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Monday, October 14, 2024

Partime

Quando eu era criança, esse letreiro era a primeira coisa que me passava na cabeça quando crescesse: era um lugar onde os adultos conseguiam empregos. E foi assim por muitos e muitos anos, mesmo depois que fiquei adulto e comecei a trabalhar. Perto deste endereço eu fiz um de meus estágios, há 32 anos, na Firjan. E perto também, há um ótimo restaurante há muitos anos, que hoje se chama Caló(geras). 

Hoje resolvi almoçar justamente no Caló. Vou lá de tempos em tempos. Peguei o VLT. Antes, achei graça porque uma menininha correu para apertar o botão da porta, crianças adoram botões. Saltei na Antônio Carlos. Já tinha me deparado com os restos do letreiro muitas vezes, mas somente hoje resolvi fotografar. 

A loja está fechada há anos. O lugar dos empregos acabou. Os empregos estão acabando também. A cidade está sempre com cara de feriado, meio vazia. Nas esquinas, as piadas foram trocadas por olhares perdidos. Qualquer coisa é motivo para agressões, tiros, assassinatos. Ódio. Ódio.

Eu era criança e pensava: tenho que conseguir um emprego para ajudar meus pais. Deu certo por uns dez anos, até que eles se foram. Continuo trabalhando, as dívidas são as mesmas mas não preciso botar roupas sóbrias, ando de chinelões e me livrei da tortura mensal de viagens de avião. Para alguns colegas de faculdade, deixar a carreira de origem para virar camelô de livros é um fracasso supremo, mas cada um só vê o que sua acuidade permite - e desconfio que alguns não têm coragem de trocar dinheiro pela serenidade. De chinelos, quando chego num grupo, eu ainda dou as cartas - exceto quando sou sabotado. 

E justamente por ser um camelô de livros é que eu posso almoçar às três da tarde, me deparando antes com lembranças marcantes de criança. O letreiro da Esso já não existe mais, agora é o prédio do Ibmec, foi melhor assim. 

Ali pertinho, a uns 30 metros, sobrevive a Casa Vilarino. Só pelo fato de ter sido o lugar do primeiro encontro de Vinicius de Moraes com Tom Jobim, é um palco consagrado. Imagine as conversas boêmias dos anos 1940 e 1950. 

Saio do Caló, desço a Santa Luzia e meus chinelões me levam para o Metrô, sentido Copacabana. Meu caminho pelo mundo eu mesmo traço, ou rabisco para digitar.



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