Friday, December 28, 2018

acabou o ano

acabou o ano. contamos, calculamos, renovam-se as esperanças e também as agonias. a maioria apenas sobrevive, a maioria nem percebe que é escravizada. todos ou quase todos vão cantar e celebrar, beber e berrar, extravasar. vem o ano novo, vêm as novas esperanças mesmo que elas não tenham base alguma. vem o escorrer do tempo, o tempo, o inferno disfarçado de vida adulta. todos vão beber e berrar, é preciso entorpecer a alma para aguentar o tranco desta merda toda. não há vagas, não há dinheiro, sobram esperanças. as notícias de repetem, as aberrações andam de mãos dadas com a insensibilidade. vamos ver a bela queima de fogos, vamos nos enganar docemente com o novo tempo enquanto há mortes estúpidas nas esquinas, alamedas e vielas - nenhuma arminha vai resolver nada. alguém fará justiça ao poeta e cantará sobre a estupidez de todas as nações. uns e outros se acham mais importantes do que realmente são, os mais iluminados são os mais humildes. chegou o ano novo, a nova ordem, a nova era, o museu de grandes novidades de outro poeta. entre a obsessão corporativa e a ostentação vulgar, veremos o campeonato de posses entre pessoas jurídicas e físicas. enquanto isso, os trens descem entupidos de corpos vivos, as pessoas estendem seus braços miseráveis implorando por uma moeda e quase são pisoteadas por pessoas superiores em coisa alguma, exceto nas oportunidades. o coração da cidade é uma tristeza, é um velório, é um mar de lágrimas que há de se repetir todas as noites depois da grande queima de fogos, aquela que nos faz sentir que o país pertence ao mundo. tudo é ilusão, aspereza entre irmãos, solidão e dor.

@pauloandel

Saturday, December 22, 2018

exile

exílio

I

no final, tudo é em vão
inútil
efêmero e 
desastradamente
repetido
tudo é perda
exílio
saudade e
distância
no final, tudo é
o tempo 
escorrido
o amor que 
deveria 
ser mais do 
que é
o nunca mais
que atordoa
as reticências do 
que
não foi
o desamparo
o tempo escorrido
o tempo
escorrido
a vida frágil
a saudade inútil
tudo é
exílio

II

Ainda me lembro da noite em que soube da morte de Raul Seixas. Eu estava com Zé Luiz no bar do DCE da UERJ quando alguém na Rádio Fluminense deu a notícia. Por mais que não fosse exatamente uma surpresa, ficamos atônitos. Eu comia um hamburger barato com refresco de cola. O Zé não sabia o que fazer. Nós éramos dois garotos de faculdade, cronicamente pobres, sonhando com migalhas, tudo tão atual. A rádio começou a tocar uma canção de Raul e o bar, quase vazio, ganhou um silêncio profundo que eu nunca mais voltaria a ver por lá. Raul Seixas estava morto, muito mais morto do que hoje, quase trinta anos depois. 

@pauloandel

Tuesday, December 11, 2018

o que nos cabe

três horas da manhã e alguém
ri alto da própria desgraça
enquanto passa ao largo
da praca da cruz vermelha

é apenas uma contestação
sem grandes lamentações
nem palavras de conforto:
ele também ri de todos nós

enquanto as últimas gotas
ou lágrimas deságuam no
ralo da pia de louça branca
- um ano velho escorre ali!

não temos grandes notícias
nem planos ora infalíveis
não há feitos inigualáveis:
resta apenas um sonho em vão

Friday, December 07, 2018

para tom waits

solitário o vagabundo
deitado num colchão de
pedra

dormindo à tarde por medo
de ser incinerado, fuzilado
transformado em sucata
do iml - esquartejado podre

as janelas da vizinhança não
abraçam ninguém

enquanto o cheiro escuro da rua
sobe do asfalto e navega
feito condomínios d'alma

não! ainda não é natal
é só um dezembro de chuva
e triste
eles nos veem como pombos:
merecemos ser exterminados
por causa de migalhas

a fumaça feia e suja entorpece
os pensamentos distraídos:
são tempos modernos, egoístas

e tom waits reza a missa num
radinho velho: estão libertos
todos os miseráveis, bêbados
admiráveis errantes vagando
sem rumo ou justiça rija
sem causa ou obediência
sem amigos falsos também

[espia o céu da Lapa depois
de Jello Biafra
e antes de Mano Negra

[encosta o peito no chão
de pedra e namora
a boa morte sem rancor

[a última dança da bailarina
não guarda aplausos
mas uma paixão tesa

tom waits canta
rói a noite e ladra vil
os mendigos são
romance em pó e vento:
onde mora nick cave?

Thursday, December 06, 2018

o ventre da cidade

debaixo das sombras dos gigantes
do concreto corporativo
driblando um sol de rachar 
lá vou eu: sem grandes ambições
e esperanças modestas 
sem pai nem mãe
sem meu irmão 
meu coração despedaçado
procurando esmolas comerciais
e um lugar bem longe 
do sol de rachar
minhas canções desimportantes
ecoam no imaginário
eu não estou procurando um lugar
ao sol de rachar
o que me basta é abraçar
os que me querem bem
os que cumprem pena de miséria
os esculachados
o meu grande coração machucado
caminha anônimo por entre
os soldados da ditadura industrial
com uniformes beges e neutros
ou tailleurs e conjuntinhos manjados
eu sou uma formiguinha
diante dos grandes prédios
com meus chinelos baratos
uma bermuda esgarçada e rota
e cinco mil poemas
eu não sou nada diante do mundo
talvez um número ou um verso
nada diante da grande fome
e da seca que corrói as vísceras
eu sou a herança do nada 
e com meus passos de formiguinha
em chinelos modestos 
atravesso o ventre da cidade
enquanto homens respeitáveis
com ternos bem cortados vêm e vão
com suas malas importadas
cheias de silenciadores
depois de cinco mil passinhos
eu passo por uma livraria e vejo
de maneira inusitada a mim mesmo
numa capa de papel
depois vou para um restaurante barato
conto histórias e traço planos
sem hora de voltar
eu beijo o ventre da cidade
e penso em versos tortuosos
para o futuro que se avizinha
mas não impede as lágrimas
da saudade desfraldada
onde estão meus mortos? 
meus amigos impossíveis?
onde está o que não foi visto
e o que não se viveu direito? 
eu sou uma formiguinha
e com meus pequenos passos
em chinelos de mocidade
vou atrás de mim mesmo

@pauloandel

Sunday, November 25, 2018

domingo velho

Aquele cheiro da memória permanece. É algo difícil de explicar, mas tem a ver com a manhã de domingo em Copacabana, lá pelo alto da rua Siqueira Campos, geralmente ensolarada. Aliás, o domingo todo.

Sentado num sofá vermelho e confortável, lembrança dos tempos que tínhamos algum dinheiro, eu olhava para o rádio Telefunken grandão, com dial esverdeado, onde eu escutava os jogos do Fluminense e dos outros times também - em 1978, com a cara colada à caixa de som, ouvindo baixinho para não atrapalhar minha mãe vendo TV, torci muito pelo Vasco contra o Flamengo, mas aí Rondinelli fez um golaço de cabeça, o mundo explodiu e até hoje eu não sei como aprendi a "secar o rival" (meu pai nunca eu uma palavra neste sentido, só passando a me levar em torcidas como as de Palmeiras e Campo Grande posteriormente).

