1
street song
era amor
porque não dependia
de corpo e rosto
e sexo mas sim
desejo de ter
perto
líquido e certo
era amor
porque vale
quanto versa
vale cada verso
e valerá
2
mãe
cada passo
dessa estrada
sem você ao lado
faz-se pena
perpétua
o passo
e pensar em você
cada passo
e a vida deságua
num vão
3
gata mansa
só sei do que te amo
porque qualquer
bobagem tua
me incendeia -
enxergo ouro
em terra
e tesão em sina
só pra te pensar
por perto
@pauloandel
Thursday, July 25, 2013
bomba
meu coração e uma
bomba
estilhaçada
explodida
as ruas tão frias
eis julho vivo e triste
em fotografias
para adornar jornais
e dizer da dor
dizer tanta dor
o frio vivo do Rio
peregrinos seguem Deus
nossa grande capital
mora em festa e flor
os mendigos e as frestas
nos viadutos e vãos
forças ocultas
e mãos dadas
enquanto o fracasso
faz sua aquarela
em branco e gris -
somos capital
somos capital
e ninguém sabe o nome
do próximo corpo
recolhido
na esquina
bomba
estilhaçada
explodida
as ruas tão frias
eis julho vivo e triste
em fotografias
para adornar jornais
e dizer da dor
dizer tanta dor
o frio vivo do Rio
peregrinos seguem Deus
nossa grande capital
mora em festa e flor
os mendigos e as frestas
nos viadutos e vãos
forças ocultas
e mãos dadas
enquanto o fracasso
faz sua aquarela
em branco e gris -
somos capital
somos capital
e ninguém sabe o nome
do próximo corpo
recolhido
na esquina
Wednesday, July 24, 2013
deuses
no fim das contas
somos todos religiões
queremos fazer crer
a nossa crença
mesmo que ela seja nada
e não vamos convencer
nem a nós mesmos
da certeza do que é certo
somos todos esperança
enquanto começo e meio
não viram fim nem sim
e o resto é só o resto:
vagas nuvens de sonho
muitas procissões
e um nó de aço no peito
@pauloandel
somos todos religiões
queremos fazer crer
a nossa crença
mesmo que ela seja nada
e não vamos convencer
nem a nós mesmos
da certeza do que é certo
somos todos esperança
enquanto começo e meio
não viram fim nem sim
e o resto é só o resto:
vagas nuvens de sonho
muitas procissões
e um nó de aço no peito
@pauloandel
as ruas
ah, que dor me corta o peito
uma aflição pelas horas do vir
agora que não somos nada
as ruas e seu gris inesgotável
uma dor que não cessa
faz-se viva sem o menor rancor
é que eu falo sobre o nada
é que eu falo sobre o nada
as ruas tão vivas e meu vazio
eis-me um punhado de nada
nunca mais voltei para casa
não revi meus amigos felizes
meu amor escorreu à pia
eu falo sobre o nada, o nada
minha poesia é torta e fria
um pesadelo me atordoa
e não sei dizer do que virá
mas o que importa nisso?
é que eu falo sobre o nada
é que eu falo sobre o nada
e as lágrimas num lençol
não oferecem arrepio
nossa avenida iluminada
e os mendigos sofrem tanto
eles se escondem em vãos
eles se escondem em vão
a dor é um tiro certeiro
que atravessa meu coração -
alguma coisa acontece
no pulmão da grande cidade
e ninguém vai perder tempo
se estou trucidado ao chão
@pauloandel
Tuesday, July 23, 2013
Festa
uau
que legal
parabéns para você
hoje é teu aniversário
e estás cada vez mais e mais
perto da morte oca
longe dos amores
estrangeiro em si mesmo
alienígena vil
mais um ano se passou
e quantos virão?
parabéns para você
que não aceita o caos
e sai no tapa com a injustiça
a vida é tão inútil
que diferença faz?
o ser humano é cobiça
e a tua burrice jamais
te permitirá entender
porque a vida tem que ter dor
que legal
parabéns para você
hoje é teu aniversário
e estás cada vez mais e mais
perto da morte oca
longe dos amores
estrangeiro em si mesmo
alienígena vil
mais um ano se passou
e quantos virão?
