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Monday, October 31, 2011

COTIDIANO

frente ao velho
inimigo
que hoje transpira
desimportância,
meu silêncio é
mero pesar:
injustiça,
quantas vezes olhei
nos teus olhos
e te desprezei!
se a tua vitória
de hoje
parece tão clara,
há um cinza
que te vestirá.
hoje me calo,
sou cabisbaixo,
mas a história
não se encerra
nestes versos:
um oceano
te aguarda!

Para Carlos Drummond de Andrade e Rafael Marques

Sunday, October 30, 2011

TORQUATO NETO

cogito


eu sou como eu sou
pronome
pessoal intransferível
do homem que iniciei
na medida do impossível

eu sou como eu sou
agora
sem grandes segredos dantes
sem novos secretos dentes
nesta hora

eu sou como eu sou
presente
desferrolhado indecente
feito um pedaço de mim

eu sou como eu sou
vidente
e vivo tranqüilamente
todas as horas do fim.

Friday, October 28, 2011

MEDIOCRIDADES



1

Eu não sei dizer quantas vezes chore e pedi ajuda, mas em muitas delas o que recebi foi o fel do descaso. Noites de chuva em dor, dias de sol em féretro e nada, nada pareceu comover vários de meus interlocutores. Recentemente, entendi alguma coisa a respeito; alguém me disse que, para não assumir assuntos problemáticos referentes ao trato familiar, fingiu que não ouvir. Enquanto fui responsável por sustentar uma família, o que durou muitos anos, não houve dia, tarde ou noite que não tivesse uma preocupação constante – o que talvez explique alguns de meus problemas de saúde. Carreguei silenciosamente tudo o que pude. Quando isso era impossível, tudo me remetia ao velho ditado de falar com as paredes: do outro lado da linha, alguém está ocupado. Noutra, manda dizer que não está ou desliga o aparelho. Noutra, apenas um não e boa-sorte. Como explicar a perda de tempo que foi expor minhas angústias e problemas para terceiros que, se pudessem, davam o fora ali mesmo porque o capítulo da novela estava imperdível? Ou o bar que vai “bombar na night”?  Ou ainda por motivo algum, apenas pela velha e surrada filosofia: “não quero me meter nisso”. Enfim, falo porque também em muitas vezes eu estendi a mão para quem não merecia; sacrifiquei tempo e dinheiro, trabalho e pensamento pelo que talvez não seja absolutamente nada que mereça relevância. O fato é que hoje é uma tarde de sol, da qual sempre desconfio desde que as principais pessoas da minha vida faleceram: todas foram enterradas em dias solares. Lá fora, alguém dizendo “uhu” ou “viva o verão carioca” enquanto eu peregrinava pelos corredores da morte no cemitério, abraçando minhas próprias lágrimas. Foram muitos, muitos anos em busca de pequenos auxílios dentro de uma sociedade que só respeita as posses, que desdenha da humildade e que não mede esforços em conservar injustiças históricas – muitas, ligadas à concentração de dinheiro; muitas outras, não.  Pensar em justiça, em proximidade, em igualdade de oportunidades e educação é burrice? Longe disso. Mas é o que vejo em cada canto: falar de coisas assim imediatamente desperta em uma ou outra pessoa uma partidarização do discurso, como se características essenciais à vida humana não devessem estar na pauta de qualquer partido político – embora alguns não tenham mesmo, por incrível que pareça. O sol lá fora é firme, mas meu coração está entorpecido por todo mal que enxerga facilmente. Estou de luto por quem se fez de parede para meus apelos. Todos estão muito ocupados. Todos estão surdos, cegos, mudos e absolutamente insensíveis ao que se passa fora do shopping center, do espaço de cinema ou da pâtisserie. Como posso ter sido tão estúpido em ter perdido tempo de falar com quem não tinha o menor compromisso de ouvir? É simples: eu não sabia que o tempo escorria em vez de passar. Então, dentro destas frias paredes brancas, menos frias do que qualquer ser humano com quem eu tenha conversando, é que guardo o meu pequeno silêncio, a frustração de não ter feito com que algo no mundo fosse melhor do que antes de meu nascimento, a certeza da dor e do nunca mais que meus queridos me ofereceram involuntariamente. O silêncio que há de perdurar enquanto as ruas contiverem tanta vilania, hipocrisia e indiferença. Não se constrói o mais especial dos gestuais humanos apenas pelo poder ou pelo dinheiro; hoje, ambos parecem sinônimos, mas nem sempre se encontram num cruzamento de retas. Lá fora é o sol que prevalece; aqui, as frias paredes alvas nada oferecem além do mesmo distanciamento de quem, um dia, teve minha amizade como sincera oferenda. Amanhã será outra hora; todos permanecerão muito ocupados, a maioria com futilidades. Se algum escorregar e cair nas tentações, não será preciso pedir desculpas, retratar-se ou mesmo fazer o bem: basta o leasing de uma religião e algum deus perdoa os excessos. Agora entendo as palavras de Neil Young: “It's better to burn out than to fade away”, algo como “É melhor queimar do que desaparecer aos poucos". Assim seja.