Ou escutar o programa de Waldir Vieira. Sempre tinha o sorteio de um queijo. 

Esperar meu pai com os trocados para me dar a missão do café: comprar pão, um saco de leite, ovos, presunto, queijo. Depois, na banca de jornal: O Dia, O Globo, Jornal do Brasil, às vezes o Jornal dos Sports ou a Folha. A banca permanece até hoje na saída do Shopping dos Antiquários. Passando por ela e subindo a Siqueira, a Padaria Santa Margarida. 

Aquele cheiro dos produtos do café da manhã permanece intacto. O pão era maravilhoso. 

Esperar ansiosamente pelo jogo do campeonato paulista na Bandeirantes, era o único que passava ao vivo às onze da manhã, ou pela reprise de uma partida do Carioca disputada na véspera. Certa vez passaram uma goleada do Fluminense sobre o America, 6 a 1, fiquei enlouquecido. 

Perto da hora do almoço, se o pai tivesse dinheiro para a gente comprar lasanha pronta na Trattoria Torna, era uma felicidade imensa. Em tempos de fartura, salpicão também. Era delicioso, ficava na Anita Garibaldi. 

Depois da boa comida, tudo era o jogo. A qualquer momento meu pai poderia dizer "Paulo, toma banho pra gente sair". Quem se lembra da série de bonecos dos Thunderbirds? Quando cada um deles pegava seu veículo para uma missão, era daquele jeito que eu me sentia. Se tivesse Maracanã, a gente via o Conversa de Arquibancada e saía - que viagem dos sonhos no 434, cruzando a cidade. Se não tivesse, tudo bem, não era o melhor cenário do mundo mas tinha o Telefunken: mesa redonda, jogo das três horas, repórteres em todos os campos, esperando chegar o jogo das cinco horas, que ia até às sete e depois mais reportagens. 

Ainda consigo lembrar perfeitamente da voz dos saudosos Jorge Curi, Waldyr Amaral, Mário Vianna, Loureiro Neto e João Saldanha, meu herói. Ainda lembro quando eu e meu pai estávamos num grande clássico e, perto do fim da partida, o Maracanã ecoava as vinhetas das rádios Globo, Tupi e Nacional - dezenas de milhares de radinhos de pilha juntos. O Garotinho e o Apolinho ainda estão por aí fortes, o Penido também. Fiquei amigo do Mazella e vi o Rafael Marques começar, isso quando o domingo já era diferente, na garagem da Rex com os campeonatos de botão. 

Dez e trinta e cinco. Acho que me bateu uma tristeza. É que tudo aquilo ficou para trás. Agora às vezes é bom, mesmo com o fim mais perto do que o começo. Foi tudo outro dia e lá se foram quarenta anos. 

Marina está dormindo. Quando acordar, vamos ao rodízio de massas. O Leo e a Letícia não vão com a gente porque estão viajando.

A banca aqui perto quase não tem jornais. Tenho ouvido pouco rádio, preciso melhorar. 

Amanhã começam os trabalhos, tudo muito diferente de quando o grande perigo era tirar uma nota vermelha. 

Podia ter padarias melhores por perto. 

As televisões são cheias de jogos, mas tudo é de outras palavras. 

Se não tem mais pai, mãe, irmão, O Dia, O Globo, Jornal do Brasil, lasanha, salpicão, o Telefunken e o Conversa de Arquibancada por perto, pelo menos sobraram o Fluzão e o meu amor. Logo mais tem drama diante do Inter, estamos aqui para isso. 

De resto, o Brasil era tão diferente e, ao mesmo tempo, igual, igual demais, pelo que de pior cabe. 

@pauloandel

Tuesday, November 06, 2018

visto

o que tenho visto nestas ruas
tem a ver com as sombras
e os indiferentes silêncios

por mais que a paisagem seja
linda
de morrer
e os prédios sejam tão
belos

o que tenho visto é a dor
o vazio a desesperança
corações famintos solitários
em plena multidão

tenho visto mãos de esmola
a caminho da morte
e risos entorpecidos
e felicidades falsas em fotos
tenho visto rancor
a empáfia que apodrece
a alma tonta

as filas do desespero
a injustiça é a grande compaixão
qualquer outro que se foda cru
de quem é a culpa?

o que tenho visto é a miséria
dos capitais vis e covardes
a miséria das famílias destruídas
pela hipocrisia
a miséria dos amantes
desencontrados
por nada

as luzes dos barracos sugerem
um céu estrelado visto
por quem sobrevoa a cidade
decapitada

manchetes sangrentas
e mentiras de primeira página
a serviço dos párias do amor

o que tenho visto de perto
mora em pequenas lágrimas
pelos irmãos distantes
os desaparecidos
os amigos de abraços sinceros
pequenas lágrimas de saudade
e do que nunca mais será
o exercício das pequenas coisas

silêncios indiferentes no elevador
nos olhares faiscantes pelas
conversas eletrônicas:
o admirável mundo frio
os oprimidos por toda parte
à noite as grandes avenidas
pertencem aos mortos vivos
zumbis de calçada desprezados
e quem não tem nada a ver
com isso
sorve o sono dos tranquilos

o que tenho visto é o fim
mais perto do que o começo
sem medo nem otimismo
que os últimos anos sejam
o contrário de tudo que prometem:
não me levem flores
nem escrevam belos poemas
ou cartas de amor -
nem o pior dos homens merece
uma despedida hipócrita

perto da meia noite tenho visto
o dia que nasce sozinho
as promessas não cumpridas
a tristeza das distâncias
infinitas
relembro um poeta triunfal e sua
pergunta:
como matar o tempo?

o que tenho visto são belos prédios
e corações despedaçados
- a natureza humana

@pauloandel

Tuesday, October 30, 2018

poema para john lydon I



(contém citação de "Bichos Escrotos", 1986)

respeitáveis senhoras e senhores/vocês apoiaram um golpe sujo/rasgaram 50 milhões de votos/destruíram dez milhões de famílias/ajudaram a demitir 30 milhões de pessoas/xingaram/berraram/sambaram com suas patéticas camisas da CBF corrupta/e tão fascista quanto vocês/fingiram que o mineirinho não fez nada/e comemoraram a prisão do pernambucano como se fosse um gol/como se fosse um gozo/cagaram e andaram para o mundo/seguiram firmes no ódio aterrorizante/até elegerem alguém com a cara de vocês/a cara cínica e escrota de vocês/enquanto pobres e gays e crianças foram mortos/para celebrar o mito da podridão com rajadas para o alto/e agora virem com essa conversa fiada/de estarmos no mesmo avião/de estarmos no mesmo barco?/ não não não/ sejam oncinha pintada/zebrinha listada/coelhinho peludo/vão se fuder!/aqui só tem bicho escroto/cuspindo o barco e o avião em cima de vocês/cada caceta uma sentença/o diabo mora em cada um/um dia a conta chega e vamos cobrar de todos vocês/façam do mito um supositório/e usem ao bel prazer/vão se fuder!/junto com suas grandes corporações/e canais de TV/deixa arder que vai ter guerra para todos/não é só pobre que vai morrer/o fascismo late pelos cantos procurando comunismo/não empurrem essa conta para os outros/o garçom atendeu ao pedido de vocês

