a missa dos escravos
era quilombo disfarçado
num veloz yorubá,
era fuga do inferno
para a bênção de oxalá,
a missa era canto,
era pranto de dores,
desesperança em fé
a missa dos escravos
era o alívio das almas
fatigadas, estupradas
sem piedade ou compaixão,
almas dispersas,
malversadas no riso do sinhô
era missa, era fuga
era passo ao cadafalso,
a corda, aos olhos era fim
missa diadorim
noite dos náufragos
era silêncio de amém, obá!
a missa dos escravos
era sempre a nação zumbi.
(Para Hermeto Pascoal)
Paulo-Roberto Andel, 08/11/2007
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Thursday, November 08, 2007
Ultimamente
era certa noite de terça-feira, eu fitava uma morena
e lembrava de minha mãe,
minha querida mãe, que se escondeu no infinito,
no longe d'orizonte preto
que não tinha Xuru, nem João e nem Luiz
ou Bustamante,
um disparate.
as pessoas têm morrido demais, de forma que só as vejo em mim,
em meus pensamentos que perambulam nas calçadas,
entre os passos apressados das grandes ruas,
pelo aperto das gentes nos veículos coletivos,
nos corredores de acesso aos estádios de futebol,
nos carros engarrafados nos arredores da orla azul de mar.
as pessoas têm morrido nas conversas de bar,
onde outrora é hoje,
e falecem nos dias de sol, com música de rua
em alto-falantes e batidões
as pessoas têm fenecido no funk, no rock,
sem axé nem bênção, sem cânfora nem bálsamo
as pessoas morrem nos feriados, nas férias
e numa terça-feira qualquer, aos olhos duma morena
e justamente por morrerem muito, são fagulhas de vida,
permanentes, e faíscam pelo eterno breve.
Paulo-Roberto Andel, 09/11/2007
e lembrava de minha mãe,
minha querida mãe, que se escondeu no infinito,
no longe d'orizonte preto
que não tinha Xuru, nem João e nem Luiz
ou Bustamante,
um disparate.
as pessoas têm morrido demais, de forma que só as vejo em mim,
em meus pensamentos que perambulam nas calçadas,
entre os passos apressados das grandes ruas,
pelo aperto das gentes nos veículos coletivos,
nos corredores de acesso aos estádios de futebol,
nos carros engarrafados nos arredores da orla azul de mar.
as pessoas têm morrido nas conversas de bar,
onde outrora é hoje,
e falecem nos dias de sol, com música de rua
em alto-falantes e batidões
as pessoas têm fenecido no funk, no rock,
sem axé nem bênção, sem cânfora nem bálsamo
as pessoas morrem nos feriados, nas férias
e numa terça-feira qualquer, aos olhos duma morena
e justamente por morrerem muito, são fagulhas de vida,
permanentes, e faíscam pelo eterno breve.
Paulo-Roberto Andel, 09/11/2007
Wednesday, November 07, 2007
Baticum
cada
passo curto
que eu peço
ao rosa firme
da tua boca
parece um eco
de caverna
e bate fundo
no meu coração
baticum de cuíca
samba lento
que sorvo
feito bebida
é um cale-se de amor
Paulo-Roberto Andel, 07/11/2007
passo curto
que eu peço
ao rosa firme
da tua boca
parece um eco
de caverna
e bate fundo
no meu coração
baticum de cuíca
samba lento
que sorvo
feito bebida
é um cale-se de amor
Paulo-Roberto Andel, 07/11/2007
Penta em pencas
O que não falta no futebol brasileiro são equívocos das mais variadas naturezas, e a recente discussão sobre o propalado pentacampeonato dos flamengos contra os são-paulinos vem bem a calhar como reforço de tese.
Primeiro ponto, a bobagem de se discutir a origem do que se chama de “campeonato brasileiro” – o que, para alguns, data de 1971. Levando-se em conta, por exemplo, que a Taça Libertadores começou em 1960, tendo como participantes os representantes nacionais dos países sul-americanos, é claro que havia um meio de representação para tal acontecimento. E assim foi: em 1960, o E.C. Bahia, campeão brasileiro de 1959, disputou a Libertadores, na condição de campeão da Taça Brasil. Dali em diante, o campeão da Copa Brasil foi sempre o representante oficial. A Taça era disputada pelos campeões estaduais de todo o país, com a diferença de que os times do Rio de Janeiro e de São Paulo entravam automaticamente na fase final do certame, em modelo muito parecido das primeiras disputas da Copa do Brasil, torneio criado em 1989.
