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Friday, August 18, 2006

Jangão

Escutei o choro de minha mãe ao telefone e parti rapidamente para casa.
Coisa de cinco da tarde.

Soube então da morte de meu tio.

Foi um homem bom e carinhoso. Teve uma vida de percalços. Muito pobre e batalhador árduo durante boa parte da vida. Lembro-me em 2002, quando ele mostrara-se tão orgulhoso ao me conhecer; eu sou único universitário dentre mais de cem familiares por parte materna e, embora isso não tenha a menor importância pessoal para mim, dele tive um tratamento de pai durante uma semana que passei em Ponta Grossa, cidade paranaense.

Levei trinta e seis anos para conhecê-lo e só tive uma semana, única.

Minha mãe, criança ainda, saiu de casa para buscar emprego em Curitiba nos anos cinqüenta, visando ajudar a família em casa. Não tinha dez anos. Passou em casas de família, dormiu na rua, sofreu. Acabou conhecendo um grupo de ciganos e, por consequência, veio parar em Resende, na divisa entre Rio e São Paulo. Nunca conseguiu dinheiro para voltar. Sofreu.

Quanto eu tinha vinte anos, comecei a tentar pesquisar o possível paradeiro da família. Foi uma década perdida: com a morte de meu avô, os humílimos filhos sequer tinham certidões de nascimento, e todos foram registrados com o sobrenome Antunes, não o correto Quadros – por isso, nunca os achei em listas telefônicas ou similares.

Com o advento da rede mundial de computadores, passei a pesquisar em salas de bate-papo, sem qualquer sucesso. Um dia, uma moça que jamais conheci, ao saber da história, manteve-se anônima mas ficou de fazer chegar meu pedido a quem pudesse ajudar. Dias depois, um homem de grande coração, Rubens Tuma, telefonou-me; confirmei a história e prontificou-se a ajudar. Dias depois, nosso pedido de contato foi veiculado em uma grande rádio popular da cidade e, com isso, conseguimos realizar o sonho de fazer minha mãe rever os parentes. Alguns não puderam esperar, já eram idos; outros, muitos, lá estiveram e a abraçaram como nunca. Se alguém tivesse me perguntado qual foi a coisa mais bonita que tinha acontecido em minha vida, eu certamente teria dito que foi essa, a de ajudar a plantar felicidade no coração da minha amada mãe.

Tempos depois, uma tia faleceu. Minha mãe chorou como nunca, à distância de mil quilômetros, como ontem – e, para nós filhos, esta é a pior das dores: ver o sofrimento dos pais.

Meu tio, depois de uma vida de muito sacrifício, nos últimos anos de vida arrendou um barzinho, onde faziam serestas, coisa muito simples, típica da boa gente do interior. Na única semana que nos vimos, abraçou-me muito e parecia feliz. Devia ser mesmo.

Sinto uma dor enorme. Não sei descrever.

É a dor da distância.
A de não poder ter vivido as coisas. A de não poder ter ficado mais perto da minha gente, nem minha mãe, coitada. Não foi culpa minha, mas era merecido um jeito diferente de lidar com isso.
Ao meu tio Jango, João Maria, nome mais que brasileiro, meus sinceros melhores sentimentos de amor.


Paulo Roberto Andel 18/08/06

2 comments:

Anonymous said...

Meus sentimentos!
Abraço MuQKi

Anonymous said...

esqueci de assinar.