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Tuesday, October 20, 2009

LEVE / PROCURO



LEVE


e a palavra
leve
sugere que flana
pelo
breve:
a sutileza na tangente,
o anseio da secante,
o zênite da
r
e
t
a
permanente!
a palavra,
leve,
sugere a graça
dum boneco de neve –
tão leve quanto pluma
que voa ao vento
sem testemunhar
quem a desprendeu
num

momento



PROCURO

o progresso chegou ao meu bairro:
cenas de ordem e progresso
paredes e casas foram
derrubadas
e modificadas;
a rua, esburacada;
a pobreza, removida;
todavia
tudo parece tão longe
do que ainda
procuro

brilham o céu e o inferno
enquanto
o moderno
disputa espaço com
o eterno
e o efêmero manda lembranças
porque também é vida;
austero, ele reúne os outros,
mas todos permanecem
alheios
ao que ainda procuro

de um lado, os mortos;
de outro, os feridos –
em qualquer visada,
a solidão dos miseráveis;
meus olhos não sabem
disfarçar a frustração
de não ter encontrado
o que
procuro

frente ao ventre
que me cobiça,
a fartura dos seios,
a leveza da pele:
a beleza infinita que mora
na jovem ousada
na linda mulher amadurecida –
cada uma delas
traz um cântico
de imagens sedentas
de vida, tesão, desejos
enquanto uma outra vida
me oferta um amargo gracejo:
são todas distantes,
muito distantes
do que almejo
e procuro

bondade não é delírio
e o fascínio
não é bivaque
na mediocridade;
a cidade, rompida,
esconde seus rancores em festas,
folguedos
e armistícios;
não me furto a espiar por uma fresta
o meu temor redivivo:
ainda não estive frente à frente
com o que
ainda
procuro

suspiros de vida e morte,
presságios e agouros,
azar ou sorte;
medos e coragens
roçam faces nas ruas:
são veias abertas,
sofridas,
donde escorre o sangue
límpido,
o sangue bravio
que faz tambor
em meu peito –
e, por isso, reitera
i n t e n s a m e n t e
que ainda moro longe,
muito longe
do que procuro

banhado em mar salgado
de ilusões,
náufrago do real;
colosso sem grandeza nacional,
sem pecados
ou
religiões:
nas vias, as procissões
se agigantam
e saúdam o deus da vida nova,
do além prometido,
onde todos são bons
e tudo é perfeito –
mas tudo me parece
tão suspeito,
tão diferente,
que percebo subitamente
a ausência
do que procuro

e ainda procuro, procuro

p r o c u r o

Paulo-Roberto Andel, 20/10/2009

4 comments:

Elika Takimoto said...

Estou ajoelhada perante aos seus pés. O queixo tocando o meu colo.

Ó, Paulo Andel, vai ser bom assim lá na pultaquilparil !!!!

Adoro quando vc apronta mais uma.

;-)

Lau Milesi said...

Paulinho,você agora passou dos limites. D+.
Esse livro tem que sair o mais rápido possível .
Beijossss

Mariano P. Sousa said...

Sábio poeta!
Eu tiro o chapéu.
E deixo um abraço!

Pedro Du Bois said...

Caro Andel, a leveza com que você procura: e acha as palavras exatas.
Abraços, Pedro.