parabéns para você
que não aceita o caos
e sai no tapa com a injustiça
a vida é tão inútil
que diferença faz?
o ser humano é cobiça
e a tua burrice jamais
te permitirá entender
porque a vida tem que ter dor
um minuto de alegria?
onde fica?
onde moram os pais mortos?
onde estão os amigos desaparecidos?
a casa devastada?
quem mais caberá
em teu coração inchado?
um minuto de alegria
em plena solidão
um mar de gente grita
e ninguém percebe nada -
somos tão ocupados
que não temos gente a perder!
parabéns para você
que trocou a vida pela poesia
a crueldade pelo sonho
e se perdeu para sempre -
isso, se o sempre existir -
isso de se perder mesmo -
a gente nunca sabe direito
o que é ganhar ou perder
apenas gasta os dias
em busca de incertezas
inutilidades e pedaços
do que consideramos vida
parabéns para você
que é granada estilhada
satélite sem sistema
longe de tudo o que quis
e por isso mesmo
tão diferente dos mil
há muitas estrelas no céu
qual seria a diferença de mais uma?
onde fica?
onde moram os pais mortos?
onde estão os amigos desaparecidos?
a casa devastada?
quem mais caberá
em teu coração inchado?
um minuto de alegria
em plena solidão
um mar de gente grita
e ninguém percebe nada -
somos tão ocupados
que não temos gente a perder!
parabéns para você
que trocou a vida pela poesia
a crueldade pelo sonho
e se perdeu para sempre -
isso, se o sempre existir -
isso de se perder mesmo -
a gente nunca sabe direito
o que é ganhar ou perder
apenas gasta os dias
em busca de incertezas
inutilidades e pedaços
do que consideramos vida
parabéns para você
que é granada estilhada
satélite sem sistema
longe de tudo o que quis
e por isso mesmo
tão diferente dos mil
há muitas estrelas no céu
qual seria a diferença de mais uma?
só faz sentido se tivesse
a cor de uma estrela
que ninguém ainda viu
a cor de uma estrela
que ninguém ainda viu
parabéns para você
não há sorte alguma
esteja vivo e inútil
chore todo dia
diga o que tiver de dizer
ame e goze à toa
siga em frente rumo ao nada
e simplesmente não pense:
melhor viver
para ver
onde isso tudo
não vai dar
não há sorte alguma
esteja vivo e inútil
chore todo dia
diga o que tiver de dizer
ame e goze à toa
siga em frente rumo ao nada
e simplesmente não pense:
melhor viver
para ver
onde isso tudo
não vai dar
@pauloandel
The soul stations
we’re
the deep soul stations
and haven’t a fear
about any madness
sadness, sweetness -
we’re living
our feelings like
they said it so much -
they call love
to our lovely brains
they’re storms
and rest-in-pain
we’re
the mad soul stations
and july is saying bye
a strange kind
of disappearing
the deep soul stations
and haven’t a fear
about any madness
sadness, sweetness -
we’re living
our feelings like
they said it so much -
they call love
to our lovely brains
they’re storms
and rest-in-pain
we’re
the mad soul stations
and july is saying bye
a strange kind
of disappearing
@pauloandel
Monday, July 22, 2013
Uma canção para Copacabana
minha terra
fica onde o céu
e o inferno
beijam-se na boca
sem hora
para terminar
são ricos e pobres
mendigos e príncipes
gente a nascer
e outros que apenas
dizem adeus
mas ainda vivem
minha terra
tem dramas e risos
túneis e mares
afora uma beleza
de estrelas no céu -
e como brilham
se as estrelas
já morreram
o que importa?
