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Wednesday, August 14, 2024

No metrô

Fui pro Parque Lage ver meu amigo e mestre Bigode falando de cinema. Ia de Uber, desisti. Uber sempre demora quando você precisa, então escolhi o metrô e a conexão Botafogo-Jardim Botânico. 

Eu ia lanchar um cachorro quente no Gaúcho, mas o horário ia apertar e decidi por dois churrasquinhos fast food na esquina. Gostoso. Então peguei um 201 e saltei na Carioca três minutos depois. 

O movimento do metrô estava calmo. Pouca gente em pé, o silêncio enorme de ouvidos com fones e mãos nos smartphones. Na Cinelândia entrou uma garota baixinha. Quando a porta do trem fechou, ela explicou que tinha dois filhos e que estava ali oferecendo balas. 

Das trinta ou quarenta pessoas, três se manifestaram: eu, que agradeci a oferta, mais uma senhora e um rapaz que compraram. Eu sempre compro, mesmo quando não gosto, só para fortalecer e nem sou fã de doces, mas estava sem um níquel na carteira. 

O resto olhou como se não fosse nada. Mesmo sem ouvir por causa dos fones, os passageiros sabiam muito bem que se tratava de uma trabalhadora humilde, educada, tendo que driblar até o autoritarismo do metrô para poder trabalhar. 

Aquilo me constrangeu. Eu sei como é ser humilhado. Quantas e quantas vezes gente que se diz minha amiga me humilhou quando precisei de ajuda? Muitas. Mas será que as pessoas não podem ter um mínimo de cortesia com alguém que merece respeito? Precisam mostrar que a pessoa pobre deve ser desprezada. 

A garota começou seu caminho pelos dez vagões acidente, anunciando a oferta em cada um deles. Em silêncio eu torci muito por ela, para que vendesse bastante. Torci como ninguém torce para mim - e olha que estou precisando demais. 

O que será que alimenta esse espírito de porco em parte da nossa população. Reitero: a vida está difícil, quase todos mundo está duro. Ninguém era obrigado a comprar, embora todos saibamos que essa é uma maneira de se ajudar pessoas em grande dificuldade financeira. Mas por que a escrotidão? Fingir que ali não havia uma pessoa falando, trabalhando e, ao  mesmo tempo, pedindo ajuda. De onde vem essa indiferença nojenta? 

Mesmo fora do metrô, já no ônibus vermelhinho a caminho do Parque Lage, pensei na cena. Eu também sou um brasileiro oprimido e humilhado, também já fui tratado com muita indiferença, mas ainda estou sobrevivendo. Lógico, aqueles falsos amigos estão no limbo sem previsão de resgate. Todo mundo que não é rico já foi humilhado. 

Ainda bem que o resto da noite foi legal.

@pauloandel

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