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Friday, January 04, 2008

A longa noite - partes I e II

I


quando você foi embora
não deixou rastro, nem cheiro
e nem carta de até mais


o que me parecia delírio
tomou ares de eterna mudez,
de silêncio inconveniente,
que ensurdece e apavora


você foi embora e cerrou meu canto,
rachou meu coração em dois,

ficou um para a vida ingrata,
com suas dores e paixões,
cheia de não e porém, ou talvez
e certeza de quase nada

a outra metade é toda tua
sempre tua, a cada momento


hoje eu não quero ver o sol
nem o mar da praiva vermelha,
basta-me cogitar o teu abraço,
o teu beijo de afago e certa graça
que só mora em teu sorriso,
em tuas piadas de sempre



hoje, não posso apertar a tua mão,
e daí?


todo lugar tem o teu rosto

qualquer frase na tua voz é poema

e cada passo que eu dou
exige o respirar do teu ar
do meu amor solene
teu, perene



II



A longa noite
é longa e morna
é longa e mansa
há noite

há um caminho de pedras
e percalços escondidos
no fúnebre silêncio
imerso em negrume

à própria sorte
a morte à noite

alonga-se a noite, feito um açoite
nas costas nuas dos pretos velhos,
dilacerados em vida

há noite ao norte
para cada estrela que brilha,

mesmo há muito morta,
a estrela estende as mãos
em forma de brilho,
na desilusão da esperança
que não se prende,
não espera quem a alcança
afoito, pela noite,
avançando horizonte

há noite, a longa noite,
doce e traidora noite,
que repousa cativa
no mar da tranquilidade,
no afago secreto da lua,
serpente no monte,

há noite,
a longa noite em riste
é tristeza pintada com aquarela.



Em homenagem à pessoa mais importante de minha vida, minha mãe, Maria de Lourdes Andel.



Paulo-Roberto Andel, 04/01/2008

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