só agora é que vemos
o grande espetáculo
das luzes
minha terra tem livros
flores, caprichos e luxúria
fantasia, religião
bichos-soltos, junkies
amigos e a impecável
maré de solidão
ela é meu norte
meu leme
e ainda me encanta:
quero teu amo
dá-me teu colo
Copacabana
@pauloandel
fica onde o céu
e o inferno
beijam-se na boca
sem hora
para terminar
são ricos e pobres
mendigos e príncipes
gente a nascer
e outros que apenas
dizem adeus
mas ainda vivem
minha terra
tem dramas e risos
túneis e mares
afora uma beleza
de estrelas no céu -
e como brilham
se as estrelas
já morreram
o que importa?
só agora é que vemos
o grande espetáculo
das luzes
minha terra tem livros
flores, caprichos e luxúria
fantasia, religião
bichos-soltos, junkies
amigos e a impecável
maré de solidão
ela é meu norte
meu leme
e ainda me encanta:
quero teu amo
dá-me teu colo
Copacabana
@pauloandel
Intransferível
a fascinante solidão
dos últimos dias de julho
introspecção
uma triste canção
e as pessoas ocupadas
atabalhoadas
na sala de conversar
então falam e fazem
trocam textos e dígitos
provocações?
nada disso!
é o mar da frivolidade
quando o horário
esgotar-se
vão correr com sobras
para um bar bonitinho
e vamos escutar bem
a voracidade do nada
mil tons e dicas
que vão significar nada
e viveremos bem assim
a fascinante solidão
dos dias de julho
é a mesma, mesma
de um ano inteiro:
apenas se protege
na melancolia
dos dias frios, cinzas
damos tanto valor
ao nada que sempre
fomos
@pauloandel
dos últimos dias de julho
introspecção
uma triste canção
e as pessoas ocupadas
atabalhoadas
na sala de conversar
então falam e fazem
trocam textos e dígitos
provocações?
nada disso!
é o mar da frivolidade
quando o horário
esgotar-se
vão correr com sobras
para um bar bonitinho
e vamos escutar bem
a voracidade do nada
mil tons e dicas
que vão significar nada
e viveremos bem assim
a fascinante solidão
dos dias de julho
é a mesma, mesma
de um ano inteiro:
apenas se protege
na melancolia
dos dias frios, cinzas
damos tanto valor
ao nada que sempre
fomos
@pauloandel
Saturday, July 20, 2013
dor
meu braço dói
e tem algo errado:
cuidado!
cuidado!
será morte ou cansaço?
ou a solidão
estúpida
meu sonho dói
o amor corrói
mas também conquista
e a dor tem pouca dor
por um instante chorei
sou desimportante
minha dor pequena
reflexo de pensamentos
inevitáveis e nenhuma
cor
e tem algo errado:
cuidado!
cuidado!
será morte ou cansaço?
ou a solidão
estúpida
meu sonho dói
o amor corrói
mas também conquista
e a dor tem pouca dor
por um instante chorei
sou desimportante
minha dor pequena
reflexo de pensamentos
inevitáveis e nenhuma
cor
democracia...
querem me falar
de democracia
e democracia
deixar as pessoas
morrendo faz parte
da democracia
as garotas estupradas
por bandidos
de comandos ou
batalhões
os mendigos nas
marquises e os
meninos de cola
os errantes
sem rumo
os cruéis os burros
os falsos doutores
os patrões pilantras
e maus empregados
são também
democracia
os grandes jornais
as corporações
a copa do mundo
a copa do nada
fingem ser
democracia
e o que você vê
no meu autoritarismo
faz-se a tua miopia:
meu negócio vem
derrubar hipocrisias
@pauloandel
Tati
Algo
em torno de seis e meia da tarde e Sônia me ligou, apenas para avisar que
estamos a caminho. Jovem, louca, mansa, delicada e deliciosa em seus vinte e
poucos anos, eu tento entender o que ela quer de mim além de sexo intenso de
cortar feito adaga. Temos vivido assim há alguns meses e é naturalmente
divertido: quando você tem cinquenta anos, não tem o direito de ser hipócrita
em negar o prazer que sente de um jovem com a metade da tua idade em qualquer
cama que se preze. Ou no banco de ônibus numa viagem. Ou na escada do prédio,
feito fosse um adolescente. Tudo seria perfeito se não existisse na minha vida
um problema chamado Tati, que ficará claro adiante. Ninguém da Tijuca precisa
saber.