Saturday, October 20, 2018

amori I

decerto já não me chama
porque há outra estação
mas talvez ainda sonhe
com versos que
posso dizer
e me deseje com ardor
e fé
- favos de lascívia e delicadeza
- belezas da vanguarda e do sexo
nós, tão solitários
dentro de nós
procuramos a imensidão
do amor:
ele está nos sorrisos e lágrimas
nas mãos estendidas
e conversas prazerosas
- os amigos que cativamos
e esperamos o amor por
todas as partes
varrendo desesperanças
e opressões
o amor nas asas dos pequenos
pássaros na praça
e nos brinquedos coloridos
no camelô
o amor num lanche modesto
numa lanchonete modesta
no coração da cidade lunar
as paixões que se namoram
e também se desencontram
- e velórios em dias de puro sol!
precisamos de mais abraços
e saber que o outro sempre sofre
nossa humanidade em risco
no quarto ela pensa
no que eu disse e escrevi
e forja seu grande romance
ah, amor que acorda e cochila
espia a vida na gare
ou numa calçada infiel
os corações são outros
e precisam de cor e afago
não podemos ser
indiferentes
- mãe e filhinho de mãos dadas
- o sol que celebra e mói
- a brincadeira
até que a pátria seja bondade
com suas armas incineradas
a mão do homem não é tristeza
mas saudação e amizade
o amor até que todos os meninos
tenham escolas e calçados
e brinquedos
os trabalhadores com bons dentes
e casas honestas
e comida
os doentes bem tratados
nos hospitais
há amor em todos os actos
precisamos de mais abraços
e camaradagem
e beijos que foram apenas sonho
até aqui
o amor é uma cidade
precisamos de ventres livres
e dignidade
o amor há de nos redimir
nas paixões desveladas
no abraço dos irmãos distantes
pelos pequenos encantos
quando todos forem dignos
absolutamente dignos
sem depender de classes
ou roupas ou carros
- celebremos nossos abraços
enquanto há tempo e os irmãos
estão longe das masmorras
precisamos enxergar o amor:
pátria, novas famílias
e uma velha liberdade que
tanto temos procurado
um dia, ela vai entender
que tudo era amor
e então a pátria será povo
o pobre será beleza
o abraço, a maior de todas
as nossas riquezas
e o outro não será apenas outro
mas nosso amigo, um grande
irmão - meu, teu irmão
nós seremos um abraço
e então a pátria será
verdadeiramente
livre

@pauloandel

poema braziu-ziu-ziu

pátria amada 
gayzista comunista 
neoliberal 
onde negros, homossexuais 
nordestinos e pobres 
vibram e votam em 
quem tem ódio 
de negros
homossexuais
nordestinos e pobres
onde pobres 
e assalariados
acham que são ricos porque 
têm carro e celular 
e por isso apoiam 
quem tem ódio de pobres 
e assalariados 
onde maconheiros votam
em quem quer matar 
maconheiros
onde trabalhador tem
ódio de trabalhador
o paraíso da síndrome
de Estocolmo
o berço esplêndido
dos otários
shangri-la da escrotidão
onde furar fila é maneiro
embolsar troco indevido
é maneiro
e dizer que a novinha
já aguenta é maneiro
paraíso dos filasdasputas
onde a nobre Universidade 
Federal do WhatsApp tem 
mais prestígio do que 
qualquer 
outra instituição de
ensino superior
onde post é mais do que livro 
onde ladrão vira bispo 
onde a TV é maior do que a 
verdade 
onde latinos terceiro mundo
se consideram arianos 
e nem pensam que os arianos
querem lhes fuder de verde
e amarelo, azul e branco:
aplaudem hitler terceiro mundo
onde querer mudança é 
se prestar a servir 
de esparro do fascismo 
a capital da insanidade
onde quem nunca soube 
fritar um ovo ou lavar uma roupa 
acha que pode resolver 
tudo na sociedade 
com uma arma na mão
oh, pátria amada gayzista 
comunista retrô neoliberal 
que repousa nas cabeças vazias
pátria do caralho
com a maior quantidade 
de gente 100% ignorante 
e fã de terra plana
é verdade este bilete rais:
gooooooooooolllllllllllllllll!

@pauloandel

Friday, October 12, 2018

debaixo da cauda urbana I

debaixo da cauda urbana
há o caos: ratos de esgoto
em cadeiras corporativas
sonhando com senzalas
chicotadas e pau de arara
enquanto pobres diabos
esbofeteados pela vida 
trocam seus dias pela fé
no papo torto charlatão
que lhes faz entorpecidos
por procurações de Deus
que nunca existiram aqui. 
debaixo da cauda urbana
há dor, violência e morte
indiferença e estupidez
insensatez tão desumana
há hitler terceiro mundo
e nazistas caboclinhos
- querem ser arianos vis 
mas são apenas latinos.
debaixo da cauda urbana
há mil mãos estendidas
e dois mil rostos virados
torcedores do mercado
e teorias insustentáveis
mas não há só nazistas
também a brava gente 
que não aceita escravidão
nem opressão e rancor
a gente que vai às ruas
sem ódio ou má índole
apenas boa esperança
que passa nas portarias
dos grandes edifícios
no coração das cidades
atrás do espírito da paz. 

@pauloandel

Saturday, September 15, 2018

love sex saturday's feeling

O que você quer de mim? What do you want from me? Já parou pra pensar o que eu quero? Eu parei e pensei há muito tempo. Eu quero te comer, te lamber, te fuder muito até você não aguentar mais e desmaiar de tanto tesão. Até você não aguentar mais e deixar vazar todas as secreções do prazer, nós dois molhados um no outro. Eu pensei que o nosso tesão fosse taquicardia um no outro, o peito batendo forte, os mamilos endurecidos, as carnes roçando uma na outra até fazer fechar os olhos e viajar por mil sensações. What do you want from me? Yo te quiero desnuda, dá me tu amor, teu sexo em rosa flor de botões delicados e tão saborosos. Ah, deixa eu navegar na tua pele como se fosse a descoberta do continente desconhecido, como se fosse a primeira primeira vez, e te beijar e namorar e te derramar meu líquido consciente. Eu quero te fuder muito. Eu te quero de amante. Super outro lua cheia sedenta. Eu quero te beijar até você quase se mijar de tanta vontade de sexo. Meu poema, meu verso torto, meu senhor e puta no down by law numa quitinete de Copacabana ou no motel da Cruz Vermelha ou numa casa emprestada em algum lugar da cidade. Eu quero te venerar. Eu quero te chupar sem fim. O que você quer de mim? Saber exatamente o que você está pensando. Sentindo. Gemendo. Gozando. Gozando. Gozando. Eu quero te ver quicando em cima de mim. Eu quero te penetrar até você gritar. Eu quero ser tua perfeita companhia. Eu quero te melar muito, te deixar no suor mais quente. O que você quer de mim? Por que você não diz o que quer de mim? Vamos ser dois animais a serviço do prazer cumprido do outro - e mais nada. 
@pauloandel 