A Taça Brasil teve dez edições, com a seguinte distribuição de títulos: Santos, 5 (1961 a 1965); Palmeiras, 2 (1962 e 1967); Bahia, 1 (1959); Botafogo, 1 (1968); Cruzeiro, 1 (1966).
No mesmo ano de 1967, o então Torneio Rio-São Paulo recebeu uma ampliação, com o convite de times das regiões Sul e Nordeste, como Grêmio, Inter, Atlético Paranaense e Santa Cruz, passando-se a se chamar Torneio Roberto Gomes Pedrosa, o popular “Robertão”. A Taça Brasil permaneceu como torneio paralelo até o fim de 1968 – a partir de então, o Robertão tornou-se a única competição nacional do Brasil Em 1969, o torneio passou a ser denominado Taça de Prata. Em suas quatro edições, os campeões foram: Palmeiras (1967/1969); Santos (1968) e Fluminense (1970). Até aqui, já tínhamos 11 anos de competições nacionais, inclusive com anos em que um time havia ganho duas competições nacionais (Palmeiras em 1967) e que havia dois campeões no mesmo ano (Santos e Botafogo, 1968).
Então, em 1971, criou-se o chamado “Campeonato Brasileiro”, que já existia de fato há mais de uma década. E deveria ser chamado de torneio ou copa, pois o campeonato pressupõe jogos de ida e volta entre todos os participantes, com acesso e descenso, e isso jamais ocorreu de forma correta entre 1971 e 2003 – mesmo depois, como veremos a seguir. A dita nomenclatura de “Campeonato” Brasileiro nem era unânime à época; álbuns antigos de figurinhas daqueles podem mostrar os nomes de “Taça Brasil” ou “Copa Brasil” em seus títulos. Posteriormente, “Taça de Ouro”.
A cada ano, houve uma fórmula de disputa do torneio. A cada temporada, o inchaço provocado pelos interesses políticos da ditadura militar, num princípio de se “integrar” o Brasil. Depois de anos incríveis, como 1979 (com 96 clubes e os times paulistas entrando automaticamente na fase final de disputa) e 1982 (onde o Corinthians, advindo da “Taça de Prata, espécie de segunda divisão, chegou às semifinais do torneio no mesmo ano), a campanha pela ética e a moralidade no futebol brasileiro foi deflagrada em 1987, logo após o torneio de 1986, vencido pelo São Paulo, em março do ano seguinte – o atropelo deveu-se a confusões administrativas e a continuação da fase final deu-se após o carnaval. Os times de maior apelo popular reuniram-se e resolveram bancar um campeonato por conta própria, a chamada (corretamente) de Copa União. Importante dizer que tudo isso começou porque a CBF resolveu reduzir o número de clubes de oitenta para vinte e oito e, com isso, Botafogo (co-campeão em 1968) e Coritiba (campeão em 1985) ficariam de fora da competição. Ambos os clubes interpelaram a CBF judicialmente e, com isso, surgiu o Clube dos 13 (Atlético Mineiro, Bahia, Botafogo, Corinthians, Cruzeiro, Flamengo, Fluminense, Grêmio, Internacional, Palmeiras, Santos, São Paulo e Vasco). O América, terceiro colocado da competição de 1986, foi alijado da competição por decreto, recusou-se a jogar qualquer torneio que não fosse o de elite (com absoluta razão, já que a chamada Copa NÃO foi elaborada com base em critérios técnicos) e, daí, iniciou longa jornada de dificuldades até hoje. O mesmo aconteceu com o Guarani, campeão em 1978 e vice-campeão do torneio de 1986 – porém, os de Campinas concordaram em disputar o que se convencionou chamar de Módulo Amarelo.
