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Wednesday, July 17, 2024

Trinta anos depois da Copa de 1994

Eis o tempo, que escorre e vai oferecendo reflexões e reflexões, ainda mais no futebol por ter uma espécie de tempo próprio. 

Imagine a ficção científica se você estivesse em 1994 e um cientista te oferecesse uma oportunidade como a do famoso filme "De volta para o futuro". "Você vai para 2024 e espia como está a Seleção Brasileira, depois volta". O susto seria grande. Estamos mal, bem mal e com evidente preocupação. 

Há trinta anos, o Brasil vivia uma loucura. Depois de 24 anos, voltamos a ganhar uma Copa do Mundo em decisão dramática contra a velha Itália, sempre ela. Pela primeira vez, a Copa foi decidida nos pênaltis - e talvez esse drama ajude a explicar porque nós, brasileiros, passamos anos e anos sacaneando os tetra campeões.

Ah, o Zinho é enceradeira. Ah, o Brasil não joga bonito. Ah, o Brasil não goleia. 

Não, a Seleção de 1994 não se compara às suas antecessoras vitoriosas em 1958, 1962 e principalmente 1970. Mas qual outra Seleção no mundo se compararia? Talvez justamente as que não venceram, talvez. Hungria 1954, Holanda 1974 e Brasil, ele mesmo, 1982.

A verdade é que, longe de paternalismos, não soubemos dar o devido valor aos tetra. Reconhecer que, desde a retumbante goleada sobre a Bolívia no Arruda, reagimos nas eliminatórias até a batalha final diante do Uruguai, quando Romário fez a maior exibição de sua carreira. 

O Brasil não era uma tampinha chutada no chão. Na boca da Copa, perdeu Mozer e Ricardo Gomes, depois Ricardo Rocha - que outra Seleção aguentaria esse tranco? E o azar em ter um craque como Raí na pior fase de sua carreira? Tivemos e superamos. 

Taffarel, goleiraço. Jorginho, monstruoso. Aldair e Márcio Santos, duas feras. Leonardo, ótimo. Quando Branco entrou, decidiu e mostrou a que veio. 

Dunga e Mauro Silva formavam uma tremenda dupla de volantes. Mazinho era um jogadoraço, capaz de fazer várias funções. E Zinho ia muito, mas muito além da enceradeira, como provou no decorrer de sua carreira. 

Bebeto e Romário. Desnecessário comentar. 

Membro da comissão técnica de 1970, Parreira já nasceu com o DNA da vitória. Um dos treinadores que mais classificou equipes para os mundiais, fez trabalhos espetaculares no Brasil, sendo o Fluminense de 1984 o melhor deles. Com Parreira, o Brasil foi frio, equilibrado, pragmático mas também talentoso. Ao lado de Parreira, o implacável e glorioso Zagallo. 

Não brilhamos intensamente em todos os jogos, mas o fato é que o Brasil se impôs a todos os rivais na Copa dos EUA. Sua única grande dificuldade além da final foi a semifinal diante da poderosa Holanda, num jogaço por sinal. Em todas as partidas o futebol brasileiro foi superior, traduzindo sua força em grandes jogadas. 

A beleza dos gols de Romário e Bebeto, a eficiência dos passes de Dunga, os bons cruzamentos de Jorginho, a  elegância do miolo com Aldair e Márcio Santos, tudo isso está registrado. 

Ok, não fomos brilhantes o tempo todo e nem precisávamos. Agimos quando foi preciso. Rever os jogos contra a Holanda e a Suécia a seguir, pela semifinal, ajudaria muitos a perceber que a nossa Seleção estava longe da mediocridade.

Há trinta anos o Brasil parou e enlouqueceu. As pessoas foram ao delírio. Nós não tínhamos mais Pelé e Garrincha, Didi ou Tostão, é fato, mas ainda tínhamos uma cortina do passado: Bebeto e Romário foram assombrosos, Taffarel e Jorginho foram devastadores, Branco foi demolidor, Dunga foi o símbolo da garra. O Brasil ganhou o tetra porque mereceu. 

Quem não queria ter a chance de rever Pelé no campo? Ou Rivellino? Ou Didi? Claro que sim, mas na inevitável ausência destes craques porque o tempo não para, não há como não reconhecer que o Brasil de 1994 teve o seu valor. Que o digam os tempos modernos em que estamos, ao menos por ora. 

@pauloandel

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