Friday, August 17, 2018

cão

Eu sou o cão de olhar perdido em noite fria debaixo de uma marquise da Cruz Vermelha, enquanto meu dono desmaia de sofrimento, cansaço e indiferença. Não consigo latir nem brincar, apenas olhar para o nada que chamam de horizonte, enquanto também sou desprezado pelos transeuntes, que me consideram o símbolo de uma derrota. Eu olho para o nada e vejo outros cães noutras calçadas, muitos feito eu e outros tão bem tratados que sequer usam coleira. Eu sou um cão da noite triste e ninguém passa a mão na minha cabeça ou me oferece um nugget. Estou aos pés do sofrimento do meu dono e do meu mesmo, sem latir e pensar, irracional que posso ser. Metros acima, as luzes indicam que as pessoas estão comemorando gols, xingando políticos e rolando em berço esplêndido de cólera. Eu sou um cão sem dono, sem latido, sem futuro e fico tranquilamente apreciando todas as horas do fim, como se coubesse num poema de Torquato Neto. Cão, cachorro, bicho de estimação sem estima, o que me resta é a solidariedade do meu dono desmaiado em cima das frias e cortantes pedras portuguesas. Eu só queria um bife, uma coberta, um dia de vida em busca deste sentimento tão nobre - e vedado aos caninos - chamado de paz. Eu, tão cão da noite e do desalento, posso ser mais humano do que os humanos que me veem com nojo. Eu, cão triste, amigo sincero do homem que passa apressado para fugir da minha miséria. Ele, tão ser gregário, tão hipócrita e eu, contando mais um dia de vida ou de pena cumprida, ou ainda do caminho inevitável para a morte, outro verso de Gil.

@pauloandel

Thursday, August 16, 2018

Por que voto em Elika Takimoto



Por absoluta sorte, tenho acompanhado a trajetória de Elika Takimoto bem de perto desde fins do século XX. Perto daquele tempo e pouco depois, ela se esfalfava para cuidar de duas crianças, seus filhos Hideo e Nara (Yuki, o terceiro, só viria mais tarde), da casa, do marido, dos estudos, do trabalho como professora e mantinha sob absoluto sigilo um talento que o tempo tratou de desvelar para o Brasil: o de uma escritora de mão cheia, uma memorialista de marca maior, digna de Zélia Gattai (com quem manteve contato, aliás).
         
De lá para cá, o que já era ótimo só melhorou: não bastasse se tornar uma autora reconhecida e premiada, Elika avançou em todos os sentidos. Quando o assunto é formação acadêmica, chegou ao doutorado em Filosofia. Como professora de física e coordenadora do Cefet-RJ, percorreu o país como palestrante aclamada e só falta dar autógrafos aos alunos, de tão querida que é. Conhece tudo sobre escola e universidade, seus aquários natais e de ofício. Seu livro “Isaac no mundo das partículas”, sucesso de vendas, baseou uma peça de teatro infantil aclamada por crítica e público.
        
Mãe, mulher, moradora de Madureira na divisa com Cascadura (mais Rio de Janeiro raiz, impossível), fiel escudeira da Educação, filha de japonês, dona de uma risada inconfundível, trabalhadora, nos últimos anos Elika arrebatou uma legião de fãs nas redes sociais por muitos motivos, sendo o principal deles a luta pela democracia que existiu um dia no Brasil, além da sua visão em 360 graus a respeito das mazelas que têm vitimado o povo brasileiro e, em especial, o do Rio de Janeiro: genocídio, violência ostensiva, desemprego a granel, demolição econômica, degradação política, saúde na sarjeta, educação à míngua, desesperança.
         
E tudo isso com uma coragem que se espera dos protagonistas da história: justamente em meio ao caos, no mar de ódio que o golpe de 2016 espalhou pelo Brasil, ela navegou contra o linchamento midiático que foi meticulosamente instaurado contra o Partido dos Trabalhadores e, em especial, a figura de Lula – qualquer pessoa minimamente informada percebe os movimentos das grandes corporações de comunicação quando o assunto é oprimir e alienar o povo brasileiro, sendo que o Rio de Janeiro sentiu o baque da implosão a olhos nus da Petrobras como nenhuma outra unidade da federação. Daí sua indignação contra o golpe, contra o cárcere privado de Lula, contra o sequestro da democracia brasileira, contra a implosão do Rio, contra a destruição das políticas de inclusão social que salvaram a vida de milhões de pessoas desde 2002, contra o entreguismo feroz que só atende aos anseios do capital rentista e mais nada, enquanto os integrantes de três famílias controladoras da holding Itaú-Unibanco receberam 9 bilhões de reais em cinco anos a título de dividendos, sendo três bilhões somente em 2017 com zero imposto de renda. Tudo em meio a uma crise que, organizada pela vilania, fez com que no mesmo período fosse dobrado o número de desempregados no país, sem contar os desalentados (aqueles que desistiram de procurar por uma vaga).

Apesar de seu extremo bom humor, Elika é naturalmente uma cidadã indignada. Ela sabe que o Rio e o Brasil podem ser diferentes do que esse arremedo golpista de agora – e diferentes para muito melhor. É disso que nasce a sua candidatura. E justamente por ela ter vindo “de fora” do ambiente político convencional, tem gás de sobra contra os velhos fisiologismos dos quais estamos todos bastante cansados. Trata-se de uma acadêmica de sucesso, uma intelectual bem-preparada que vai muito além das salas de pesquisa: por sua formação e vivência, ela sabe do riscado quando se fala de trem, de subúrbio alijado de política cultural, da saúde ausente, da segurança esquálida, de colégio abandonado, da cidade tão partida e injusta que é dividida pelo muro invisível (mas presente) entre o balneário e os bairros-alojamentos. Além do mais, quem define sobre quem vem “de dentro” ou “de fora” da política partidária, ou quem “pode” vir ou não? Ela, a política, é para todos!
         
Para finalizar, meu voto não é somente em uma mulher com enorme estofo intelectual, acadêmico, familiar, social e moral, com fartas realizações em sua vida pessoal. Aqui peço licença para falar de ética, de apreço, de honestidade, de sinceridade, de decência. Elika é uma das pessoas em quem mais confio nesta Terra. Eu a vi crescer e se agigantar sem dar um único passo se esquecendo de sua trajetória e de quem a cerca. Posso falar disso de cadeira: generosamente, ela é a prefaciadora dos meus dois livros “Cenas do Centro do Rio”, minha primeira incentivadora literária, minha querida companheira de mesas e lançamentos – e, para qualquer escritor que se preze, o que modestamente é meu caso, prefácio é coisa que só se oferece a quem se confia e se admira muito. Falando em literatura, Elika é novamente um desafio: cansada de ler as negativas mais estapafúrdias das editoras para a publicação de suas obras (ah, editoras, que pisam em seus autores sem dó...), ela pôs a mão na massa e lançou seus títulos de maneira independente, já tendo sido lida por milhares e milhares de pessoas. Convém não dizer a ela que algo de bom não pode ser feito sem um motivo muito justo e comprovado, senão...
         