Dado o impasse, pois certamente o formato da Copa União contrariava os interesses dos clubes que, em tese, conquistaram suas vagas nos critérios supostamente técnicos (classificação no ano anterior), a CBF interveio com a decisão de cruzar o chamado Módulo Verde (Clube dos 13 mais Coritiba, Goiás e Santa Cruz) com o Módulo Amarelo, composto pelos demais times alijados da disputa pela chamada elite. Esta intervenção deu-se meses antes da fase final da Copa União – que, embora com um discurso renovador, permitiu situações curiosas como a de um time que não tivesse ganho nenhum dos turnos de classificação chegasse às semifinais, que foi exatamente o caso do Flamengo (o Atlético Mineiro foi o primeiro colocado nos dois turnos de classificação, e o time da Gávea entrou como o melhor segundo). Recorde-se que, dez anos depois, uma final de Taça Guanabara previu uma partida final entre o primeiro e o segundo colocados e muitos gargalharam, atribuindo um ar grotesco ao método de disputa. Certamente, se eram rubro-negros, deviam ser para lá de esquecidos.
Particularmente, não tenho dúvidas de que, naquele ano e com aquela fórmula de disputa, o Flamengo seria o grande favorito ao título nacional e a uma das vagas da Libertadores em 1988 – ainda que de forma estranha, alijou o Atlético da conquista da Copa União e bateu um limitado Inter na final do Módulo (este sim, o time gaúcho, tinha todo interesse em “melar” o cruzamento de módulos, pois temia o confronto contra Sport e Guarani, devido ao péssimo momento em que se encontrava tecnicamente). Sport e Guarani nem chegaram a decidir quem seria o campeão do Módulo Amarelo, tamanha era a importância maior de se ir para o quadrangular final – embora isso não diminua a aberração da decisão em aberto após um incontável empate nos pênaltis.
O que atrapalhou os da Gávea foi o gigantismo e a prepotência. O mesmo que se revela de forma agressiva na mídia ainda hoje, que vende a idéia de um time somente no Brasil, o que sabemos há muito ser uma balela. O mesmo que faz uma auto-exaltação diária, como se futebol pudesse ser jogado sem adversários e sem outras torcidas, outras diferenças. Recusaram-se a disputar o quadrangular final e deixaram que a competição começasse, não comparecendo aos jogos e perdendo por W.O. Tinham a certeza de que seriam nomeados por decreto para a disputa da Taça Libertadores. Mas não foi o que aconteceu. E perderam a vaga para a competição sul-americana mais fácil de sua história.
De lá para cá, passaram vinte anos, desordens e muita confusão no futebol brasileiro. O Flamengo viria ainda a conquistar duas Copas do Brasil, em 1990 e 2006, competições nos mesmos moldes que seus antecessores nos anos sessenta o fizeram – e que a chamada massa rubro-negra insiste ingenuamente em não reconhecer, como se o Santos de Pelé, bicampeão mundial em 1962-1963, por exemplo, tivesse chegado à Libertadores por acaso ou convite – e não há um brasileiro vivo ou morto que conheça futebol e não saiba do Santos de Pelé. E ganhou um torneio brasileiro também, em 1992 – cujo sucessor inauguraria uma nova era de ascensões, promovendo doze times à chamada divisão principal.
Anos depois, por motivos até parecidos, em 2000, foi instituída a Copa João Havelange, vencida pelo Vasco, na final contra o São Caetano. Os times vieram de módulos diferentes e, teoricamente, o Vasco poderia sentir-se prejudicado por chegar à final contra um time que enfrentou adversários de nível técnico menos apurados. Mas nem mesmo Eurico Miranda cogitou de não realizar os jogos de cruzamento, ainda que a partida final em São Januário tenha sido suspensa. E o que dizer do Cruzeiro, que terminou o Módulo Azul daquele ano com 45 pontos, seis à frente do Vasco? Imaginem se os oito times que classificaram-se na divisão de elite recusassem-se a disputar a fase final com os demais das outras chaves? Teríamos perdido a oportunidade histórica de ver um time como o do São Caetano, que eliminou em casa Fluminense, Palmeiras e Grêmio, até chegar à grande final.