Sete
da noite, o interfone toca, o porteiro com português de difícil compreensão
acena e avisa que dona Sônia está subindo. Acho graça dos tratamentos que as
convenções exigem: é Sônia e ponto. Abro a porta, trocamos um beijo de boas
vindas, momento de trocar o inferno pelo céu e virá-lo do avesso várias vezes.
E nem dá tanto tempo para esperamos qualquer coisa além de tirar roupas e
trocar carinhos diversos – afinal, esse era o objetivo mesmo. Agora que posso
ter horas mais longas, longe da confusão da delegacia e do transtorno de anos,
o que mais tenho pensado é em tudo o que não havia por lá: livros, discos,
versos, mar, futebol, sexo. Mas tudo isso tem um ponto e vírgula: Tati. Tudo o
que penso dela desafia o conservadorismo tijucano.
Rapidamente
Sônia está nua, nos abraçamos, fazemos sexo enlouquecedor – sejamos claros: é
fuder loucamente, ora! O telefone toca uma ou duas vezes, ela ri, eu lembro dos
tempos da polícia onde o tilintar do aparelho poderia ser a diferença entre a
vida e a morte de alguém, resolvo atender, ela ri da paralisação. Para minha
surpresa, um ponto e vírgula do outro lado da linha: Tati. Todo Superman tem a
kriptonita que merece.
Conhecemo-nos
anos atrás, eu e Tati, aqui Tatiana, por intermédio de uma amiga num tempo
breve de faculdade e, na primeira noite que a vi, fiquei louco por ela: soube
que dançava e lia, que gostava de versos e parecia tão delicada que tudo lhe
dava ares de tesão e charme. Estava acompanhada na primeira noite,
respeitosamente admirei de longe. Não sei como, mais tarde trocamos telefones,
e-mails, passamos a nos corresponder, fomos amigos ao longe, continuamos sendo,
ela tem um romance, eu tenho outros, mas sempre a desejei e penso nela a todo
instante nua em todas as possibilidades que minha boca permite. Nunca lhe falei
sobre o tesão imenso que ela me desperta. Alguém me disse que quando eu casasse
isso passaria, mas casei duas vezes, desfiz, contratei garotas de programa,
chamei garotas de bate-papo virtual, comi cem mulheres e nada faz cessar o
tesão oceânico que tenho pela Tati – e não é só tesão em sexo, é tesão de tudo:
brincar, namorar, conversar, dividir espaços, silêncios, tudo o que for. E
beijo. E beijo e beijo e beijos até os lábios incharem e se avermelharem de vez
– alguém fará piada comigo seu eu sair à rua, dizendo que pareço Boris Casoy de
batom. O que dizer dos dela, saltados e provocantes entre as coxas? Só de ouvir
sua voz delicada já penso em aterrissar nas estrelas, com todo o ridículo
nisso. Não era nada de mais: coisas de seu trabalho, pediu apenas uma
orientação, queria saber como eu estava, não deixei que Sônia percebesse nada,
fui um completo canalha naquilo que é a única coisa que justifica a canalhice –
o amor.
Sônia
está nua, paciente e desejosa em seu corpo quente e cheio de saliências
convidativas. Como posso ser um velho tão idiota a ponto de navegar naquela catedral
de carne quente e ficar a pensar em outra mulher que nunca sequer beijei? Logo eu que já fui o rei das estagiárias na
delegacia, o bambambã de certas noites suburbanas, o algoz dos namorados que
não sabem acariciar uma mulher como devido.
O
fim da vida está me reservando bobagens da adolescência? Ou é simplesmente
aquilo que chamam amor?