2




3

O silêncio da imprensa em relação a William Waack é digno de nojo contundente.


4



5

A poesia está guardada nas palavras — é tudo que eu sei.
Meu fado é de não saber quase tudo.
Sobre o nada eu tenho profundidades.
Não tenho conexões com a realidade.
Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.
Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas).
Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei emocionado e chorei.
Sou fraco para elogios.


Manoel de Barros

Wednesday, October 26, 2011

AL OTRO LADO DEL RIO







Vista do Parque da Cidade de Niterói, 1998.

Créditos da foto: Ricardo Valença Ferreira - O Bolinha.

COM FÉ? (QUEM É QUE ESTÁ VENDO ISSO?)


enquanto os vencedores
acreditam piamente
em sua condição de vencedores,
leem seus jornais de ficção,
planejam o próximo feriado
e vibram com o time daquele mesmo
povo que
desprezam.
do outro lado da arquibancada,
vejo as ruas:
nelas, o que não falta é dor, drama,
desespero, fome
e a luz que não existe
ao fim do túnel escuro.
é possível vencer
e fingir que o vizinho da esquina
ou o mendigo da calçada
ou o retirante faminto
padecem?
há os que insistem
em explicar a decadência humana
por fórmulas, textos e teorias - 
até mesmo pelos desígnios de deus;
não acredito porque sou
um simplista:
multidões de bonzinhos
passam ao largo do inferno cotidiano
enquanto poucos abnegados
de verdade
compartilham mesmo o bem.
e aqueles, tal como os ingênuos vencedores,
realmente creem
que deus ajuda
mesmo que se omitam do essencial:
afinal de contas, quem é que está
vendo
isso?


paulorobertoandel26102011

Friday, October 21, 2011

JOÃO VALENTÃO





1



Foi um sábado razoável, tendo em vista os problemas. Primeiro, a bomba atômica da Praça Tiradentes que me tirou o sono. Depois, meu grande amigo Rafael Marques que me aparece numa UTI sem a menor expectativa prévia disso. Afora os resto, claro. Tarde chuvosa, parti para o Méier para uma reunião de trabalho. Uma vez finalizada, fui com dois amigos beber um pacífico chope no que chamam de Baixo Méier. Gosto dessa denominação, mesmo quando ela não tem sentido.

Falar da vida, dos amores, de gols. Eu devia ter ido namorar, mas estou sendo boicotado. Assim, nada melhor do que prosa de mesa.

Horas a passar, hora de fechar a conta, pedimos um táxi via telefone de cooperativa. Vinte minutos, meia hora, uma hora e nada. É a terra do descaso, planeta indiferença: ordracir o outro. Então paramos na esquina da Constança Barbosa para aguardar.

