DOIS garotos pretos sentados
na calçada próxima ao estacionamento anexo ao edifício da Cruz Vermelha no
coração da cidade do Rio, algo em torno de sete horas da manhã, talvez tivessem
doze ou quinze anos, garotos do mesmo jeito. Limpos - mas humílimos em suas
vestes -, com ar de tristeza numa sexta-feira que irradia sol sem querer dizer
que isso resume a vida em forma de felicidade – pessoas vão morrer, pessoas vão
ser enterradas, pequenas e grandes tragédias pessoais podem acontecer, eu mesmo
enterrei praticamente todas as pessoas queridas por mim em dias de sol
desértico.
Dois garotos pretos silenciosos,
de olhar perdido e um silêncio de dar dó, como se o mundo parecesse a desolação
suprema – por que não? – que nasce diariamente nas grandes cidades, com seus
edifícios supremos, sua opulência e um completo dar de ombros ao próximo. A cidade
das pessoas descartáveis. O mundo onde talvez baste o telefonema rápido, o
e-mail, a frase curta no whatsapp e
tudo está resolvido porque não se pode perder tempo – e ele deve ser investido
em que mesmo?
Dois garotos pretos, pobres,
limpos, mas vestidos com roupas bastante humildes, não pareciam moradores de
rua e nem dotados das mazelas cotidianas que geralmente mostram suas garras a
olhos nus, tais como o uso das drogas da morte. Apenas dois garotos mudos, de
olhar perdido, vagando por galáxias que ninguém saberá descrever – talvez nem
eles mesmos – num cenário urbano e frio em pleno dia de sol no Rio de Janeiro,
geralmente melhor aproveitado pelos mais abonados e desocupados – estes,
temporária ou permanentemente falando. A cidade está viva, o verão se avizinha,
o ano começa a dizer adeus e todos falam de seus planos, suas promessas, os
novos velhos sonhos que, de certa forma, nos oferecem combustível para
percorrer a longa estrada da inevitável solidão – por mais que se esteve perto
de quem se gosta, de quem se ama, é impossível não pensar na mesma solidão em
algum ou vários momentos.
Dois garotos pretos, pobres,
limpos, vestidos com roupas humildes, com olhar perdido. Retratos de um mundo
que jamais será justo. Retratos de uma reflexão sobre o sentido das coisas, o
sentido da vida – se é que ele existe -, o tempo que desperdiçamos com
bobagens, vaidades, obsessões, que nada significa diante do fato que aqui somos
mera passagem, ninguém pertence a ninguém, o eterno não passa de efêmero.
Grandes anúncios de grandes corporações na televisão, nos computadores e
jornais, qualquer lugar. Seja um vencedor, tenha o poder, desfrute das boas
coisas da vida, seja o melhor, tudo num balaio de grandes babaquices quando o
mundo se resume a amigos, amores e alguma alegria vã, num intervalo entre as
dores.
Dois garotos tristes. Ao me
aproximar, disse-lhes uma saudação de bom dia. Não responderam absolutamente
nada. Entendi.
@pauloandel
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