Sunday, July 02, 2023

Mar

Podem falar o que quiserem de ruim, mas Copacabana não é para amadores. Você tem que vir das divisões de base já pronto para ser titular. E até hoje Copacabana tem seu playground para todos, que é a praia. Hoje em dia é preciso ter cuidado, especialmente à noite, mas a praia é o grande polo democrático que reúne tudo: gatinhas, marombeiros, coroas, crianças, gordos e magros, gays pra todo lado, sapatões deliciosas, saudáveis desocupados e o resto da fauna copacabanensis.

Geralmente eu estava ou jogando botão na casa do Luiz ou ouvindo discos na casa do Fred. Depois, quando passei a ter aula noturna na faculdade, o lazer diminuiu. E uma ou duas vezes por semana, eu ia para a praia à noite. Às vezes tinha uma garota, muitas vezes era sozinho. Eu e minha relação com o mar. Molhava o pé na beira, sentava no banco de areia, apreciava o horizonte infinito do Atlântico Sul. Tudo escuro e infinito, tudo cheio de silêncio e misterios. Tinha alguma coisa de charme, outra de medo, outra mórbida. Eu, que gosto tanto de lá, sempre pensava no que teria depois do infinito. Tanto silêncio e poucas respostas. 

Quando é cedo, em dia de tempo bom, o mar se destaca pela sua beleza e cores. Tarde, pelo mistério. Sempre foi assim. Para muita gente, fui um privilegiado por ter vivido 25 anos perto do mar e é verdade mesmo. Sempre me comovo com a emoção de pessoas do interior ao verem o mar pela primeira vez, dando-lhe o devido valor que eu nem sempre pude por tê-lo sempre ao lado. Hoje ele me faz muita falta. Há anos tenho vivido noites difíceis e, se o mar estivesse perto, era só descer, caminhar um pouco e me deparar com sua grandeza. Aliviaria alguma coisa com certeza. 

Até 1988 a praia não tinha luz noturna. Só o Juventus tinha luz própria para treinos e jogos. Aí veio a grande obra e a praia de Copacabana ficou toda iluminada. A imagem era bonita demais. Lembro que eu estava voltando de Arraial do Cabo, da casa do Henrique, com ele, a Ana e não sei se Xuru ou Pedro também. Viemos até Niterói, pegamos a barca e, a seguir, fomos da Praça XV para Copa. Era o começo da tarde e combinamos de nos encontrar para ver a nova praia cheia de luz. Foi uma noite muito bonita, depois lanchamos no Bob's. Pra mim, 1988 era um grande ano por vários motivos, até hoje me lembro. Bom, deixa pra lá. 

Infelizmente os perigos de hoje são muito maiores. Naquele tempo, o máximo que acontecia era sair na porrada com o ladrão - nós, garotos de 18 ou 20 anos, cheios de energia, não éramos fáceis. Agora é diferente: qualquer coisa tem facada no peito, degola e horror. Não era pra ser assim, bastava o ser humano ser humano de verdade, mas não aconteceu e só piorou. Mesmo assim, dia desses eu quero voltar à beira do mar de Copacabana. Rever aquela atmosfera de silêncio, mistérios e o verdadeiro ballet da morte. Procurar no horizonte pelo desconhecido, lembrar de tudo que passou, sonhar com dias de generosidade em vez de esmola e, definitivamente, tentar entender porque aquele ambiente da natureza litoral tem tanto a ver comigo, a ponto de mantê-lo intacto na memória pelos últimos 35 ou 40 anos.

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