Dois casais com visual pagodeiro (sem nenhuma conotação preconceituosa, ressalte-se) vinham buscar seu carro. Quando o mesmo ia sair, veio o impagável flanelinha. Segundos depois, o motorista sai do carro, dá dois chutes no quase-pedinte e saca duas pistolas prateadas.
Um segundo e pensei no pior. Se atira, é claro que seríamos os alvos, até como testemunhas.

Outro segundo e o valentão baixa as armas. Ao mesmo tempo, um táxi para ao lado com um passageiro para desembarque. O flanelinha foge. O taxista sai do carro e diz algo como “Irmão, ta quebrando a firma, o passageiro ta com medo de descer”. O valentão se torna um doce, se identifica como PM e para o carro perto do táxi. A seguir, explica “Pô, perguntei ao cara onde ele estava quando eu estacionei o carro para vir me cobrar. Ele vem me dizer que tinha ido dar uma barrigada”. Os dois riem, os carros saem, a vida segue. Eu e meus amigos visando tudo com a verve de quem quase testemunhou uma morte de perto – ou a própria, se a situação se agravasse.

O flanelinha não estava ali por opção profissional e, muito provavelmente, carece de escolaridade e princípios de fidalguia. De toda forma, isso jamais explicaria um sujeito sacar duas pistolas para o que quer que fosse. Seria auto-afirmação diante das mulheres no carro? Seria o jeito machão?

Policia para quem precisa de polícia.


2

Duas horas depois, meu amigo manda a funcionária da cooperativa praticar o auto-sexo. Foi justo. Conseguimos outro carro. Na segunda parada, fico sozinho dentro do táxi, o taxista zera o cronômetro. Estava errado, mas o que eu ia discutir no Cachambi depois das quatro da manhã?

Escrotidão à vista por causa de quatro reais.
O que leva as pessoas a agirem assim?


3

Novos discos que valem a pena ser ouvidos. Uns, nem novos.

“Demolished Thoughts”, Thurston Moore; “Showroom of Compassion”, Cake; “Lulu”, Lou Reed & Metallica; “Fly from here”, Yes; “Ao vivo em Montreux”, Pepeu Gomes. E tudo o que saiu remasterizado do Pink Floyd, para quem tem bala na agulha.


4

Será que se justifica tanto folguedo, alegorias e danças pelo assassinato de Kadhafi ontem?

Nenhuma simpatia pelo falecido, ainda que entenda não ser a pena de morte o caminho justo.

A Líbia é um caos. Grupos étnico-religiosos já se enfrentam, uns matando outros. O Ocidente esconde porque isso contraria o velho paradigma de triunfo norte-americano. Pergunta-se: que triunfo?

Sete trilhões de dívida pública enquanto suga-se o petróleo de Bagdad.

Jabô deve gostar disso. Mainardiota também.


5

Torcedores do Fluminense estão definitivamente cansados de ver seu time sendo vilipendiado via imprensa falada-escrita-televisada. Comento sobre isso no http://www.fluminenseetc.com.br/ para todos os torcedores, exceto os da HVA.


6

“Quem vai querer comprar banana?/ Quem vai querer comprar banana?”, Melodia.



Friday, October 14, 2011

A GUERRA


1

Era um restaurante novo no meio do caminho e eu tinha pressa, por causa da vida corrida do trabalho. Corremos para trabalhar, para pagar as contas, para resolver problemas e o tempo escorre da mesma forma, sem poupar quem o desperdiça, principalmente no coração das grandes cidades. Lazer quase não há, tudo é falado com olho no relógio. Mas eu sonhava com um bife. Depois do almoço, meu objetivo era o de ver a loja de cds ao lado; às vezes, tinha alguma oportunidade interessante.

Fiz o pedido e, sem muita demora, veio o filé à Oswaldo Aranha, prato que considero impecável. A porção era generosa, para dois até, mas como era um glutão não deixei pedra sobre pedra. Gostei. Nas outras mesas, alguns engravatados que talvez me vissem como estorvo do ambiente. O ar-refrigerado moderado, sem esfriar a comida e sem deixar os clientes molhados de suor. Iniciativa pioneira numa região do Rio tão bela e tão degradada, agora ressurgida com ótimas oportunidades culturais, gastronômicas e a revitalização da Praça Tiradentes. Talvez a pressa, sempre ela, devesse ter me incentivado a comer no self-service também disponível ali, mas eu precisava de alguns minutos de calma. E um bife. Além do mais, o serviço foi veloz.