Elika pensa no próximo e sofre com a dor do outro. E pensa num mundo mais justo, mais humano, um mundo de inclusão e participação, de justiça, de democracia. Embora seja jovem e com o mundo pela frente, ela é uma veterana do ensino e, por isso mesmo, tem a capacidade de dar a aula magna que o Rio de Janeiro anda precisando tanto: a da política participativa, plural e democrática, a da política popular. Eu confio e vou com ela onde estiver. Precisamos de gente com atitude para mudar o mundo, e isso começa pela nossa cidade, pelo nosso estado, pelo nosso país, e essa atitude tem que ser exercida no voto, com realizações em prol da população. Que minha amiga tenha toda a sorte do mundo nesta jornada – e creio plenamente que terá -, porque nela eu tenho a esperança de ver a política do Rio de Janeiro em seu devido lugar: nas manchetes de grandes realizações populares - e não nas de tragédias policiais, como tem sido ultimamente.



#EuVotoElika
#13021
#RioDeJaneiro


Tuesday, August 14, 2018

Retratos de agosto

(ou os corações solitários no ponto de ônibus
em frente ao prédio com pilotis)


a miséria é
livre é
grátis é
democrática:
todos estamos fudidos

mas há quem aplauda
o que está acontecendo
como se estivesse na fila
dos banheiros em auschwitz

e dissesse: há de ser
uma ducha boa!
todos estamos desempregados
humilhados, escorraçados
enquanto as manchetes da tevê
saúdam o lucro dos bancos
os condomínios de gran luxo
e a balança comercial

a miséria está em todas as calçadas
e marquises
nas praças abandonadas
no vinco dos rostos sofridos
que dormem ao relento gelado
ela, miséria, generosa que é, se espalha
e abraça cada vez mais gente
todos somos mendigos:
se não for das ruas, que seja das almas
do nosso vazio indiferente
do nosso foda-se o outro
existe no ar o misterioso sono da eternidade
quee flutua nos corpos
recolhidos na uerj e nos trilhos
do metrô
e nos restos mortais no iml
somos estúpidos demais
demais!

Sunday, August 12, 2018

manhãzinha

o silêncio profundo na manhãzinha de domingo. um ônibus corta a cruz vermelha lentamente. os notívagos deixam a boemia da lapa para trás, caminhando lentamente. um ou outro carro passa.

do lado de fora da janela do quarto mora um silêncio. a réstia de luz escapa por dentro da cortina azul.

há mil domingos ou dois mil domingos, eu achava que era mais feliz. pão, presunto, queijo prato, um litro de leite em saco plástico, muitos jornais, a família batendo os talheres no ir e vir da minúscula cozinha. a esperança de um bom jogo no maracanã, de um belo show na praça do arpoador, de uma caminhada pela praia apaixonada de copacabana.

as pessoas sofriam, mas havia uma doce ilusão de futuro, o tal país do futuro, aquele que, ao que tudo indica, jamais chegará. era triste, mas diferente deste silêncio de desalento, de morte em vida. gente que virou número, quadro, objeto a ser descartado, lixo sem reciclagem condenado a morrer sufocado pelo próprio chorume.

onde foram parar os bêbados admiráveis que passavam do lado de fora da janela, cantando e espantando a dor às seis e meia de domingo?

do lado de fora da janela existe uma cidade fantasma, incapaz de impedir a agonia que alimenta seus suicidas miseráveis e tristes. a banca não tem jornais, a padaria não abre, os talheres estão imóveis, existe sofrimento e melancolia. ninguém espera um grande jogo no maracanã, nunca mais o arpoador abrigará um show especial.

ao quase longe, os miseráveis da cruz vermelha começam mais um dia de sofrimento em seus caminhos inevitáveis para a morte. não há nenhuma celebração. não há qualquer motivo para se festejar o que quer que seja. menos mal que, daqui a pouco, crianças vão chutar uma bola velha no asfalto da rua de lazer.

está me faltando coragem física para abrir a caixa do Tom Zé, o duplo do Bob Dylan 1966 e o box do Police. enquanto isso, o sol se torna mais vivo por trás da cortina azul. os filhos vão abraçar os pais, vão chorar por eles ou tentar entender este mundo de incompreensão e tristeza, onde é normal ver as pessoas jogadas na rua feito mascates da vagabundagem - eles estão lá porque querem, diz um comentarista primitivo do cotidiano.

ah, quem me dera pudesse voltar a jogar futebol com meus amigos, sonhar com um domingo feliz, sonhar com um país e um mundo que não são meus e, na verdade, revê-los como eles nunca foram.

às vezes os pais são muito felizes. noutras, eles são abraço e fé. noutras, eles são a lembrança da réstia de sol que penetra pelo meio da cortina azul, fechada. os filhos procuram os pais, o futuro repete o passado por alguns instantes, até que ronca o motor de um ônibus e é o único sinal de oposição numa estranha coalizão de fracassos. o que vem pela frente, ninguém sabe, ninguém.

@pauloandel

Friday, August 10, 2018

cortar cortar

vamos cortar vamos?

vamos cortar as gorduras

as despesas

vamos vamos cortar

as divergências e desacertos

vamos!

que tal cortar na própria

carne?

cortar os outros, os baratos

vamos cortar nossos sonhos!

vamos cortar os números

os empregados, os investimentos

cortar postos, ora!

hora de cortar despesas: são

tudo investimento FODA-SE

vamos nos cortar uns aos outros

com belas balas

cortar o caminho, abreviá-lo

cortar, cortar, cortar

cortar as vidas de merda

até que o nada e a destruição sejam

um só: irmãos siameses

namorados de mãos dadas

celebrando uma guerra que só tem

derrotados

suicidas

e corpos putrefatos:

os pedaços podres no

chão atestam o sumo

da nossa ignorância

@pauloandel

Tuesday, June 19, 2018

sido cão

tenho sido um cão sujo e triste abandonado numa calçada respeitável, enquanto outros cães me desprezam e não oferecem um pedaço de carne sequer. ah, os cães que passam tão indiferentes, ocupados com tardes e noites vazias, procurando a vaidade num espelho sujo. nem as pulgas me abraçam. tenho sido um cão sujo e triste, zumbi desnecessário cumprindo adestramentos inúteis porque sou velho, não tenho planos nem futuro, os outros cães não me oferecem solidariedade porque seus instintos estão pervertidos. hum, grande cão inútil sem osso nem casinha, sem vacinas e tosa, um diploma que seja! sem direitos: não tenho maconha para aliviar minhas noites de frio, nem emprego porque os cães são desimportantes no país dos estrumes, nem renda, nem casa, nem qualquer coisa que passe perto de algum conforto. eu, cão, sem pai nem mãe nem irmão, sou apenas um coração inchado à espera de uma chance, de um osso para roer, de uma mísera mão acima da cabeça por consideração e justificativa para estar onde não posso falar, onde nunca serei escutado além dos poucos latidos que tento - eu cansei de latir em vão, os cães não ligam, os animais irracionais gritam e matam e morrem em vão. eu, cão sujo e triste, querendo um banho que não depende de mim, um pacote de guloseimas que passa na TV para a elite - eu sou excluído por excelência -, um pequeno afago que me faça sentir importante no meio de tantos outros cães, coisas grandes, bichos grandes que vão e vêm sem compromisso com qualquer bicho em volta. tenho sido um cão sem sentido, ando à toa, sou insone em qualquer calçada e tenho certeza de que não faço qualquer sentido frente aos bichos de aço, aos bichos de patas redondas de borracha, aos pequenos bichinhos que esticam suas patas tentando alcançar outros bichos apressados. cão, cão, tenho visto a dor e o sofrimento que não sei latir, mas apenas fitar com meus olhos tristes e irracionais. não aguento mais a coleira, a sujeira, o osso que não encontro, a guloseima do pacote que nunca me dão. por favor, não soltem fogos. @pauloandel

