Sunday, February 25, 2018

amor mora

onde mora o meu amor
além dos silêncios
e desencontros 
ou em palavras que
nunca são ditas? 

perdido entre hiatos
náufrago da distância
retrato de natureza 
morta

ah, o meu amor
escondido em prateleiras
e postagens
insignificantes
ou em versos de 
passos tortos
claudicantes de 
um bêbado admirável 

ele estende as mãos 
de paixão
e pede esmolas 
debaixo duma marquise
numa grande avenida 
central

o meu amor anda sozinho
por ruas perigosas
e não dá bom dia 
a estranhos

não dorme mas sonha
e espera o impossível 
na próxima esquina

ele mora longe, longe 
sem palavras

o meu amor está falido
em portas arriadas
cadeados fechados
e placas de aluga-se

há poesia em vão
escorrendo entre corações
de peitos vazios
e memórias desperdiçadas

o meu amor tão sozinho
esperando o VLT
às oito horas na Rio Branco
enquanto famílias
felizes trazem os filhos
de mãos dadas

ou alguém olhando 
o antigo relógio da Mesbla
subindo a escada do metrô
na Cinelândia

o meu amor é um domingo
à noite
silencioso e fugidio
sem bares lotados 
e risos
sem um grito de campeão

o último pouso 
no Santos Dumont
enquanto a linda
comissária parece
tão indiferente ao fim
do expediente

o meu amor é um país 
destruído
é um féretro vazio
é um livro que não
foi lido

e mora tarde, tarde 

ele dá as costas 
e dá de ombros
para caminhar sozinho
na madrugada
na avenida chile
procurando a morte
num assalto covarde
 - ou celebrando a vida
sob escombros
no coração da grande 
cidade 

@pauloandel 

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