Há exatos 33 anos, à essa hora - três da madrugada - eu poderia cruzar Copacabana a pé, até chegar às Casas da Banha da Siqueira Campos e comprar iguarias pra lanchar. Pão, frios, coca. Voltar para casa com alguma tranquilidade e fazer a boquinha em paz. Com sorte, poderia ver até conversas divertidas dentro do mercado, como a travesti tricolor zoando um general rubro-negro vizinho pela derrota num Fla x Flu.
E podia ir para uma festa maluca em Icaraí, onde não conhecia ninguém, só pra ficar com Ana e depois nos mandarmos às seis da manhã, já com luz no domingo, para dar uma volta na praia e tomar café numa bela padaria do bairro.
Cinemas, havia para todo lado. É perda de tempo tentar explicar para quem não viveu aquilo: um filme só tem sua verdadeira existência quando é exibido na grande tela. O resto é jeitinho. Um monte de cinemas em Copacabana, Tijuca, Centro, todos de rua, todos do jeito que tinham de ser.
Maracanã, minha, nossa casa, lugar de povo e fantasia. A única catedral carioca 100% voltada para a população. Pobres e ricos se acotovelavam e se trocavam o tempo inteiro. Ingressos antecipados? Nem pensar.
Shows para todo lado, pagos e gratuitos. Na Apoteose, na praia, no parque. Quem viu Tears for Fears, Marillion, o apoteótico Bob Dylan? David Bowie e Eric Clapton na Apoteose, Oingo Boingo no estádio da Gávea. A Legião Urbana parando o Rio de Janeiro com seu show no dia da morte de Cazuza.
Tempos depois, os clássicos do grunge: Alice in Chains e, claro, o desgovernado Nirvana. Caetano lotou a praia de Botafogo em 1992, cantando com Djavan. Já o espetacular Tony Bennett teve a areia vazia em sua apresentação no mesmo lugar, que desperdício.
Na Rio 92, os Arcos da Lapa viveram uma tarde inesquecível com as performances de Barão Vermelho, Jello Biafra e Mano Negra. No ano anterior o Maracanã foi tomado de assalto pelo Rock in Rio, com grande e variada programação. Futuramente, o maior estádio do mundo receberia ninguém menos do que Madonna Louise Ciccone para 100 mil pessoas.
Ainda falando de shows, os estudantes da UERJ, UFRJ e PUC foram agraciados com grandes espetáculos gratuitos para o público. Numa parceria com a Brahma, o projeto "Som do meio dia" ajudou a consagrar a então desconhecida Cássia Eller nas universidades, além de divulgar trabalhos espetaculares como Ney Matogrosso ao lado do violonista Raphael Rabello. Tinha até Lobão cantando samba.
O Canecão pulsava e, com ele, um show antológico do Jethro Tull, o início dos Raimundos e, claro, conturbadas turnês de Tim Maia. Do outro lado da cidade, o Imperator abrigava até Peter Gabriel.
O Rio era cheio de bares em muitos bairros e, neles, as pessoas queriam conversar e trocar ideias. Nada de ficar olhando o reality show na televisão. As pessoas iam e vinham, os ônibus e barcas rodavam a noite toda. Tráfico e milícia já estavam nas paradas de sucesso, mas ainda era possível vivenciar partes maravilhosas da cidade.
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