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Thursday, March 22, 2012

PASSAGENS








AMORTECEDORES

e quando foi
que você arrumou
caixinhas de amor
numa prateleira?
e quando mediu
trinta e oito graus
de febre do amor
num termômetro
apraz?
foi você
quem injetou amor
pela bomba
de gasolina?
e quem te disse
do amor estar
numa promoção
de vitrines?
quem mastiga
snacks de amor
que não configurem
a quebra de um
regime?
pois é, eu quase
não percebi
quando estive
empolgado
e fiz minha
jorra de amor -
tragam-me
um cálice de amor
quero tragar
um cigarro de amor
manchetes e fotos
chamadas e vídeos
falando de amor
enquanto *o verme
passeia na lua
cheia e ninguém
percebe o rigor
bíblico
aos pés
do amortecedor

paulorobertoandel 2032012

*Citação de "Flores Astrais", 1973


DOR ELEGANTE

(Itamar Assumpção/ Paulo Leminski)

Um homem com uma dor
É muito mais elegante
Caminha assim de lado
Com se chegando atrasado
Chegasse mais adiante

Carrega o peso da dor
Como se portasse medalhas
Uma coroa, um milhão de dólares
Ou coisa que os valha

Ópios, edens, analgésicos
Não me toquem nesse dor
Ela é tudo o que me sobra
Sofrer vai ser a minha última obra


QUEM CANTA SEUS MALES ESPANTA

(Itamar Assumpção)

Entro em transe se canto, desgraça vira encanto
Meu coração bate tanto, sinto tremores no corpo
Direto e reto, suando, gemendo, resfolegando

Eu me transformo em outras, determinados momentos
Cubro com as mãos meu rosto, sozinha no apartamento
Às vezes eu choro tanto, já logo quando levanto
Tem dias fico com medo, invoco tudo que é santo
E clamo em italiano ó Dio come ti amo
Eu me transmuto em outras, determinados momentos
Cubro com as mãos meu rosto, sozinha no apartamento

Vivo voando, voando, não passo de louca mansa
Cheia de tesão por dentro, se rola na face o pranto
Deixo que role e pronto, meus males eu mesma espanto

Eu me transbordo em outras, determinados momentos
Cubro com as mãos meu rosto, sozinha no apartamento

É pelos palcos que vivo, seguindo o meu destino
É tudo desde menina, é muito mais do que isso
É bem maior que aquilo , sereia eis minha sina

Eu me descubro em outras, determinados momentos
Cubro com as mãos meu rosto, sozinha no apartamento

Entro em transe se canto às vezes eu choro tanto
Vivo voando voando é pelos palcos que vivo


VERSOS ÍNTIMOS

(Augusto dos Anjos)

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!


HIPÓTESE

Nenhuma premissa
Me faz elegante –
Sou um desajeitado
Doidivanas
E isso requer
Desmerecer
O importante

paulorobertoandel 22032012

5 comments:

Pedro Du Bois said...

Caro Andel, identifico-me sempre com sua verve: faz-me bem. Abraços, Pedro.

Paulo-Roberto Andel said...

Eu que agradeço sempre, Poeta!

Tatiany Melo said...

Pra mim, Augusto dos Anjos soube expressar exatamente a tristeza de todo amor:

A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Nem preciso dizer, que cada vez que entro aqui, me perco nisso tudo e não quero mais ir embora! :)

Tatiany Melo said...

Eu tava me camuflando, mas, cá estou eu assumindo a autoria do comentário acima!!!

Paulo-Roberto Andel said...

:)))