Há uns doze anos, conheci um cara que achava maneiro, por causa de futebol. Não sei se por causa de algum livro meu. Acho que foi. Vou chamá-lo de Ota. Depois vocês vão entender.
Enfim, o fato é que eu tenho um site sobre futebol que funciona com trabalho voluntário. Não dá um tostão, mas certamente prestígio por vários motivos. E tem uma equipe grande, divertida. Já fizemos muita coisa juntos e, cá entre nós, eu tenho uma carreira longa em crônicas e livros de futebol.
Um belo dia, chamei Ota para participar comigo de vídeos que gravávamos regularmente para o site. O resultado foi divertido, ele era engraçado, falava alto e, apesar de certa empáfia que costuma reinar quando o debate é sobre futebol, comentava coisas interessantes. Tudo bem. Logo depois, veio a pandemia e passamos à era do Streamyard.
Meu primeiro erro foi, baseado no bom texto falado, convidar Ota para colaborar como cronista sem ter lido seus escritos. Não foi a primeira vez que cometi esse erro, mas certamente foi a última. Ao receber o primeiro original, caí para trás: o texto era tão ruim, com tantos erros de Português e coesão que a única saída era reescrevê-lo por completo, basicamente usando só o argumento original. Paciência, eu preciso de opiniões diferentes, isso me fazia gastar meia hora a mais a cada coluna publicada, tudo bem. Acrescentava ao site e à equipe. Nada que não aconteça em todos os veículos sérios que possuem revisão de artigos. Errei, acontece.
Enquanto isso, num trabalho voluntário, nada poderia ser pior do que ter alguém na equipe que frequentemente se indispunha com os companheiros, tratando as opiniões de todos como coisa menor e chegando a ridicularizar os colegas em nosso grupo de Whatsapp. Foi o que começou a acontecer, para minha desagradável surpresa - minha impressão antiga de Ota era muito diferente da que via na labuta diária. As pessoas reclamando em off comigo, eu tentando contemporizar, Ota não ajudava em nada com seu excesso de arrogância que, muitas vezes, parecia uma espécie de defesa contra a própria mediocridade - atenção para o uso respeitoso dessa palavra. Ou contra bullying, que provavelmente sofreu demais na juventude devido a seu estilo aparentemente engraçado. Enfim, o tipo de coisa que pode destruir um trabalho inteiro. E gente no meu ouvido: "eu vou mandar esse cara TNC"...
Depois da vigésima vez, chamei Ota em particular e o alertei dos problemas novamente. Seu pedido foi "Pelo amor de Deus, só não me tira do grupo porque eu gosto muito de estar lá". Bobo, me comovi por isso e deixei passar.
Ocorrência 21, 22, 23...32... Mais de um ano. Como nada é para sempre, na ocorrência 44 aí eu falei em público que iria puni-lo. Sua resposta foi "Me tira logo dessa merda que eu não aguento mais".
Depois de tanto falar em vão com alguém que parecia desprezar a tudo e a todos, acabei achando a ideia boa. Tirei.
Na hora me senti mal, porque é muito chato quando isso acontece e, apesar de tudo, o colaborador deixou um trabalho legal, mesmo que fosse 99% finalizado por mim. De alguma maneira, fizemos juntos. Mesmo longe de ser brilhante, teve sim sua importância. Valem a essência, o argumento, só que não valia o desgaste. Em particular, umas dez pessoas vieram agradecer o desligamento de Ota, num carnaval desagradável que só se repetiu meses depois.
Meia hora se passou, mensagem no WhatsApp: "Fica aí com seu amiguinho puxa-saco de merda". Eu sou legal, mas também posso não ser e respondi à altura. Acabou, tchau, bloqueei. Vida que segue. Isso foi em 2021. Depois de se indispor com dez pessoas diariamente por quase dois anos, Ota ainda achava que tinha sido injustiçado e preterido por outro colega de equipe. É admirável a vontade que todo sujeito arrogante tem de acreditar nas próprias teses.
Há uns quinze dias, encontrei Ota em Copacabana, no lugar em que morei por quase 20 anos e onde estou frequentemente. Passou com sua empáfia, fingiu que não me viu e, cá entre nós, achei ótimo: qualquer pessoa honesta se sente mal quando pune alguém injustamente. Agora, quando você pune alguém por atitudes Otas e ela comprova que realmente é muito Ota, a justiça se faz presente e você sente alívio.
Ontem tava em casa de madrugada pensando na vida e na morte, na tristeza de tudo que está acontecendo com tanta gente, aí me chega a seguinte mensagem: "Cara, acredita que o Ota tava falando mal de você num grupo e foi esculachado pelas pessoas? Chegaram até a perguntar se ele não entendeu o texto, ahahaha. E o cara ainda disse que você o expulsou do teu grupo. Comédia".
O meu site possui a maior quantidade de material voluntário com redação própria sobre um clube de futebol no Brasil, com mais de 20 mil páginas. Por ele, já passaram ou estão presentes mais de 90 colaboradores em mais de dez anos. Os integrantes da equipe, ativos e não ativos, reúnem somados quase 60 livros, sendo 40 sobre o nosso time e 21 de minha autoria. Produzimos conteúdo diário publicado e audiovisual nas redes sociais/plataformas. Ah, também temos a maior série de e-books grátis sobre um clube de futebol no país.
Tudo isso faz parte de um tesouro que talvez interesse a pouca gente, mas que já chegou a centenas de milhares de pessoas. Ah, sim, nem tudo são flores: tivemos três integrantes expulsos desde 2012, num universo de quase 100. O primeiro vive elogiando o site e os integrantes publicamente, mostrando que os desentendimentos há muito foram superados. Os números falam por si, neste parágrafo e no anterior.
Todo dia eu recebo algum print falando mal de mim, me xingando, me elogiando, me agradecendo. É normal. Além do mais, para o desespero de meus poucos detratores, sou invejado. Estou nessa há muito tempo, me exponho publicamente e não escrevo para agradar ninguém além de mim mesmo. É o critério para publicar: eu tenho que gostar. Já joguei milhares de crônicas, artigos e resenhas fora, algumas com 90% prontas. Colaboro noutro site com mais de 250 mil seguidores, já fui correspondente estrangeiro, milhares de coisas que escrevi já foram publicadas em O Globo, O Dia, Jornal do Brasil, Tribuna da Imprensa, Folha de São Paulo, Estado de Minas, PINN, Brasil 247, Museu da Pelada e Correio da Manhã.
O que não é comum é ser mal falado por alguém que, em mais de uma vez, eu estendi a mão, inclusive integrando com outras pessoas e ambientes legais, interagindo com pessoas que jamais o fariam se não tivesse sido por meu intermédio. Se Ota contasse a história inteira de forma honesta, talvez fosse rejeitado por muitos interlocutores.
Mas, enfim, esse era apenas um simples post de blog, que só ficou com tamanho grandão para mostrar a distância entre alguém que trabalha em grupo e tem currículo, comparada a um candinho de WhatsApp. Isso não se mede por bens, cargos e ostentação, mas por realizações e currículos. Quem tem currículo e realizações, mostra e produz mais; quem não tem, fala mal dos outros pelos próprios vícios que carrega em si. É uma opção de vida.
Nenhuma mágoa de Ota, mesmo. É que já encheu o saco. O que tenho é somente pena.
Há pessoas tão pobres que só possuem dinheiro.
@pauloandel
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