Patético ainda imaginar que o Flamengo possa “apresentar” protestos por um título que não requereu durante quinze anos. E sabedor que a Conmebol e a FIFA não lhe dariam amparo em tal reivindicação.
O São Paulo, se olharmos bem a história, nem é o primeiro pentacampeão brasileiro. Basta olhar o passado. Mas pode comemorar que ganhou cinco títulos no campo, no que merece absolutos parabéns.
Para finalizar, lamento que Zico, jogador de grande categoria, mas içado ao pantheon de maior de todos os tempos por opiniões duvidosas, tenha expressado o sentimento de que a comemoração são-paulina pelos cinco títulos possa ter sido uma “palhaçada”. Vi Zico jogar, e testemunhei muitas vezes sua categoria em campo, embora tenha presenciado falhas também. O sentimento de comemoração de uma torcida por um título é sempre nobre. E, queira ele ou não, o São Paulo venceu os cinco títulos no campo, sem tapetões ou tentativas frustradas de demonstração de força. E que o Flamengo comemore os quatro títulos, mais as duas Copas do Brasil, porque a competição de 1987, mesmo que para alguns de forma imerecida, foi do Sport - e ele foi reconhecidamente o representante nacional do Brasil em competições, junto com o Guarani.
Zico ressaltou que “quem ganha títulos é o time em campo, e não os dirigentes”. Teria toda razão, não tivesse omitido sua opinião num lamentável episódio da Taça Libertadores da América em 1981, quando o árbitro José Roberto Wright encerrou o jogo decisivo contra o Atlético-MG, após ter expulsado mais da metade do time alvinegro com meia hora de partida. Queira ou não Zico, a trajetória de gala de seu time tem remendos rasteiros, da mesma maneira que todos os chamados grandes times brasileiros. E trata-se apenas de um exemplo.
Paulo-Roberto Andel, 07/11/2007
Primeiro ponto, a bobagem de se discutir a origem do que se chama de “campeonato brasileiro” – o que, para alguns, data de 1971. Levando-se em conta, por exemplo, que a Taça Libertadores começou em 1960, tendo como participantes os representantes nacionais dos países sul-americanos, é claro que havia um meio de representação para tal acontecimento. E assim foi: em 1960, o E.C. Bahia, campeão brasileiro de 1959, disputou a Libertadores, na condição de campeão da Taça Brasil. Dali em diante, o campeão da Copa Brasil foi sempre o representante oficial. A Taça era disputada pelos campeões estaduais de todo o país, com a diferença de que os times do Rio de Janeiro e de São Paulo entravam automaticamente na fase final do certame, em modelo muito parecido das primeiras disputas da Copa do Brasil, torneio criado em 1989.
A Taça Brasil teve dez edições, com a seguinte distribuição de títulos: Santos, 5 (1961 a 1965); Palmeiras, 2 (1962 e 1967); Bahia, 1 (1959); Botafogo, 1 (1968); Cruzeiro, 1 (1966).
No mesmo ano de 1967, o então Torneio Rio-São Paulo recebeu uma ampliação, com o convite de times das regiões Sul e Nordeste, como Grêmio, Inter, Atlético Paranaense e Santa Cruz, passando-se a se chamar Torneio Roberto Gomes Pedrosa, o popular “Robertão”. A Taça Brasil permaneceu como torneio paralelo até o fim de 1968 – a partir de então, o Robertão tornou-se a única competição nacional do Brasil Em 1969, o torneio passou a ser denominado Taça de Prata. Em suas quatro edições, os campeões foram: Palmeiras (1967/1969); Santos (1968) e Fluminense (1970). Até aqui, já tínhamos 11 anos de competições nacionais, inclusive com anos em que um time havia ganho duas competições nacionais (Palmeiras em 1967) e que havia dois campeões no mesmo ano (Santos e Botafogo, 1968).
