a violência aí está para estilhaçar o viço dos dias. ela
sempre esteve, ao menos para aqueles que têm mantido seus olhares mais atentos
a trezentos e sessenta graus em vez de trinta. ela sempre esteve solta, morando
de aluguel no apart hotel dos olhares indiferentes, na opressão infame das
comunidades carentes, sobre a mira dos fuzis covardes que estraçalham sonhos e
trajetórias. a violência aí está diariamente embarcada na baía de guanabara ou
deslizando pela via dutra. hospedada em confortáveis escritórios das grandes
corporações, cujos prédios são batizados com nomes estrangeiros, e onde
raramente se vê um negro ou nordestino que não seja em funções serviçais.
lá está a violência em forma de mãos mendigas estiradas na calçada suja
enquanto um executivo só passa perto do pedinte por obrigação. olhares,
olhares, olhares de desprezo, de aparte, de afastamento. a violência é fácil de
ser entendida quando algum boçal profere a frase “é preciso ensinar a pescar em
vez de dar o peixe”, e então todos percebem que o orador nunca pescou uma bola
à beira de um lago. a hipocrisia é a mãe de todas as violências. a violência é
o egoísmo, o imperialismo financeiro, o racismo, o nazismo, a cólera e tudo que
se vê facilmente num telejornal. os mortos pela fome, pela miséria, pelo
abandono, enquanto há quem espere o próximo feriado, o recesso de natal e um
feliz ano nenhum, feliz ano nenhum, nenhum.
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