Acordei, tomei café e soube da morte de Arnaldo Jabor. Ele era muitos num só. O cineasta era sua faceta que eu mais admirava, ao contrário da de cronista, mas isso não tem nenhuma importância porque é apenas a minha opinião. Fato é que a figura de Jabor esteve sempre em minha vida desde pequeno, de modo que é lamentável sua perda. Aos poucos, aqueles adultos que eu tentava compreender quando era criança vão se despedindo, porque o tempo é implacável e vence todas as batalhas.
Foi embora o cineasta, deixei pra lá o artículista. Acabei o café e fui para o trabalho presencial. No dia que o lucro for bom, será a melhor ocupação do mundo: ouvir música, pesquisar discos, arrumar livros. Levei John Coltrane e Ruben Gonzalez para ouvir. Estou de olho no fabuloso CD do Tenório Jr, que ninguém comprou ainda. A tarde foi rápida, vendi Iron Maiden, Bill Evans, mais alguma coisa boa.
Saí às cinco, atravessei a Praça Tiradentes e peguei o VLT só para me divertir - é bom demais. Num minuto eu já estava na Casas Pedro, onde comprei uma suculenta pasta de grão de bico e champignons para fazer um sanduíche árabe em casa. Na volta, caminhei por cinco quadras silenciosas até chegar em casa e descansar um pouco. Banho, lanche, Marina, celular carregando e a tragédia de Petrópolis. Há muito tempo o Brasil humilha pessoas, especialmente as mais pobres. Ok, choveu muito, é a natureza mas não dá para culpar exclusivamente o imponderável: todo ano vemos N tragédias acontecendo em chuvas de verão.
Fiz uma live sobre o Fluzão, depois fui trabalhar postando CDs e LPs nas redes sociais da loja. Fizemos algumas vendas. Marina dormiu. O silêncio completo ganhou as ruas da Cruz Vermelha.
Meia noite. A terça-feira acabou. No telejornal, Jabor aparece novamente. Silvio Tendler o define com maestria: "É uma perda muito grande, porque a gente perde o contraditório". Meu amigo Bigode, outro prócer do cinema, o homenageou no Facebook. Gerald Thomas também (e ainda não acredito que ele topou colaborar com meu livro sobre Copacabana). Ricardo Soares, autoridade literária, destacou bem o papel de Jabor.
A tragédia de Petrópolis ocupa a tela da televisão. Há muito sofrimento. Que venha a cura.
Para tentar me distrair, recordo a conversa à tarde com uma amiga querida, tudo pelo WhatsApp e suas brevidades. Falávamos de recalques alheios e ela me contou que uma colega havia reprovado uma foto sua exclusivamente por causa do decote, que era normal, respeitável e admirável. A única coisa que me veio à cabeça foi uma certa frase, do único personagem possível para costurar todo o roteiro escrito até aqui, com perda, tragédia, o cinema de Jabor, o Fluminense e uma sugestão de belo decote: Nelson Rodrigues.
A frase? "Toda nudez será castigada".
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