Enfim, uma refeição rápida e de qualidade. De toda forma, perdi alguns minutos que me custariam caro se os deixasse de lado, de modo que não fui ver os cds. Sim, eu ainda ouço cds, compro livros e freqüento exposições. É boa a sensação de ser um dinossauro contemporâneo.

2

Em casa, de longe, muito longe, ouvi gritos. Torci para que não fosse nada de grave com ninguém. Não dava para saber de onde vinha o eco. Eram oito da manhã; desci para chegar ao trabalho. Quando passei por um botequim da Cruz Vermelha, muitas pessoas olhavam atônitas à porta para a moderna televisão ligada. Alguém perguntou em voz alta quantos morreram.

Cheguei à minha sala de trabalho, acessei a Internet e soube que uma grande explosão havia ocorrido no centro do Rio, com mortos.

Em nenhum momento associei os gritos de longe ao que acontecia naquele instante.

A explosão aconteceu no restaurante Filé Carioca, o mesmo onde degustei apressadamente aquele Oswaldo Aranha. Uma única vez.

3

Pouco tempo depois, a CET-Rio liberou as imagens de sua câmera, onde se podia ver a pavorosa imagem da explosão. Um rapaz chamado Mateus dava tímidos passos sem a menor idéia de que seriam os últimos. Um rapaz com roupa de cozinheiro estava parado na porta conversando com alguém. De repente, uma verdadeira bomba atômica de horror e tudo foi pelos ares. As pessoas já não existiam mais. Ter visto esse vídeo me comoveu e preocupou a tal ponto de que não consegui mais pensar em outra coisa, talvez só por alguns momentos no jogo do Fluminense, horas depois, no Engenhão. Ainda assim, antes e depois do jogo, passei pelos canais de TV e lá estava o vídeo, sempre a apavorar e provocar reflexões.

Somos quase nada diante do mundo. Num estalar de dedos, a vida cessa. Eu deveria saber disso melhor do que ninguém quando abracei meus pais mortos em noites diferentes. Mas talvez não tivesse aprendido o suficiente. Pessoas com gestos ruins de um lado para outro, prejudicando, sacaneando, matando, torturando e tudo aí, pronto para ser explodido em qualquer restaurante no coração de qualquer grande capital. Risco igual ao que aconteceu, só pelo Rio deve ter em uns quinhentos endereços diferentes. No mínimo.

4

Acordo às seis e pouco da manhã, assustado.

Minhas últimas visadas antes de acordar me remetem a fogo, janelas caindo, destruição. Imediatamente, olhei para a tela da TV e ela estava apagada, prudente que fui – às vezes, esqueço de apertar o botão do timer e, nas madrugadas, Malafaia berra em minha direção porque não fiz ainda a minha contribuição. O Deus dele há de me perdoar; a grana anda curta.

O que não faltava aqui no trabalho eram coisas para se fazer de manhã. Pesquisar os efeitos do novo aviso prévio, atualizar o site, atender pessoas no telefone e no e-mail. Assim fiz até cerca de meio dia e meio sem parar.

Almoço no restaurante perto do trabalho, rapidamente. Precisava ir ao outro lado do Centro, receber um crédito há muito esquecido por quem deveria pagá-lo. Acontece que, por conta das obras do novo prédio da Petrobras, mais uma obra de rua na esquina da Vinte de Abril e a tragédia da Praça Tiradentes, o trânsito está completamente caótico. Então vou a pé.

Num momento, inevitável como transeunte passar pelo cenário de guerra.