O
que me resta é navegar, beijar, chupar, penetrar, Sônia tem uma satisfação
enorme e tão visível em berço líquido que me desfaço e também rio, pelo prazer
de proporcionar prazer. Bebemos vinho em nossas peles como se fôssemos
discípulos de Baco – somos mesmo! Mas acontece que eu sou um perfeito idiota: o
meu corpo está misturando nas carnes daquela deliciosa mulher e eu só penso em
outra, outra – algo que se repete há anos e me tira do sério, já que isso
supostamente “coisa de mulher” – ou será coisa de amor? – eu não sei dizer. Em
vias de gozo e prazer cumprido, eu só penso em Tati, o quanto seria bom estar ao
seu lado, namorá-la, recitar-lhe pequenas sacanagens ao pé do ouvido ou algum
dos poemas que já escrevi em sua homenagem – na verdade foram dezenas – se um
dia escrever um livro, eu a ponho com personagem. Para piorar, Tati namora um
sujeito chamado Francis, que é a apoteose da mediocridade em pessoa: jamais
será capaz de lhe proporcionar os carinhos e os sestros que só eu sei conduzir
e dizer vida afora. Não conhece os poetas, não sabe dos versos, nem desconfia
do que desenho todos os dias. Deuses do céu, como posso ter esse comportamento
tão imaturo e, ao mesmo tempo, maravilhoso?
Sônia
está nua e linda, deitada em nosso berço esplêndido e encostada com a cabeça em
meu peito cheio de desejo por outra mulher que quase nunca vi, muito li e
sempre sonhei. Trocamos beijos, somos apaixonados desconhecidos, dois
animaizinhos em ritmo de foda a mil. Ela parece feliz e me pergunto se há um
homem em sua vida que lhe signifique o que Tati é para mim: pedra, flor e
espinho. Hoje é sexta e o dia já vai dizer adeus. Sinto-me bem com o delicado
corpo de mulher que se esfrega em mim, mas meu sonho e pensamento clamam pelo
corpo de Tati. Sônia é meu prazer e me faz tão bem, mas eu não consigo deixar
de pensar em Tati. Tenho sonhos eróticos com ela constantemente, penso nela
quando transo com outras mulheres, lembro dela quando vejo casais de namorados
felizes em mãos dadas nas areias do Leme. Meus amigos dizem que sou um sortudo
com as mulheres e eu choro nas noites solitárias de julho por causa de Tati –
faltam me bater quando falo disso. E pensar nos criminosos que já me viram como
carrasco nos momentos necessários: eles nunca sonhariam no quanto eu sofro
feito um tolo por causa de algo que parece tão tesão, tão corpo e provocação
mas não passa de um amor que atravessa paradigmas e beija o surrealismo na boca
até dizer chega.
Eu
e Sônia tomamos um banho frio e namoramos sob a água da ducha que se faz
cachoeira. Ela se veste rápido para não perder o ônibus na Conde de Bonfim. Ganhamos
as ruas da Tijuca. Quando a deixo no ponto, sou capaz de pensar mil coisas. Trocamos
um beijo de quatro estações, ela sorri e diz que já volta. Olho as ruas quase
desertas. É uma sexta-feira e as pessoas estão namorando felizes. Tenho ódio de
pensar em Tati nua nos braços de Francis e choro. O que me resta é fechar as
cortinas do dia na casa de amigas felizes e queridas, brindando com mais vinhos
em Copacabana. Tomo um táxi. Sou um idiota: eu devia pensar tudo em Sônia, mas
só enxergo Tati.
Somos
todos discípulos de Baco, mas o que realmente procuramos estampado nos céus são
sinais de amor – exatamente o que vejo quando penso numa estrela e vejo Tati.
Passam os meses, os anos e eu penso em Tati. Passam céus e infernos e eu penso
em Tati. Ela é uma bailarina jovem e linda e eu não tenho mais crimes a
combater. Eu devia estar feliz porque eu tenho Sônia, os amigos me elogiam, a
Tijuca é a mansão do idílio, mas sei que toda a minha felicidade mora nos seios
de Tati, seu colo, suas coxas, morder-lhe da nuca ao calcanhar, do pescoço aos
pés. Quero vê-la dançando numa perto do mar de Ipanema como Isadora Duncan fez
certa vez. Quero cada passo do seu corpo, dos seus encantos, como se a
fagocitasse por completo, namorar seus olhinhos infantis e misturar todos os
carinhos à putaria. Ela é jovem e linda, ela baila cada vez mais linda e eu sou
apenas um pobre amador – é que Sônia me manda um torpedo pelo telefone.
