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Friday, October 07, 2011

BACK ON EARTH TOUR


Nº 1 – 07/10/2011

Enquanto a morte não amanhece – e que longe esteja! -, a repetição das coisas serve de vestibular para o esmero, tanto para o bem quanto para o mal. E voltar é verbo que não necessariamente precisa de motivo: simplesmente acontece.

I

Duas garotas na mesa ao lado, enquanto almoço no simpático restaurante da esquina da rua do Senado. Sempre bem freqüentado. A dieta me impõe um prato de leveza e sem frituras, que consumo com relativa velocidade junto a um copo de Guaravita. Elas conversam e ouço, de tão perto que estou. Uma parece tensa, a outra não. A calma é loura, de pouca altura, perfil bonito e óculos instigantes; sua amiga é morena, gordinha, tem um ar de alegria que não parece harmonizado com as linhas de tensão à testa. Comentam sobre os exames, a volta ao hospital, até que a morena diz “Nunca mais faço quimioterapia, é muito massacrante. Bom, de toda forma você tem boa resistência”. Olho para o prato e resta um pedaço de filé de peixe, que saboreio com prazer, mas o fato é que fiquei ali completamente solidário à causa das duas garotas. Parecem tão jovens e fortes. Recordo as mazelas da vida, as injustiças, amigos que perdi. Penso em dizer algumas palavras, mas pareceria invasivo. Termino a refeição e sigo para o caixa; pago a conta e volto ao trabalho. Talvez tenha sido a conversa mais emocionante que meu ouvido esquerdo tenha pinçado como intruso em uma mesa alheia. Tomara que tudo dê certo.

II

Segunda-feira completaremos quinze anos sem Renato Russo. Em dois meses e meio, dez anos sem Cássia Eller. Não é o caso de dizer que o rock errou, mas ele claramente empobreceu, assim como a poesia musical – contestada por parte dos “formadores de opinião” que tanto detesto. Chico Buarque não é poesia? Luiz Melodia? Tom Zé? Tom Jobim? Zeca Baleiro? Façam-me o favor: vão se catar!

III

O festival chamado RIR: Claudia Leite, I.S., Ryhanna, Kate Perry, Shakira, Maroon 5.


O festival chamado SWU: Peter Gabriel, Alice in Chains, Stone Temple Pilots, Sonic Youth, Lynyrd Skynyrd.

Rock no devido lugar.


IV


Velho amigo me procura numa rede social, apoiado por linda amiga. Sugere que eu seja o articulador de um encontro de ex-companheiros dos tempos de faculdade. A idéia é maravilhosa.

Mas declinei, ao menos parcialmente.


Não acredito mais nos grandes grupos, ainda mais depois que as pessoas ficam vinte anos sem se encontrar.

Todos mudam um pouco, muitos mudam muito. E a maioria, para pior.


Aparece o ex-miserável que rezava aos céus por estudar de graça, hoje bem-sucedido e agora dizendo que tem mais é que privatizar tudo. O ex-quase-analfabeto que agora se vangloria de falar francês, mesmo desconhecendo completamente Rimbaud, Victor Hugo, Genet ou Godard. A baranguinha que se achava gostosa porque todo mundo pegava e que, aos quarenta anos, se sente com dezenove – todo mundo tem direito a ter celulites e varizes, mas ninguém é obrigado a ver pelancas expostas. E o cara chato metido a malandrão que, duas décadas depois, não mudou nada?


Viver é fundamental, mas tem um ônus: o perceber da escrotidão humana.

Pequena turba, uns seis ou oito, ainda vai.


Tentarei convencê-los.


V


Coisa de uns quarenta dias, estive em SP a trabalho. No sábado, flanei pela Paulicéia. Certa hora, vi que estava muito perto do que chamam de a “Cracolândia” (velha mazela de lá que agora ganha incrível velocidade no RJ).

Eu sou do contra. Fui dar uma espiada, sob relativa distância regulamentar.


É um cenário de guerra. Horror.


Não acredito em inferno, mas, se acreditasse, ali estava exposto.


Farrapos humanos à beira da morte subsidiados pela indiferença e pelo egoísmo, zumbis condenados.

Tristeza. Dor. Desilusão.


Fundamental fazer estas coisas de vez em quando para não se deixar mergulhar na abominável alienação de boa parte da turba que se acha diferenciada “do bem”. São os mesmos que sentiam nojinho quando a turma da Baixada “invadia” o Barra Shopping para também desfrutar das maravilhas capitalistas. Argh. Criticam sem propor. Realmente se acham melhores do que os outros, sem qualquer sentido lógico.

VI

Então voltei/ por que não busquei sentido/ reviver e reprisar cousas da vida/ para não represar vontades/ voltei à toa/ sem plano ou meta/ sem ambição sensata/ tentar ocupar o tempo para não mofar em ócio/ e falar sozinho frente ao texto/ gravar minhas pequenas inutilidades/ recusar a mansidão/ mesmo que à frente tudo pareça relento/ vadio espaço/ hospedado na ilusão de um moinho de vento.

VII



PRA



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