Wednesday, November 16, 2022

Isabel

Os mais jovens talvez não saibam, mas as garotas do vôlei dos anos 1980 eram de arrepiar. Foi o tempo em que o Brasil descobriu um novo esporte para se apaixonar. E o Rio era vôlei pra todo lado. 

Jogadoras como Dulce, Vera Mossa, Regina Uchôa, Jacqueline, Sandra, Ida, Helga e Heloísa eram o hit esportivo. Claro, Isabel era a líder, a musa, a falante, a garota cheia de atitude mesmo, um símbolo da cidade. 

Jogou demais, até grávida. Foi um ícone da Seleção. Jogou na areia. Treinou. Discutiu com cartolas e treinadores, se rebelou, foi punida, recorreu. Bateu em bandido na rua. A imprensa adorava sua franqueza para todos os assuntos e ela não deixava barato. Aos poucos, formou sua própria família de campeões mundiais, seus filhos. 

Minha última lembrança de Isabel ao vivo foi pouco antes da pandemia, num evento político na ABI. Casa lotada, ela e uma de suas filhas, as duas incrivelmente incógnitas na multidão. Pensei em amolar, não fui. Ligaram um telão, então ela se deitou no chão e colocou a bolsa/mochila como travesseiro. Não tinha jeito: eterno perfil da jogadora descansando em quadra. O Pipo estava comigo, desceu e subiu oito andares pra buscar uma cerveja, me deu e fiquei pensando: "Apesar de toda a tragédia que estamos vivendo, a vida é isso". Isabel deitada de bobeira, Pipo com sua cerveja, as pessoas lutando contra o caos golpista do Brasil. 

Não amolei Isabel, achei que teria muitas outras vezes. Ela era das nossas, sempre na rua, sempre acessível. Saber de sua morte em pleno voo, ainda com muito a fazer, dói na alma. Aos 62 anos, ela ainda tinha aquele ar de garota carioca, com atitude, que Fausto Fawcett escreveu tão bem: "suingue sangue bom". Todo mundo perde: o Brasil, o Rio, o esporte. Aquelas tardes incríveis da zona sul dos anos 1980. A juventude madura ainda com muitas partidas a disputar. 

Ela era do barulho.

@pauloandel

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