Saudades
do velho oeste na delegacia.
Da
próxima parada não sei dizer.
@pauloandel
baseado
em fatos surreais
Histórias reais (true stories)
voo sobre o
horizonte
quando as
cordas e sopros luzirem
lá estará ela em pleno voo
os mistérios, as sombras, a cor
tudo se fará noites e dias claros
o luar será apoteose e vitória
nenhum sino há de dobrar à toa:
a bailarina e o doce flanar no ar
um delicado exercício de amor
lá estará ela em pleno voo
os mistérios, as sombras, a cor
tudo se fará noites e dias claros
o luar será apoteose e vitória
nenhum sino há de dobrar à toa:
a bailarina e o doce flanar no ar
um delicado exercício de amor
uma outra
canção
se você
deixar
eu cantar em teus ouvidos
uma outra canção
prometo e atesto
que ela vai ser de arrepiar:
vai ter zum-zum
versos doces
e tom de colher amor
posso cantar em ti
pertinho, colado
e navegar tua pele
como desbravador?
eu só quero cantar
um outra canção:
a que eu não pude
não tive chance
e que parece âmbar
ao que pensamos
eu cantar em teus ouvidos
uma outra canção
prometo e atesto
que ela vai ser de arrepiar:
vai ter zum-zum
versos doces
e tom de colher amor
posso cantar em ti
pertinho, colado
e navegar tua pele
como desbravador?
eu só quero cantar
um outra canção:
a que eu não pude
não tive chance
e que parece âmbar
ao que pensamos
amanhã
serei meu
muro de Berlim
serei minha faixa de Gaza
pensarei em dois mundos
importantes e delicados
meu amor ao lado
meu amor ao longe
meu amor à vista
serei multidão e retrato
a ribalta e o gramado
uma peça, uma prosa, um calado
mil coros de nossa torcida
as cartas que só nós lemos
meu coração vai ser foguete
ansiando o espaço sideral -
meu amor em todo, em partes
meu pensamento é pecado -
e, por isso, tão desejado
serei minha nova ordem
querendo o querer de sempre
serei meu muro de Berlim
mas acontece que já sei
onde fica o lado que me apraz -
ele é longe, longe
mas se deixarem eu passo
atravesso um deserto do Saara
em dedos a estalar – no ato!
serei minha faixa de Gaza
pensarei em dois mundos
importantes e delicados
meu amor ao lado
meu amor ao longe
meu amor à vista
serei multidão e retrato
a ribalta e o gramado
uma peça, uma prosa, um calado
mil coros de nossa torcida
as cartas que só nós lemos
meu coração vai ser foguete
ansiando o espaço sideral -
meu amor em todo, em partes
meu pensamento é pecado -
e, por isso, tão desejado
serei minha nova ordem
querendo o querer de sempre
serei meu muro de Berlim
mas acontece que já sei
onde fica o lado que me apraz -
ele é longe, longe
mas se deixarem eu passo
atravesso um deserto do Saara
em dedos a estalar – no ato!
@pauloandel
Friday, July 19, 2013
A tua vida
o fascinante está
em perceber
que eu sou nada
do que você sempre quis
em perceber
que eu sou nada
do que você sempre quis
eis-me tua vida
hiperbólica, desgovernada
catando cavaco
botando o nunca
em volta do sim
hiperbólica, desgovernada
catando cavaco
botando o nunca
em volta do sim
mas é que tudo muda
mesmo com medo
e o que vale e o alguém
a te levar aos céus
a dar- se em flores vis
num jardim só pra ti
mesmo com medo
e o que vale e o alguém
a te levar aos céus
a dar- se em flores vis
num jardim só pra ti
pois não sou nada
do que você sempre quis
eis-me tua vida
em rosas celestes
e lua escarlate
eis-me verdade tão longe do fim
o que me importa
é ficarmos em mim
ah, sim!
