como vemos o outro
o outro
o maldito outro
o mendigo, o negro
o pobre outro
o transviado
o bêbado caído na porta do bar
- então fingimos: 'nada disso
nos pertence'
é mentira!
o favelado, o porteiro
que nosso preconceito estúpido
não cogita aceite
- nós somos escrotos covardes!
gente que não nos parece
gente mas é gente demais
aí está o país dos empregadinhos
gente tratada como números
ou pela nova pérola: 'recursos'
então dizimamos a praça
trocamos de calçada e sonhamos
com a mudança para Miami:
o mais cafona dos sonhos!
e quando não choramos pela
miséria em veias abertas debaixo
das marquises
e cogitamos uma bomba na favela
aí sim falta o outro
que nos diga sobre a nossa estupidez
que desvele nossa ignorância
e arrase nosso anseio escravagista:
- não queremos funcionários mas
escravos contemporâneos
os trens lotados são navios negreiros
a praça de lágrimas é a dor
dos miseráveis
e a empatia escorre por entre os
nossos dedos das mãos
o outro é o problema
o inferno
eu não tenho nada com isso
e não inventei o mundo
mas faço parte dele feito
o transeunte mais idiota
o problema está em
não tratar o outro feito
lixo, mas infelizmente hoje
essa é a voz do Brasil
a voz do Brasil, a pátria estuprada
em nome do vil capital
gente feita de massa podre
num estado que significa
decomposição
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