A esquina está cercada. Os bombeiros, os mesmo que precisam ser valorizados à altura, realizam sua tarefa com dedicação. Uma janela do prédio afundou como se a fachada fosse realmente torta. O primeiro andar é um grande vão: tudo acabou. A loja de discos explodiu, desapareceu. Não há como qualquer pessoa de bem ver a imagem da destruição sem se alterar emocionalmente.

Numa hora de almoço qualquer, eu comi um filé à Oswaldo Aranha.

Tinha uma bomba atômica sob meus pés e nem sabia.

Pensei em quanto era importante estar vivo. Desisti de receber o crédito por ora. Dei meia-volta, retornei ao posto profissional. Não havia muito a dizer depois de ter testemunhado o rescaldo do desastre. 

Nessa hora alguma coisa me remete ao descaso. E descaso é indiferença.

Será que seremos eternamente uma sociedade condenada à indiferença do outro?


5

http://www.youtube.com/watch?v=Epgo8ixX6Wo&ob=av2e


Thursday, October 13, 2011

Tuesday, October 11, 2011

MAIS DO MESMO, MAIS DO GÊNIO

(Clique na imagem para ampliá-la)

Monday, October 10, 2011

OS CLÁSSICOS SÃO ETERNOS




1996-2011

Quinze anos sem Renato Russo.

Sem?

Na verdade, ele nunca esteve ausente.

Ecoa nas grandes canções, na poderosa voz, na poesia inesquecível.

No inconformismo.

No protesto.

Nos questionamentos.

Quisesse ou não, foi condenado à total imortalidade!


Paulo-Roberto Andel

Friday, October 07, 2011

BACK ON EARTH TOUR


Nº 1 – 07/10/2011

Enquanto a morte não amanhece – e que longe esteja! -, a repetição das coisas serve de vestibular para o esmero, tanto para o bem quanto para o mal. E voltar é verbo que não necessariamente precisa de motivo: simplesmente acontece.

I

Duas garotas na mesa ao lado, enquanto almoço no simpático restaurante da esquina da rua do Senado. Sempre bem freqüentado. A dieta me impõe um prato de leveza e sem frituras, que consumo com relativa velocidade junto a um copo de Guaravita. Elas conversam e ouço, de tão perto que estou. Uma parece tensa, a outra não. A calma é loura, de pouca altura, perfil bonito e óculos instigantes; sua amiga é morena, gordinha, tem um ar de alegria que não parece harmonizado com as linhas de tensão à testa. Comentam sobre os exames, a volta ao hospital, até que a morena diz “Nunca mais faço quimioterapia, é muito massacrante. Bom, de toda forma você tem boa resistência”. Olho para o prato e resta um pedaço de filé de peixe, que saboreio com prazer, mas o fato é que fiquei ali completamente solidário à causa das duas garotas. Parecem tão jovens e fortes. Recordo as mazelas da vida, as injustiças, amigos que perdi. Penso em dizer algumas palavras, mas pareceria invasivo. Termino a refeição e sigo para o caixa; pago a conta e volto ao trabalho. Talvez tenha sido a conversa mais emocionante que meu ouvido esquerdo tenha pinçado como intruso em uma mesa alheia. Tomara que tudo dê certo.

II

Segunda-feira completaremos quinze anos sem Renato Russo. Em dois meses e meio, dez anos sem Cássia Eller. Não é o caso de dizer que o rock errou, mas ele claramente empobreceu, assim como a poesia musical – contestada por parte dos “formadores de opinião” que tanto detesto. Chico Buarque não é poesia? Luiz Melodia? Tom Zé? Tom Jobim? Zeca Baleiro? Façam-me o favor: vão se catar!

III

O festival chamado RIR: Claudia Leite, I.S., Ryhanna, Kate Perry, Shakira, Maroon 5.


O festival chamado SWU: Peter Gabriel, Alice in Chains, Stone Temple Pilots, Sonic Youth, Lynyrd Skynyrd.

Rock no devido lugar.


IV


Velho amigo me procura numa rede social, apoiado por linda amiga. Sugere que eu seja o articulador de um encontro de ex-companheiros dos tempos de faculdade. A idéia é maravilhosa.

