Em 1990, eu era um garoto estudante de faculdade, sem parentes importantes, vindo da própria capital, duro, cheio de sonhos e tentando buscar um emprego.
Tempos difíceis: a Era Collor não perdoava ninguém. O desemprego e a fome eram regra.
Mas aí apareceu a MTV Brasil na televisão e as coisas mudaram para melhor. Pra mim, melhoraram paca. Imagine: eu não tinha grana pra comprar discos, mas podia ver e ouvir N artistas.
A linguagem do videoclipe, que já existia há vários anos, ficou definitivamente popularizada no Brasil. Ela já vinha do Fantástico e de programas como o saudoso BB Video de Eládio Sandoval e Billy Bond, mas a MTV veio como um furacão varrendo tudo, trazendo acesso aos trabalhos musicais de números artísticos que não tocavam em rádio no país, sem contar a multidão de artistas nacionais que passaram a aparecer na TV justamente por conta de seus clipes. Aquele pessoal descolado interessante divertido, gatas extraordinárias apresentando as atrações sempre com uma perna mais inclinada do que a outra.
A MTV colou bem no Rio de Janeiro. Chegou praticamente junto com o Rock in Rio 2 e nos tempos das melhores edições do Hollywood Rock. Teve de tudo: Nirvana (com Kurt Cobain ensandecido), Alice in Chains, Red Hot Chilli Peppers e outros shows antológicos, como o auge de Titãs e Paralamas tocando juntos. Foi na MTV a explosão do Manguebeat com Chico Science e Nação Zumbi mais Mundo Livre S.A., e Skank, Pato Fu, Planet Hemp, Cidade Negra, Raimundos e grande elenco. E o Capital Inicial? A partir do Projeto Acústico MTV, a banda deu uma guinada tão grande em sua carreira que se tornou muito mais popular do que em sua primeira fase.
O Acústico gerou registros espetaculares de nomes como os próprios Titãs, Paralamas, Cássia Eller, Lobão, Marcelo D2 e outras feras.
Apesar da sua audiência modesta, a MTV formava a opinião definitivamente e ditava as regras. Se nem todo mundo ouvia, todo mundo sabia do que se tratava.
À medida que fez a travessia do século XX para o XXI, a MTV aos poucos foi diminuindo a sua cota musical e fazendo mais programas de auditório. De toda forma, eles eram sempre interessantes, fossem pelos debates, pela vanguarda e pela quebra de paradigmas, vide o beijo gay ao vivo no Beija Sapo, atração comandada por Daniela Cicarelli.
Em sua última grande fase a MTV ainda revelou um monte de jovens humoristas para o país, numa safra de nomes como Marcelo Adnet, Dani Calabresa, Paulinho Serra e mais um monte de gente com programas interessantíssimos no canal que ainda tinha a música, mas não como o principal carro-chefe. Depois, atolado em dívidas, o grupo Abril liquidou o canal no Brasil por questões financeiras.
Tempos depois, entrou uma nova MTV no ar, mas ela mas ela não tem nada a ver com o espírito da MTV Brasil original. Só tem o nome. Vida que segue.
O que deixa saudade mesmo é aquele tempo de grandes bandas, de VJs fabulosos - Marina, Thunderbird, Gastão, Sabrina etc -, de programas divertidíssimos e de muita informação musical que hoje se perdeu no mundo da internet, né? Onde tudo é diluído e para você achar determinados conteúdos, tem que fazer um verdadeiro trabalho de arqueologia. A MTV não, ela te dava tudo de bandeja. Vinte anos de música, sorrisos e vanguarda.
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