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Saturday, January 09, 2021

miami peep show

Com anos de atraso, o Rio de Janeiro passou a sediar um velho costume estadunidense e europeu: o peep show, a casa de espetáculos eróticos onde os clientes, dentro de cabines apreciam as garotas numa arena de vidro simultaneamente ou não. Cada ficha dá direito a dois minutos de show. Num espaço anexo, funcionam as famosas cabines solo: nelas, o cliente tem um show exclusivo de sua modelo preferida, com mais tempo, mas precisa gastar pelo menos cinco fichas, sendo que a cabine não é 100% isolada entre cliente e modelo. Ou seja, passa a mão boba, as pequenas brincadeiras, um cachê a mais e, claro, os telefones de contato para futuros encontros de amor. 

E se alguma coisa vai começar no Rio de Janeiro, evidentemente a plataforma de lançamentos só pode ser num lugar: Copacabana. 

Miami Peep Show. Esquina de Hilário de Gouveia com Avenida Copacabana, bem perto do primeiro McDonald's do Brasil, do Banco Real, do Supermercado Pão de Açúcar (antigo Peg-Pag) e da locadora: a igreja católica. Sim! A Igreja de Nossa Senhora de Copacabana é a dona dos imóveis de parte daquela quadra e celebrou um contrato de locação honesto, sério. 

No térreo, a Miami vende produtos eróticos e fitas VHS. Subindo uma escada vermelha, logo você chega ao palácio erótico do bairro, que abre às onze da manhã e vai até meia noite, de domingo a domingo. Numa parede, tem o elenco de modelos da casa, cada uma com uma lâmpada acima da foto: as acesas indicam as titulares do dia, todas alucinantes. E é possível assistir a vídeos eróticos também, em cabines com TV, sem modelos.  

O ambiente está sempre limpo e quase ninguém repara que os supostos rapazes que cuidam de higienizar as cabines permanentemente na verdade são garotas homoafetivas, todas com cabelos muito curtos e roupas largas que enganam os olhares desatentos. Elas também mantém o semblante muito sério, regras da casa e também para evitar machismos e até mesmo assédios, num ambiente marcado pela intensa libido provocada pelas modelos. Eficientes, as funcionárias da limpeza deixam as cabines impecáveis, sem vestígios da excitação da clientela mais afobada. 

A Miami tem um locutor que anuncia as atrações na arena, as modelos disponíveis para a cabine solo e também para saudar os habituês e heróis da casa. O guitarrista John Avila não sai de lá: é tão conhecido que chega a comparecer nas festas de aniversários das modelos, churrascos com os frequentadores e mesas redondas, onde se faz a resenha da semana e as melhores performances das meninas. O comerciante Eduardo Eddie é um verdadeiro obcecado pela Miami: frequenta pelo menos duas vezes por semana e não aceita jogar menos de 20 fichas cada vez. Embora more do outro lado da cidade e trabalhe no Centro, ele faz tudo para que possa ir a Copacabana e, mesmo num intervalo de meia hora, tenha condições de apreciar as beldades - inclusive já convidou uma delas para saborear um cachorro-quente enquanto a modelo lhe contava sobre um livro erótico que pretende escrever. Perto dali, o estudante LC organiza campeonatos regulares de futebol de botão em sua casa, mas evita ao máximo que os participantes se ofereçam para ir comprar pizzas na Bella Blú, patrimônio gastronômico do bairro: os voluntários acabam esticando quatro quadras adiante e, dependendo das gatas do dia, podem parafrasear o ator Joel Barcelos no antológico filme "Rio Babilônia", conversando com sua namorada estadunidense: "No money, no pizza". Resumindo: torrando a grana do lanche em fichas de tesão.

Garotos imberbes, coroas, marombeiros, estudantes, profissionais liberais, todo mundo passa pela Miami em busca das emoções visuais. De conhecidos repórteres esportivos da Globo até parlamentares respeitáveis. Noutro dia, quem apareceu foi Paulo Sérgio, jovem goleiro reserva do Fluminense que acabou de ser campeão com o antológico gol de barriga de Renato Gaúcho - um sex symbol das garotas da casa. Entrevistado pela revista Placar, Paulo considera o ambiente bastante excitante. Depois de conferir a performance da modelo Samantha, Paulo não se fez de rogado: "Tive vontade de quebrar o vidro da cabine e agarrá-la. O poeta maior do bairro na era contemporânea, Fausto Fawcett, tem na Miami uma de suas fontes de inspiração literária. Um de seus versos cabe perfeitamente na arena: "Purgatório da beleza e do caos".


@pauloandel

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