@pauloandel
Thursday, July 18, 2013
Mantras urbanos
não existe amor em julho
longe, longe
eu sou tão longe
bem longe
do que gostaria
mas ainda e bom
tem algo de doce
rascante e bom
do meu lado
não está
quem eu tanto queria
mas ainda ha um bom
uma réstia opaca
de sonho bom
e muitos outros sonhos
dormem para sempre:
cortes, marcas, talhos
terrores ao ventre
mas ainda assim e bom
o mundo e um instante
uma virgula e um porém
mortos-vivos comemoram
nas grandes corporações -
meu amor não dorme
e nem me sonha mas ri
mesmo que seja a toa -
sou tão estrangeiro
numa terra de ninguém
mas persigo a esmola
do que ainda e bom
ainda quero ver Deus antes do fim
ainda quero ver Deus antes do fim
antes dos garotos rirem abraçados
de volta a uma velha casa de cinza
antes de qualquer pátria mofada
não existe amor em julho
a vida é um sopro, um predicado
feito a dança firme duma bailarina
esbelta e linda em seu melhor voo
o voo flamejante de uma linda mulher
uma criança à mansa, apaixonante
e seus delicados olhos de ágata
fazendo da balada um blues
e o Rio acorda em cor de gris
enquanto a beleza de Monte
grita e pula por um bis - e tris!
não existe amor em julho
mas velhos camaradas riem
do caos exposto e rico
numa távola quadrada
e isso parece algo bom
estou longe de casa
sou conversa de taverna
alguma coisa acontece
em meu distante coração
quando vê ao norte
uma garota num trem da central
uma bandeira de amor
um carnaval em febre total
para acender em meu peito
agora a gare fechou
o povo dormiu mas não sonhou -
não existe amor em julho! -
mas estupidamente
acerto os passos que nascem
eu acredito na próxima parada
na próxima esquina
e qualquer sentimento trocado
que me ofereça um punhado
minuto a minuto onde se erga
qualquer momento bom
as crianças estão bem crescidas
o hall de espera e uma festa
então desacontecemos:
somos felizes demais num segundo
e não existe amor em julho
não existe amor em julho
não existe amor
em
julho
Sobre as obras de Criolo, Marina Lima e Oscar Niemeyer
pra marina, fernanda, flavão, max, nelsim, fábio, ana paula, zeh e meu avatar predileto
o avatar do avatar
você mil vezes
e meu coração que sangra
minha desconhecida
eu queria tirar teu véu
em mil e uma noites
na arábia de Copacabana
você mil vezes
e meus olhos te perseguem
sem rumo discreto
desesperados
eu não sei dizer do meu amor
o que choro não é pecado
somos desconhecidos demais
e alguma coisa estranha
me faz perseguir teu olhar
duas mil e quinhentas noites
eu não sou teu avatar
nenhum androide à tela
faço minha religião inútil
enquanto versos rasos rugem
numa canção do teu amor
numa canção do teu amor -
eu sou carne viva e te venero
eu sou um mantra urbano
e te namoro ao longe, longe
feito uma outra canção -
não traio meus pactos, não
mas acontece que eu não sei dizer
quando você é minha contramão -
o avatar do avatar é a verdade
é a mais perfeita sedução
fernanda II
ninguém se permite
ser muito triste
quando tem a fé
na tua companhia -
o pecado é apenas
de quem não te vê
a nossa turma aplaude
o que você participa
rimos, choramos, vivemos
nossa melhor ironia
@pauloandel
Wednesday, July 17, 2013
Azul
o que vai ser
do meu azul
nessa aquarela?
qual vai ser o tom?
a luz? vai ter gás?
será que esse azul
vai pintar meu céu?
e quem sabe desse azul
dar em mar e juntar-se
a um verde qualquer -
talvez psicodélico
um fora-da-ordem
um down-by-law?
o que vai ser
do meu azul
no fim do céu -
isso se o céu tem fim -
quando encontrar
o cinza, o preto
as cores da morte
se tudo o que temos agora
é um punhado
de vida à desordem?
