Pessoas famintas e naturalmente chorosas, deitadas por esgotamento perto da igreja na Praça dos Paraíbas, bem perto do cadáver da Miami Peep Show.
Jovens sem futuro fumando crack na porta de agências bancárias nas imediações da Praça do Lido, sonhando com uma recuperação impossível.
Dois amigos gays atravessam a imensa calçada do lado direito da Barata Ribeiro, que vai da Belford Roxo até o famoso Edifício Richard, ex-200, atual 194 - e Fausto Fawcett deve estar acordado escrevendo sua literatura high tech down by law.
Na elegante rua Toneleiro, com suas múltiplas grafias, os prédios de garbo têm quase todas as suas janelas com luzes apagadas, enquanto uma moto passa no asfalto a 172 quilômetros por hora.
Alguém sente saudades da maravilhosa Sorveteria Bolonha, que viveu por cinquenta anos na esquina de Constante Ramos com Barata Ribeiro, mas não resistiu à pandemia.
Bons espíritos podem se lembrar da Casa Gaio Marti, do Mercadinho Azul, do Metro Copacabana com seu ar condicionado potentíssimo e de tantos cinemas maravilhosos do bairro - somente o Joia resiste. Uma inimaginável Copacabana sem cinemas.
De São Paulo, o espanhol Antonio Carlos Gonzalez ri das grandes noites do bairro nos anos 1980, repletas de garotas e loucuras.
Bem mais de perto, há o cineasta e poeta Luiz Carlos Lacerda, que cortava o bairro com sua jovem e linda amiga Leila Diniz, culminando no Beco da Fome na madrugada.
Algum saudosista esfomeado e com dinheiro deseja a volta do Gordon, a mitológica lanchonete que ficava aberta até às seis da manhã e tinha crepes, mate e hambúrgueres maravilhosos. Alguém vai se lembrar do atendente Misaque?
[meu coração é uma lágrima. paro um tempo, vou à geladeira, trago um copo com água gasosa.
Temendo o despejo de sua quitinete, um garoto bonito e solitário chora num banco de concreto da praia de Copacabana, enquanto espia o mistério fúnebre do mar à madrugada - em 1993.
Algumas garotas de programa ficam de sentinelas do sexo na avenida Atlântica perto do Posto Quatro. Mais adiante, fica o esplendor das travestis na Souza Lima, que Cler tanto admira.
Numa conversa risonha do botequim na Aires Saldanha, alguém defende o fim da muralha da Praça Sarah Kubistchek.
Os carros, esses invencíveis namorados do asfalto de Copacabana, vão e vem, cortando a velha Gotham City brasileira que já não tem vestígios do Sacha's, do Vogue e até da Fiorentina.
Sempre tem alguém nos pontos de ônibus deixando o bairro que nunca dorme, a caminho da Central do Brasil, Nova Iguaçu ou Caxias. Quem sabe Vila da Penha?
Nenhum vestígio de famosos moradores em situação de rua que marcaram época, tais como Baiano, Mister Éter e Ramiro, mas também não há de celebridades como Cat Stevens, Mick Jagger e Bob Dylan. Nem do grande aniversariante Caetano Veloso.
Ivan Lessa, inesquecível cronista, sempre recordou o valão da praia em frente à Constante Ramos, com uma grande faixa de areia preta por causa do esgoto.
Alguns poucos clientes nos quiosques da praia, compreensível por conta do medo da violência.
Impávida, a estátua de Carlson Gracie senta praça bem perto do metrô da Siqueira Campos, leia-se acesso pela Figueiredo Magalhães, a metros do Shopping dos Antiquários e do Solar da Família Couceiro.
Quase nenhum jovem da região sabe dizer sobre o atentado no Edifício Albervania, melhor dizendo, o atentado contra Carlos Lacerda que levou ao suicídio de Getúlio Vargas em 1954.
Daqui a pouco é um novo dia.
@pauloandel
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