Mas declinei, ao menos parcialmente.


Não acredito mais nos grandes grupos, ainda mais depois que as pessoas ficam vinte anos sem se encontrar.

Todos mudam um pouco, muitos mudam muito. E a maioria, para pior.


Aparece o ex-miserável que rezava aos céus por estudar de graça, hoje bem-sucedido e agora dizendo que tem mais é que privatizar tudo. O ex-quase-analfabeto que agora se vangloria de falar francês, mesmo desconhecendo completamente Rimbaud, Victor Hugo, Genet ou Godard. A baranguinha que se achava gostosa porque todo mundo pegava e que, aos quarenta anos, se sente com dezenove – todo mundo tem direito a ter celulites e varizes, mas ninguém é obrigado a ver pelancas expostas. E o cara chato metido a malandrão que, duas décadas depois, não mudou nada?


Viver é fundamental, mas tem um ônus: o perceber da escrotidão humana.

Pequena turba, uns seis ou oito, ainda vai.


Tentarei convencê-los.


V


Coisa de uns quarenta dias, estive em SP a trabalho. No sábado, flanei pela Paulicéia. Certa hora, vi que estava muito perto do que chamam de a “Cracolândia” (velha mazela de lá que agora ganha incrível velocidade no RJ).

Eu sou do contra. Fui dar uma espiada, sob relativa distância regulamentar.


É um cenário de guerra. Horror.


Não acredito em inferno, mas, se acreditasse, ali estava exposto.


Farrapos humanos à beira da morte subsidiados pela indiferença e pelo egoísmo, zumbis condenados.

Tristeza. Dor. Desilusão.


Fundamental fazer estas coisas de vez em quando para não se deixar mergulhar na abominável alienação de boa parte da turba que se acha diferenciada “do bem”. São os mesmos que sentiam nojinho quando a turma da Baixada “invadia” o Barra Shopping para também desfrutar das maravilhas capitalistas. Argh. Criticam sem propor. Realmente se acham melhores do que os outros, sem qualquer sentido lógico.

VI

Então voltei/ por que não busquei sentido/ reviver e reprisar cousas da vida/ para não represar vontades/ voltei à toa/ sem plano ou meta/ sem ambição sensata/ tentar ocupar o tempo para não mofar em ócio/ e falar sozinho frente ao texto/ gravar minhas pequenas inutilidades/ recusar a mansidão/ mesmo que à frente tudo pareça relento/ vadio espaço/ hospedado na ilusão de um moinho de vento.

VII



PRA



Cartas para esta redação? Não. Marque um chope, que é mais adequado.

Thursday, October 06, 2011

DEFINITIVO

A MAÇÃ!

Não me lembro mais do dia em que Jobs não fazia parte do meu cotidiano.

Deve ter sido antes da faculdade, coisa de décadas.

Vai-se o homem, com seus inúmeros acertos e vários erros; para a posteridade, fica o gênio que ajudou o mundo em seu caminho insaciável de revoluções.

Não me furto a pensar: com tanta gente ruim e maléfica no planeta, porque os gênios morrem jovens?

O vídeo abaixo tem cerca de 14 minutos e é legendado.

Se você tiver alguma réstia de tempo em sua vida atribulada, peço-lhe que o veja em consideração a mim. E a você mesmo (a). Uma profunda reflexão de alguém que soube fazer a diferença enquanto esteve na Terra.


Tuesday, October 04, 2011

AMÁLGAMA 2011

e eu
que sei quase
nada
do que chamam

desamor?
é que
meu desapego é
falácia,
o fingimento
que me cerca
é cobiça do
raso infame
e certo mesmo
é que maré nenhuma
há de me afogar.
um dia
o infinito me traga,
mas por ora
o meu agora
tem brilho de
amálgama:
noves fora,
cátedra!

Paulo-Roberto Andel, 04/10/2011

Monday, October 03, 2011

NÃO CREIA EM TUDO, NÃO CREIA!