Tuesday, June 12, 2018

um homem comum


eis o homem comum, um cidadão
um número
caminhando sem cantar as dores
tão solitário
no coração de uma grande
cidade

um homem sem nome nem berço
sem ambições e esperança
caminhando sozinho
em silêncio e lágrimas
encolhidas enquanto espera
a hora fatal sem previsão

um homem qualquer, pobre, triste
simples e desprezado
um homem do povo
com seus panfletos ou bugigangas
ou panos de prato ou figurinhas
lutando, lutando
pelo que jamais virá

um homem no chão, sem nome
sem pai nem mãe
sem nenhum amigo
sem o respeito do outro
olhando para o céu e tentando
entender o que faz
no coração do inferno

@pauloandel 

tristessa


eu não caibo mais
aqui
não era minha
a pena que eu
cumpri
eu não tenho
abraço, afago
apoio, perdão
nunca fui nada

eu não pertenço
a este lugar
não tenho a ver
com ninguém
não aguento mais
a minha dor e
a de outrem

eu não tenho
turma, família
casa, pátria
felicidade
eu não faço
a roda girar:
tenho saudade
até do que
não pude ver

eu nunca fui
de caber aqui
não é o meu
lugar
- quem havia
de amparar
a tristeza?

[ninguém mais]

[a morte me cai
tão blue]

um tchau
e voltar do jeito
que vim:
sem rancor
nem vontade:
apenas
a miragem

@pauloandel

Friday, June 08, 2018

O novo single de Mussa: "Eles voltaram de novo"

"Eles voltaram de novo", nova música de trabalho do cantor, compositor e artista Mussa, em parceria com Kiki Marcellos.

FACEBOOK DE MUSSA: CLIQUE AQUI




Thursday, June 07, 2018

você precisa ler o mundo

A gente só vai conseguir dar passos à frente quando você ler o mundo de verdade, muito além do óbvio. Você, a gente, todos nós. É preciso ler o sangue nas veias, ler as lágrimas da saudade, a tristeza, o desalento e também a esperança. Ler, ler, ler os versos tortos, os parágrafos sujos, as crônicas enferrujadas, os velhos e-mails arquivados na pastinha. A gente precisa ler uma noite à beira do Atlântico Sul, uma tarde no Imbuí, um dia de procissão. A gente tem que ler a compreensão, porque a afirmação que depende de escorraçar o outro é natimorta na essência. Você tem que ler o abraço, o carinho, as outras palavras neste mundo de imensidão, injustiças e egoísmo. Vamos ler o amor ao outro, a consideração, ler o querer bem, ler nas entrelinhas do apreço. Que tal ler a imagem do velhinho sentado no banco da praça vendo as crianças brincarem? Ou do moço da carrocinha de picolé? Ler a moça das verduras na esquina perto do bar. A gente tem que ler os sonhos das crianças e não botar tudo a perder. Vamos ler amor e sinceridade? Vamos, é preciso! A gente tem que ler a beleza da Roberta cantando samba na televisão à meia-noite. Respeitar o cansaço do vigia na portaria de madrugada. Vamos ler o passado, quando éramos mais gentis sem a Idade Média com smartphone. Ler, ler, ler, chorar, sorrir, tentar entender um pouco deste mundo injusto e breve, cheio de maldade, mas procurando as pequenas brechas e lê-las, exatamente onde alguém escreveu o espírito da paz. 

(ao fundo, os tiros de sempre no Catumbi) 

@pauloandel

Tuesday, May 22, 2018

Os trechos dos livros que ainda não foram escritos

Participação especial de Amanda Rodrigues.

Prefácio de Marcelo Migliaccio.

Direção de Zeh Augusto Catalano.

“O Sr. Robert, 70, desceu à rua. Veio ao Rio de Janeiro por motivos profissionais, mas já conhecia a cidade de outros tempos. Num domingo nem frio, nem quente, com nuvens em Copacabana, ele caminhou vestindo um casaco talvez jeans, uma touca e óculos escuros. Noutros lugares, talvez a indumentária chamasse a atenção, mas não no bairro da praia mais famosa do mundo, onde andar vestido com um uniforme de super-herói ou com uma fantasia de viking não causa qualquer espécie - desde os anos 1940, alguns moradores da região faziam coisas bem piores (ou melhores, dependendo do ponto de vista)."

"Uma vaca preta e solitária caminhando tranquilamente pelo pasto verde e rente, bem rente, numa espécie de mar da tranquilidade esmeraldina, sem ninguém por perto, nenhum tocador ou fazendeiro, nenhuma outra vaca também, simbolizando o tempero de solidão que se sente quando se está numa ilha - e os Açores são assim, deitados elegantemente nos braços do Atlântico, onde não se vê um barco sequer ao longe e, ao fixar os olhos na linha do horizonte, é inevitável sentir o gosto da melancólica reflexão sobre o mundo.

"Mas afinal, onde foram parar os flamboiantes da cidade? E as amêndoas, cada vez mais raras e sem os minicraques da pelota, loucos para chutá-las e marcar lindos gols imaginários no estilo do falecido Maracanã? As jovens normalistas e os pequenos jornaleiros, cadê? Símbolos de charme e juventude, noves fora nada.

"Ah, Thaís, como eu te quis! Desde a primeira vez que te vi passando tão linda no saguão da faculdade, nunca mais te esqueci. Eu pensei em você quando estive em outras cidades, em outros causos e outras mulheres: todas foram traídas por você involuntariamente. Pensei em você nas noites de luxúria e solidão, nas noites de festa e lazer, no gozo de ocasião. Eu encontrei você nos meus sonhos de putarias mais doidas e também nas cenas mais românticas de uma pracinha do interior. Ah, Thaís, eu te quis o tempo inteiro até que fôssemos uma só carne e um abraço."

"Trinta anos depois, Vaz Lobo estava completamente diferente. A Edgard Romero completamente deserta às sete da noite, mesmo em frente da antiga Nuno Lisboa. Do outro lado da rua, o prédio de quitinetes onde morei com meus pais por alguns meses - os antigos moradores eram jovens estudantes comunistas que fizeram lá dentro um mosaico com fotos de jornal, especialmente a de Mussolini de cabeça para baixo. Cheiro de rua triste. A lanchonete Miguelão estava morta."

