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Wednesday, July 17, 2013

Moranguinho e outras histórias



I
moranguinho

urge a carne escarlate
do teu ventre em minha boca
urge a pele escarlate, o dorso
as rugosas empolgantes
em cor de sangue vivo, muito vivo
urge a tua curva, a nuca o toque
cada pedaço das tuas nuances
tuas entranhas e pêlos

e num instante o mundo é nosso:
viramos do avesso por nós mesmos
imersos, invasivos, provocadores
eu e você na minha saliva
nenhum beijo se faz lágrima
lábios lânguidos a roçar à casca
gostos, traços, secreções
eu quero a tua pele só pra mim
te mergulhar em creme
e fazer de ti a refeição predileta -
ave nosso pecado!
ave o que nos faz de sina!

II
far

nenhuma solidão
é tão humana
quanto aquela
que reside
num quente e delicioso
corpo deitado
bem do nosso lado

III a
inútil – parte 1

agora durmo
e vejo meu próprio sonho:
translúcido
ele tem de uma inutilidade enorme
minhas palavras em vão
são inutilidade enorme
um cais de mil barcos
passageiros tão felizes
um viajante solitário e perdido
sem motivo e crença
ao largo, apenas rastilhos de pólvora
molhada e uma certeza
inútil pela própria natureza -
o resto e só beleza roubada
decomposta, ignara, distante
são cinco e meia da manhã
de um dia quase bonito
é morri ha sete anos atrás
virei minha assombração
um zumbi de copacabana

III b
inútil – parte 2

escorar a inutilidade
entre os escombros da razão
enquanto a chuva não cessa
os mendigos sofrem
e nenhuma ilusão é barata
pessoas sofrem nos pontos de ônibus
e nos terminais, nas centrais
alguém chora num hospital
e a minha inutilidade ri
de tão surreal e tola que é:
decomposta em madrugadas
fracassada, perdida
incapaz de enternecer
e entedia pois não tem lógica
é também mendiga de sentido
são cinco e meia em plena manhã
em pane, desgovernada
ventre de um dia inútil
enquanto a vida escorre
deságua em vão por nada
e o trabalho nos enobrece, oh!
a minha inutilidade ri
de si mesma, de tão oca que e -
fala sozinha, desamparada
ninguém entende ou se arrepia
os alvos estão todos errados
hoje é um belo novo dia
tão inútil quanto ontem
tão inútil quanto o verso
mal-ajambrado na poesia
escorar a inutilidade
em ser estrangeiro de si mesmo
enquanto a dor dói e marca
hoje e só um belo novo dia
e ninguém vai ligar para nada
são cinco e meia da manha
que parece não ter fim ou fase
vemos granadas sem pinos
foguetes fora de órbita
e tudo é tão sem-vão
é espaço, silêncio e perda
enquanto a vida navega
furiosa na contramão
um dia escuro e cinza
para que tudo seja tão longe
quanto é - sem questão!

@pauloandel

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