Então, em 1971, criou-se o chamado “Campeonato Brasileiro”, que já existia de fato há mais de uma década. E deveria ser chamado de torneio ou copa, pois o campeonato pressupõe jogos de ida e volta entre todos os participantes, com acesso e descenso, e isso jamais ocorreu de forma correta entre 1971 e 2003 – mesmo depois, como veremos a seguir. A dita nomenclatura de “Campeonato” Brasileiro nem era unânime à época; álbuns antigos de figurinhas daqueles podem mostrar os nomes de “Taça Brasil” ou “Copa Brasil” em seus títulos. Posteriormente, “Taça de Ouro”.
A cada ano, houve uma fórmula de disputa do torneio. A cada temporada, o inchaço provocado pelos interesses políticos da ditadura militar, num princípio de se “integrar” o Brasil. Depois de anos incríveis, como 1979 (com 96 clubes e os times paulistas entrando automaticamente na fase final de disputa) e 1982 (onde o Corinthians, advindo da “Taça de Prata, espécie de segunda divisão, chegou às semifinais do torneio no mesmo ano), a campanha pela ética e a moralidade no futebol brasileiro foi deflagrada em 1987, logo após o torneio de 1986, vencido pelo São Paulo, em março do ano seguinte – o atropelo deveu-se a confusões administrativas e a continuação da fase final deu-se após o carnaval. Os times de maior apelo popular reuniram-se e resolveram bancar um campeonato por conta própria, a chamada (corretamente) de Copa União. Importante dizer que tudo isso começou porque a CBF resolveu reduzir o número de clubes de oitenta para vinte e oito e, com isso, Botafogo (co-campeão em 1968) e Coritiba (campeão em 1985) ficariam de fora da competição. Ambos os clubes interpelaram a CBF judicialmente e, com isso, surgiu o Clube dos 13 (Atlético Mineiro, Bahia, Botafogo, Corinthians, Cruzeiro, Flamengo, Fluminense, Grêmio, Internacional, Palmeiras, Santos, São Paulo e Vasco). O América, terceiro colocado da competição de 1986, foi alijado da competição por decreto, recusou-se a jogar qualquer torneio que não fosse o de elite (com absoluta razão, já que a chamada Copa NÃO foi elaborada com base em critérios técnicos) e, daí, iniciou longa jornada de dificuldades até hoje. O mesmo aconteceu com o Guarani, campeão em 1978 e vice-campeão do torneio de 1986 – porém, os de Campinas concordaram em disputar o que se convencionou chamar de Módulo Amarelo.
Dado o impasse, pois certamente o formato da Copa União contrariava os interesses dos clubes que, em tese, conquistaram suas vagas nos critérios supostamente técnicos (classificação no ano anterior), a CBF interveio com a decisão de cruzar o chamado Módulo Verde (Clube dos 13 mais Coritiba, Goiás e Santa Cruz) com o Módulo Amarelo, composto pelos demais times alijados da disputa pela chamada elite. Esta intervenção deu-se meses antes da fase final da Copa União – que, embora com um discurso renovador, permitiu situações curiosas como a de um time que não tivesse ganho nenhum dos turnos de classificação chegasse às semifinais, que foi exatamente o caso do Flamengo (o Atlético Mineiro foi o primeiro colocado nos dois turnos de classificação, e o time da Gávea entrou como o melhor segundo). Recorde-se que, dez anos depois, uma final de Taça Guanabara previu uma partida final entre o primeiro e o segundo colocados e muitos gargalharam, atribuindo um ar grotesco ao método de disputa. Certamente, se eram rubro-negros, deviam ser para lá de esquecidos.
Particularmente, não tenho dúvidas de que, naquele ano e com aquela fórmula de disputa, o Flamengo seria o grande favorito ao título nacional e a uma das vagas da Libertadores em 1988 – ainda que de forma estranha, alijou o Atlético da conquista da Copa União e bateu um limitado Inter na final do Módulo (este sim, o time gaúcho, tinha todo interesse em “melar” o cruzamento de módulos, pois temia o confronto contra Sport e Guarani, devido ao péssimo momento em que se encontrava tecnicamente). Sport e Guarani nem chegaram a decidir quem seria o campeão do Módulo Amarelo, tamanha era a importância maior de se ir para o quadrangular final – embora isso não diminua a aberração da decisão em aberto após um incontável empate nos pênaltis.