Friday, May 11, 2018

breve resumo da vida

a vida
é o exercício
das inutilidades:
nascer, crescer
viver, morrer
sem entender
o ir e vir das coidas
sem entender
o estranho amor
o inconsciente
tudo sob demolidora
velocidade - nos
pequenos intervalos
procuramos a paz

fim


O QUE ADIANTA essa luta estúpida que não vai dar em nada? O ódio das ruas, a opressão, olhar para trás e estar bem mais perto do fim do que do começo, nada mudou de verdade exceto o tempo que é cada vez mais exíguo. Temos nossas próprias guerras e o mundo não vai nos escutar ou acudir. Continuamos chorando pelas ruas sem que ninguém dê atenção ou sequer perceba. Somos o desalento. E então nos amontoamos nas cidades em barracos, marquises, três, ônibus e calçadas. Todas as velhas mãos esmolando e esperando a hora da morte continuam lá. Todos os garotos negros, humilhados famintos, continuam com suas caixinhas de engraxate à mão, sentados com os olhos esbugalhados em frente à vitrine da loja de eletrodomésticos, sonhando com um desenho animado, um lanche, uma noite de paz que nunca virá. O QUE ADIANTA essa luta estúpida que não vai dar em nada? Os homens pomposos, cheios de diplomas, mal sabem ler as evidências. E trocamos nossas livrarias por restaurantes, nossos cinemas por igrejas, nossos centros culturais por nada. Estamos muito ocupados com os smartphones tocando canções toscas ou oferecendo joguinhos de passatempo. Ou conversas daquilo que nunca vão chamar de amor ou atenção, sequer afeto. Passatempo. Estamos cheios de armas por todos os lados, mortes por todos os lados, as famílias choram diariamente por alguém que nunca deveria ter ido à toa. As pessoas são honestas, mas os empregos estão acabando e não há vagas para todos: muitos vão ser ainda mais humilhados, oprimidos, tratados como lixo na sociedade onde cada um é um número, um quadro, uma merda qualquer exceto gente. Não somos mais gente, muita gente não nos considera gente e sequer a si mesma. Somos quadros. Números. Códigos numa lista de espera. Somos currículos jogados fora numa agência de empregos. Somos os receptores de “Muito obrigado, a gente te liga”. O QUE ADIANTA essa luta estúpida que não vai dar em nada? Nós seremos sempre amores desencontrados, portas fechadas, endereços por engano, clichês da desilusão. Nenhuma droga vai nos salvar; no máximo, tentar minimizar a dor, até que vem a realidade das próximas horas e tudo volta ao caos de sempre. Ficamos acostumados a anormalidades em forma de mundo corporativo s.a. – e como você não inventou o mundo, não tem culpa dos mortos no prédio implodido da Paissandu, nem do antigo Edifício São Vito – alguém se lembra? NÓS somos o desprezo ao Morro do Bumba, a indiferença diante de quilômetros de miséria, ameaças, estupros e humilhação. Nós somos o gado sem rumo dando porrada uns nos outros para sentar no banco de aço do metrô, porque eles são poucos e o trem é feito para as pessoas irem apertadas em pé mesmo, porque quem trouxe os trens acha que pobre tem mais é que se fuder, apoiados até por alguns pobres que não se consideram pobres, assim como temos os negros que apoiam o racismo, os gays que acham graça da homofobia, os saudosos da ditadura que não se importam com os mortos e estuprados por ela – “estavam fazendo merda” – quem diz isso deveria pagar imposto sobre a própria respiração. A cada dois anos as manchetes se repetem. Não somos capazes de valorizar quem nos valorizou. Este é o mundo moderno de 11 de maio de 2018 e, tirando os iphones e as grandes televisões, o que nos restou foi uma Idade Média com 210 milhões de pessoas, sendo que a metade delas somada tem menos dinheiro do que seis criaturas deste país, e alguém ainda vai dizer que esta matemática tem condições de gerar prosperidade. A verdade é que estamos todos condenados e vamos cumprir penas, alguns com todo o conforto em casa e as manipulações que já se conhece bem, enquanto outros vão se arrastar até o nada: a carne podre, dissolvida em caixas mortuárias, esperando que alguém tenha saudade de seus ossos. As pessoas estão ocupadas demais porque em muitos casos perderam completamente o senso de humanidade. O outro não é nada, é só um móvel ou uma vassoura ou uma caixa empilhada. Aplaudimos os golpes e ficamos em silêncio quando somos empalados por eles. Ainda somos os mesmos patetas que imitam a novela, que repetem as falas dos telejornais sem nenhum senso crítico. Talvez toda essa merda também seja culpa nossa; na verdade, é mesmo. O desencontro, o desprezo, a distância asséptica, nós inventamos isso em nossos tempos modernos e, em breve, chegaremos ao auge da vanguarda, quando nossos apartamentos não passarem de cavernas onde estaremos abrigados por causa do mundo injusto. Tudo que está aí é inaceitável e, por quarenta anos, do meu jeito, com os meus pobres recursos, eu lutei contra isso e não passei de um escravo da dignidade do homem. Continuo sendo, mas agora estou morto, me vejo morto e só assim posso respirar minúsculos segundos de liberdade em sonho. Finalmente chegou o dia em que, no fundo, somos todos infelizes demais – e o pior: nós mesmos construímos os diques que, planejadamente, foram afundados para que todos nos afogássemos sem paz, com exceção daqueles que, debaixo d’água, com os pulmões alagados, ainda riem e debocham dos outros, sem perceber que serão tão chicoteados até à morte como suas vítimas do ódio. O QUE ADIANTA essa luta estúpida que não vai dar em nada? Eu estou morto, não tenho santos, nem paz, e carrego comigo apenas uma sacola cheia de tristeza porque meu povo nunca será livre.

@pauloandel

Tuesday, May 08, 2018

desire days

humm la noche é tão
longa
eu só te peço mais
uma vez
desire days
desire days

cada passo em falso
é onda
um estrondo no
carnaval
velhas cenas que
atordoam
desire days
desire days

amanhã não sei
da vida
o outro irrita e
ignora
eu carrego minha
mochila
e vou embora
e vou à vida:
desire days!

microcausos

I

tudo estava muito claro nas entrelinhas do que eu não disse. 

II

nos silêncios que entrecortavam a amigável conversa, habitavam os desejos mais profundos.

III

era melhor beber uma dose miserável de pinga na manhã decadente do que degustar um copo de cólera num dia de falso sucesso.

IV

nunca seremos tão livres quanto nossos próprios sonhos.

Monday, May 07, 2018

quatro a.m.

São quatro da manhã da madrugada mais chata de se ter insônia em qualquer semana. Despertei, ouvi Herva Doce, Marina e Marillion - pensando nos fãs que discutem as eras H e Fish, quando acho lógico que as duas são muito importantes. Há pouquíssimos ruídos em casa e nas ruas, alguns carros, talvez um caminhão, a madrugada amedronta. O Fluminense venceu, os pela-sacos reclamam, há algo de doentio nisso. Tenho insônia e penso em coisas impublicáveis. Subitamente me recordo de quando eu era um garoto de dezessete anos, e tinha de atravessar Copacabana inteira a pé às cinco da matina para chegar ao quartel - ficar horas e horas em pé à toa, até que fui libertado para sempre. Contas a pagar, contas a fazer, medo, incerteza, reflexão, tudo está insone em cima de uma cama confortável no coração desta cidade linda, mas cruel. Tomo remédios para pressão, falo com minha mulher, dou bom dia e sonho com mais duas horas de sono. Agora um carro buzina perto do aterrorizante prédio abandonado do IML. Agora recebo duas mensagens no computador de mão. Agora tenho dez livros inéditos prontos. Agora penso em mais coisas impublicáveis. Ah, sono, o que te faz tão longe de mim? Eu te queria bem aqui. 