RAFINHA

Eu detestei a piada do Rafinha.

Mas sou fãzaço dele.

A questão que hoje assola o país (por absoluta falta do que fazer de muitos), tendo até a ex-revista "Veja" (o quê?) no ataque (o que faz pensar nos reais acontecimentos como um todo), no mínimo gera pensamentos contraditórios.

Assisto o CQC desde o primeiro programa e acompanho o trabalho do Tas desde os tempos de Ernesto Varela. É um dos melhores programas da TV aberta - esta, cada vez mais rumo ao ridículo. E tem erros, muitos erros. É ao vivo ou quase ao vivo. Sujeito a chuvas e trovoadas. Ou alguém acha que Datena é um assassino porque, em muitas vezes, ao apresentar um crime bárbaro, disse que "se fosse ele ali com uma arma na mão, fuzilava o criminoso desgraçado"? Faça-me o favor. O mesmo vale para Wagner Montes e Cidinha Campos. Na novela das dez aí pude valer tudo, não é?

O CQC, com vários erros e seus inúmeros acertos, prima por instigar o telespectador. Os erros estão na TV inteira. Depende de como cada um quer ver. Jabor ridiculariza desafetos com sua verborragia oca, NelsonMotta é um fantasma de si mesmo e nada é mais real do que as rameirices de "A Fazenda", com suas mulheres seminuas, apologias a surubas e outros mofos da comunicação. E o "Pânico", também com erros e muitos acertos, é fabuloso porque consegue há quase uma década trabalhar em cima de um só tema: o ridículo da televisão e suas celebridades.

Para subverter pensamentos e criar uma dinâmica diferente, o CQC não se cansou de ridicularizar parlamentares e políticos em geral (alguns, muito justamente mas sem levar em conta os efeitos jurídicos a respeito).

Mais surpreendente ainda é a Band punir o Rafinha quando, há pouco mais de um ano, aceitou tranquilamente que o Boris Casoy tratasse os lixeiros como "a escória da sociedade". No mínimo, dois pesos e duas medidas. Nada aconteceu.

E da "Liga", vão suspender? Porque lá o Rafinha faz um trabalho espetacular ao lado do Thaíde, mais Débora e Sophia (gatona/gatinha em qualquer ordem, adoro as duas).

Hoje, a Band voltou aos tempos de chumbo, quando nem era tão prejudicada assim.

E já que ela tomou essa decisão de suspender o Rafinha, porque atendeu ao anseio de personagens midiáticos importantes e insatisfeitos (com e sem razão, dependendo de cada caso), eu exercerei o meu exercício democrático como telespectador de suspender a exibição do CQC na minha casa. Vai ser uma lástima não ver o Tas, o Luque, a Mônica e todo o resto. Mas não suporto hipocrisia. E se o CQC chegou à audiência que hoje tem, deve muito ao Rafinha. Repetindo e reiterando, hipocrisia e escrotídão já são suficientes na TV destes "tempos modernos".

Se a Band se propõe a ser um canal "democrático", onde Boris e Bolsonaro falam o que querem, precisa mostrar coerência.

Gravarei até 22 horas e depois volto para o Rio. Um bom CD de Charles Mingus me espera.

Quando a Band deixar o AI-5 e voltar a 2011, eu também volto.

E que cada um siga o que acredita. Longe de mim querer convencer qualquer pessoa de que, nestas linhas, eu redigi uma verdade oficial. Sou contra autoritarismos, até mesmo os meus.

Saturday, October 01, 2011

OUTRO CÉU

o céu
e uma imagem infinita
que nunca sabemos
onde vai parar,
exceto quando se
revela
o grande mistério da vida -
aquele
que ninguém parece
contar.
o céu
e seus dias de sol
que também abrigam dor,
despedida
e solidão.
o céu e seu infinito;
o mistério que perdura,
transcende
e alimenta
um saudável
conflito
entre o ser vão,
o provisório
e o definitivo.

(Para Aquilles Chirol, 1932-2011)


Paulo-Roberto Andel