O que atrapalhou os da Gávea foi o gigantismo e a prepotência. O mesmo que se revela de forma agressiva na mídia ainda hoje, que vende a idéia de um time somente no Brasil, o que sabemos há muito ser uma balela. O mesmo que faz uma auto-exaltação diária, como se futebol pudesse ser jogado sem adversários e sem outras torcidas, outras diferenças. Recusaram-se a disputar o quadrangular final e deixaram que a competição começasse, não comparecendo aos jogos e perdendo por W.O. Tinham a certeza de que seriam nomeados por decreto para a disputa da Taça Libertadores. Mas não foi o que aconteceu. E perderam a vaga para a competição sul-americana mais fácil de sua história.
De lá para cá, passaram vinte anos, desordens e muita confusão no futebol brasileiro. O Flamengo viria ainda a conquistar duas Copas do Brasil, em 1990 e 2006, competições nos mesmos moldes que seus antecessores nos anos sessenta o fizeram – e que a chamada massa rubro-negra insiste ingenuamente em não reconhecer, como se o Santos de Pelé, bicampeão mundial em 1962-1963, por exemplo, tivesse chegado à Libertadores por acaso ou convite – e não há um brasileiro vivo ou morto que conheça futebol e não saiba do Santos de Pelé. E ganhou um torneio brasileiro também, em 1992 – cujo sucessor inauguraria uma nova era de ascensões, promovendo doze times à chamada divisão principal.
Anos depois, por motivos até parecidos, em 2000, foi instituída a Copa João Havelange, vencida pelo Vasco, na final contra o São Caetano. Os times vieram de módulos diferentes e, teoricamente, o Vasco poderia sentir-se prejudicado por chegar à final contra um time que enfrentou adversários de nível técnico menos apurados. Mas nem mesmo Eurico Miranda cogitou de não realizar os jogos de cruzamento, ainda que a partida final em São Januário tenha sido suspensa. E o que dizer do Cruzeiro, que terminou o Módulo Azul daquele ano com 45 pontos, seis à frente do Vasco? Imaginem se os oito times que classificaram-se na divisão de elite recusassem-se a disputar a fase final com os demais das outras chaves? Teríamos perdido a oportunidade histórica de ver um time como o do São Caetano, que eliminou em casa Fluminense, Palmeiras e Grêmio, até chegar à grande final.
Patético ainda imaginar que o Flamengo possa “apresentar” protestos por um título que não requereu durante quinze anos. E sabedor que a Conmebol e a FIFA não lhe dariam amparo em tal reivindicação.
O São Paulo, se olharmos bem a história, nem é o primeiro pentacampeão brasileiro. Basta olhar o passado. Mas pode comemorar que ganhou cinco títulos no campo, no que merece absolutos parabéns.
Para finalizar, lamento que Zico, jogador de grande categoria, mas içado ao pantheon de maior de todos os tempos por opiniões duvidosas, tenha expressado o sentimento de que a comemoração são-paulina pelos cinco títulos possa ter sido uma “palhaçada”. Vi Zico jogar, e testemunhei muitas vezes sua categoria em campo, embora tenha presenciado falhas também. O sentimento de comemoração de uma torcida por um título é sempre nobre. E, queira ele ou não, o São Paulo venceu os cinco títulos no campo, sem tapetões ou tentativas frustradas de demonstração de força. E que o Flamengo comemore os quatro títulos, mais as duas Copas do Brasil, porque a competição de 1987, mesmo que para alguns de forma imerecida, foi do Sport - e ele foi reconhecidamente o representante nacional do Brasil em competições, junto com o Guarani.
Zico ressaltou que “quem ganha títulos é o time em campo, e não os dirigentes”. Teria toda razão, não tivesse omitido sua opinião num lamentável episódio da Taça Libertadores da América em 1981, quando o árbitro José Roberto Wright encerrou o jogo decisivo contra o Atlético-MG, após ter expulsado mais da metade do time alvinegro com meia hora de partida. Queira ou não Zico, a trajetória de gala de seu time tem remendos rasteiros, da mesma maneira que todos os chamados grandes times brasileiros. E trata-se apenas de um exemplo.
Paulo-Roberto Andel, 07/11/2007
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