cenário para novelas.

Descemos as escadas do pequeno prédio de grandes apartamentos - que futuramente deixaríamos para um período de meses de dor e miséria em Vaz Lobo, até a volta para Copacabana na Siqueira Campos 143 -, minha mãe fez o sinal, pegamos o táxi. Antes do embarque, do outro lado da rua, Cícero nos cumprimentou efusivamente. Era nosso ex-cozinheiro, de uniforme alinhadíssimo à rua e carregando a barra pesada de ser homossexual assumido no Brasil da ditadura, sem pertencer aos guetos tradicionais. Um homem de muita coragem.

O taxista fez uma corrida rápida. Nenhum trânsito. Santa Clara, Atlântica, retorno no Lido e o velho prédio cinza.

Talvez fosse o apartamento do primeiro o segundo andar quando entramos. A dona da casa era uma amiga da minha mãe ou algo parecido, ou havia alguma espécie de encomenda, um serviço. Chamava-se Vilma.

Na sala, a mesa aberta com bolo e refrigerante. Era uma casa humilde. Fui convidado ao lanche. Uma menina branca do meu tamanho, sentada, talvez disse um oi. Outro garoto, éramos todos pequenos. E mais um garoto grande, que podia ter dez anos de idade. Era negro e magro. Lembro de seu rosto muito triste. Não dava uma palavra. Aquilo me impressionou, a imagem da dor. Lanchamos.

Foi uma visita rápida. A família ia sair. Depois do lanche, minha mãe me ajeitou e todos fomos para o elevador.

Num súbito, a dona Vilma começou a gritar e gritar assustadoramente com o menino negro. Tive medo. Percebi que minha mãe ficou tensa em poucos segundos de descida. Gritos, gritos, violência:

- Seu negro burro! Burro! Idiota! Sua merda!

O garoto tinha o rosto tão triste que era inacreditável não estar chorando. A dona Vilma parecia tão calma e, de repente, explodiu. O acesso de fúria só foi interrompido quando saímos da portaria. Minha mãe fez questão de dar um abraço no garoto negro e nas crianças. Falou com a dona sob certo constrangimento.

Novo sinal para um táxi. Entramos. Demos tchau à família. Aos poucos, com os olhos vermelhos, minha mãe explicou que o menino era filho de criação da dona Vilma. Talvez o filho de alguma empregada, alguma conhecida. Pouco tempo depois, os olhos vermelhos estavam cheios de lágrimas silenciosas, até uma única fala na pequena viagem até Santa Clara:

- Meu Deus, como eu tenho pena do Romão. Se pudesse, trazia ele para morar conosco. Sofre muito.

Pouco tempo depois, deixamos Copacabana temporariamente. Houve um martírio breve em Vaz Lobo. Voltamos. De empresário, meu pai passou a ser um digno empregado novamente. Deixamos um apartamento de 400 metros quadrados para outro de 30, melhorando um pouco na Siqueira Campos, onde ficaríamos dezesseis anos.

Nunca mais vi a dona Vilma. Nem o Romão, com quem não pude trocar uma palavra sequer, brincar de futebol, nada. Só lembro da tristeza de seu rosto. Tempos depois, ele pode ter sido uma peça fundamental na minha vida: sempre carreguei aquele dia no ventre, o que mais tarde influenciou minhas atividades como escoteiro, estudante e militante político. Minha mãe não conseguiu resgatar o menino negro de olhar triste demais e sem palavras.

Agora que a minha mãe não está mais aqui, só restam as minhas próprias lágrimas ao pensar naquele dia de quarenta anos atrás, quando eu era uma criança sem a menor dimensão das coisas do mundo, mas suficientemente atenta para não achar normal a violência contra ninguém. Hoje eu poderia ser avô do menino negro triste e do menino pequeno de cabelos encaracolados e olhinhos, mas sou apenas uma testemunha da tristeza.

Meu amigo Bola ficou naturalmente consternado com o fuzilamento desse menino no Alemão, ao falarmos no Facebook. Mais uma vítima da estupidez da grande sociedade. Todos os meninos deveriam ter direito a brincar, comer, ganhar bom tratamento, crescer e viver, por mais que este mundo injusto, covarde e cruel imponha o contrário.

Eu também fiquei consternado. O garoto do Alemão não teve direito ao futuro, destruído por uma bala na cabeça. E o Romão, onde mora?

O racismo a gente nunca esquece.

Até quando esse país vai insistir em ser um navio negreiro?

@pauloandel