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Friday, March 31, 2023

Até a próxima morte

Como sempre acontece nas últimas décadas, a chuva um pouco mais forte foi suficiente para detonar a cidade e matar pessoas. 

As desculpas são sempre as mesmas: choveu tantos milímetros como nunca, aconteceu o imponderável e outras mentiras estapafúrdias que só convencem os desmemoriados ou desinformados. Ora, se o volume de chuva é grande, o que resolverá? Não é apenas noticiando que choveu demais...

Pouco antes de eu nascer, aconteceu a tempestade de 1966. Durante anos e anos ela foi uma referência de desastre. Aí veio a tempestade de 1988 que parou o Rio por dias e dias - eu era garoto, trabalhei que nem um cão. E depois vieram outras e outras e outras. 

Pouca gente fala, mas a sensação de abandono é tamanha que, ao longo dos tempos, as pessoas passaram a ter medo da chuva no Rio de Janeiro. Basta o céu nublado que as ruas se esvaziam, as pessoas se escondem, compromissos são desmarcados e muitos dias úteis viram ociosos. E é pra ter medo mesmo. A falta de manutenção do sistema elétrico pode te dar um choque mortal, ou você pode ser arrastado pelas águas em plena região urbanizada. Nem é preciso dizer do sofrimento de tanta gente e encostas e lugares de risco. 

Às seis e meia da manhã, o gris do céu tem cheiro de morte. Somado à véspera do aniversário do golpe militar, compõe um conjunto deprimente. Deprimente.

@pauloandel

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