Saturday, May 05, 2018

amor em si

amor, um carrossel 
uma noite de pés 
descalços
aos pés do atlântico sul
azulzinho o amor ou gris
também 

amor de parabenizar
e sorver
amor para conquistar 
sem saber
amor de silêncios 
e discretas entrelinhas

o que não diz seu nome
mas cochicha num verso

ah, o amor enrustido
represado, talvez adiado
ou quem sabe redivivo? 

amor que choca e apraz
amor que trai por amor
fugaz
ou imperial no mar da
tranquilidade na 
lua

o amor que não vai dar 
cris
nem incendiar a tez
o tesão sem chama 
acesa
o filme queimado
o recado no vácuo

o amor na doce voz
de dulce quental
nos versos errantes
de clarisse
por um triz
ou num vértice
cheio de perigos

o amor de bossa nova
também pode ser blues
boy ou quem sabe um
beatnik? 

na estrada
na farsa recatada
no viço lancinante dos
desejos ou
fresado e triste
um amor em contraste
um errrante
um cavalo de corrida
ou águia solitária 
em voo rasante 
sem esperar quase
nada

o amor na foto, na letra
no beijo que desaconteceu
nas flores que inexistem
nos olhares enviesados 
nos vãos da escada
nas memórias
o amor que não se entende
e sequer tem explicações
mas resiste e impregna 
o ar
feito incenso cujo aroma 
não se esquece

amor, um colapso
um beijo em terra 
batida
coração de hiato
o amor numa palavra 
ou até numa frase 
sem sentido 
o gosto que se sente
o sonho que prevalece
corações a mil por qualquer
romance
o grande lance é o amor em si

@pauloandel 

Thursday, May 03, 2018

aranha de vidro

renatinha viu uma aranha - de vidro! - no teto e gritou loucamente enquanto jogávamos mau-mau e e eram servidas duas carreiras de cocaína à mesa - ela não tinha nada a ver com o pó, nem eu -, até que a acudimos e ficou tudo bem entre gargalhadas da pós-adolescência. a casa era muito louca, mas sóbria também. todas as tardes nos encontrávamos e havia turmas diferentes: a do metal, a do pop, a do futebol, a de qualquer coisa. renatinha era muito linda e, por isso, o luiz ficou muito louco por ela também, em todos os sentidos. depois eles saíam no carro em direção a são conrado ou outro bairro com ruas de natureza, conversavam, a paixão não era recíproca e o nosso amigo gordinho voltava um tanto desapontado para o carteado, depois de tê-la deixado em casa, bem perto da gente. luiz fugiu de casa aos oito anos de idade e se escondeu na sala da minha casa, enquanto minha mãe dizia que ele tinha que voltar para não deixar seus pais preocupados. ele a chamava de tia, a adorava e disse que, se pudesse, moraria conosco - não dava. na última vez em que nos encontramos, trocamos um longo abraço e choramos: seu pai havia falecido dias antes. dois anos depois, eu abri a porta de casa e encontrei minha mãe em lágrimas. ela tinha ido a copacabana e soube que o luiz havia sido enterrado na semana anterior. era uma noite de quinta-feira, às sete da noite e eu não consegui dormir até o dia seguinte. às vezes encontro com o luiz em pensamentos, lembranças ou quando escrevo sobre ele. muitas vezes eu penso que aqueles dias da aranha de vidro no teto eram os mais felizes da minha vida e de muitos dos que estavam lá, num velho apartamento que tinha cara de junkie - cuja janela da casa permitia ver a artéria aorta de copacabana -, mas que na verdade exalava amor - nós éramos pobres garotos felizes e sonhávamos com um país completamente diferente de toda essa merda que aí está. queríamos nossos jogos, nossas tardes de conversa, nossos amores que voaram pelo vento, nossas músicas e, sinceramente, ninguém falava de dinheiro: apenas de ingressos e bares. 

@pauloandel

Tuesday, May 01, 2018

primeiro de maio

em speito a todos os trabalhadores
e sua avassaladora maioria
de explorados, oprimidos
massacrados

os que choram todas as noites
por não dispor de um salário
mínimo sequer

os que vagam pelas ruas
entre o torpor e a desesperança

os esmagados, sufocados, ignorados
por um golpe vil e leviano

homens e mulheres, jovens e velhos
veteranos e absolutamente
iniciantes
esmaecidos ou brilhantes

amontoados em senzalas modernas

pelo direito supremo de comer
um lanche modesto
por dia

enquanto senhores de engenho
pensam em viagens, piscinas, iates
e veem o outro como um fardo
uma cena desprezível e torta
uma gentalha que devia realizar
trabalhos forçados e só

em memória de milhões de pessoas
mais maltratadas do que o gado
nas gares, nas vias, nas calçadas
enquanto gira a roda da fortuna
que será de muito poucos

em respeito aos milhões de humildes
que tentam vender seu único bem:
a força de trabalho
em troca de moedinhas e pão
e refrescos baratos
e humilhantes ônibus lotados
e enterros em covas rasas
fora do palco central

e dormem em barracos e casas
improvisadas enquanto o fogo do ódio esvazia todas as almas

e os corpos se decompõem
a céu aberto e pátria livre - o quê?

em respeito e memória a todos
os trabalhadores que vivem a dor
a depressão: vassalos
contemporâneos
desesperados ou até alienados
esperando o divino deus
do mercado
e sua generosidade que nunca se viu:
até quando haverá tanta
criminosa ingenuidade?

até quando o fingimento acortinará
a devastação e o rancor?

até quando a morte será celebrada em troca de terrenos livres, investimentos corporativos e pontos em bolsas?

não se pode esquecer dos bons patrões
que vão além de covardes exploradores:
quando existem, são bem-vindos
- o que lhes sabota é a raridade!

em respeito a apreço a milhões de brasileiros que diariamente entregam suas vidas, esforços e saúde

para sobreviver com mínima
dignidade
e se esgueiram
do desprezo
do ódio de classes
da ruindade em carne viva
da desumanidade
da desumanidade
da indiferença

a sociedade é uma grande senzala
enquanto navios negreiros da morte
correm em rios de asfalto
e janelas gradeadas

não há vagas: apenas
cochos

@pauloandel

Monday, April 30, 2018

a grande farsa

estes são os dias selvagens
sem esperança
onde os humildes padecem
e os fracos são covardes

sorrisos de solidão
declarações sobre o vazio
sucessos cheios de ninguém
e grandes amores 
de aparência 

os traidores são a vitória
os mesquinhos falsos, medíocres
celebram a conquista do nada
o desimportante é a celebração

estes são dias terríveis
onde a maldade amedronta
e o egoísmo vil é fascinante: 
a república dos hipócritas

ódio e vingança simulam justiça
prepotência quer dizer sucesso
indiferença se faz de elegância
ordem e progresso: a grande farsa! 

@pauloandel