o meu azul sem conforto
ainda há de voar longe
até onde não vai poder
ter vista alguma ao léu
@pauloandel
Vândalo (por Marcus Vinicius Caldeira)
Vândalo não é quem joga pedra nas câmaras e assembleias prostituídas
Verdadeiros antros de baixarias e corruptelas com dinheiro alheio
Vândalo é quem faz parte dessas câmaras e assembleias constituídas
Que corrompe, é corrompido e enriquece sem receio
Vândalo não é quem joga pedra na vidraça do banco
Onde tubarões ganham milhões com a poupança do trabalhador
Vândalo é o sistema financeiro que especula sem dor
Trai, corrompe, mata o salário sem nenhum pudor
Vândalo não é quem joga pedra na vidraça da igreja
Que há anos explora o medo que o homem tem da morte
Vândalo é quem promete o paraíso e no além-túmulo toda sorte
Claro! Desde que siga seus ditos e contribua com algum porte
Vândalo não é quem joga pedra no muro da emissora
Verdadeira manipuladora dos sonhos da população
Vândalo é quem da benesse da ditadura cresceu promissora
Quem mente, distorce, enriquece e se aproveita da burrice da nação
Vândalo não é o trabalhador que em greve fecha a fábrica
Que deveria somente produzir o necessário à sobrevivência
Vândalo é o industrial burguês, o dono da máquina que não dá assistência
Explorador do trabalho do homem em troca de mais conveniência
Não! O brasileiro que saiu pra protestar,
Pra xingar, quebrar, bradar e sem medo de apanhar
Este não é vândalo, é gente nua
Que ante aos corruptos, de joelhos não se curva
Vem pra rua!
Vândalo é que aquele que jogou esta nação no limbo
Que faz festa em Paris com o dinheiro que não é seu
Que compra deputado para votar no que não é meu
Que entregou nossas riquezas a quem nunca pertenceu
Sim, na ótica deles, sou um vândalo e me perdoe, sou irascível
Não admito e não faço parte dos tolos
O vândalo é aquele que corrompe e se corrompe de forma incrível
Passou da hora:
“Fora todos”
@mvinicaldeira
Verdadeiros antros de baixarias e corruptelas com dinheiro alheio
Vândalo é quem faz parte dessas câmaras e assembleias constituídas
Que corrompe, é corrompido e enriquece sem receio
Vândalo não é quem joga pedra na vidraça do banco
Onde tubarões ganham milhões com a poupança do trabalhador
Vândalo é o sistema financeiro que especula sem dor
Trai, corrompe, mata o salário sem nenhum pudor
Vândalo não é quem joga pedra na vidraça da igreja
Que há anos explora o medo que o homem tem da morte
Vândalo é quem promete o paraíso e no além-túmulo toda sorte
Claro! Desde que siga seus ditos e contribua com algum porte
Vândalo não é quem joga pedra no muro da emissora
Verdadeira manipuladora dos sonhos da população
Vândalo é quem da benesse da ditadura cresceu promissora
Quem mente, distorce, enriquece e se aproveita da burrice da nação
Vândalo não é o trabalhador que em greve fecha a fábrica
Que deveria somente produzir o necessário à sobrevivência
Vândalo é o industrial burguês, o dono da máquina que não dá assistência
Explorador do trabalho do homem em troca de mais conveniência
Não! O brasileiro que saiu pra protestar,
Pra xingar, quebrar, bradar e sem medo de apanhar
Este não é vândalo, é gente nua
Que ante aos corruptos, de joelhos não se curva
Vem pra rua!
Vândalo é que aquele que jogou esta nação no limbo
Que faz festa em Paris com o dinheiro que não é seu
Que compra deputado para votar no que não é meu
Que entregou nossas riquezas a quem nunca pertenceu
Sim, na ótica deles, sou um vândalo e me perdoe, sou irascível
Não admito e não faço parte dos tolos
O vândalo é aquele que corrompe e se corrompe de forma incrível
Passou da hora:
“Fora todos”
@mvinicaldeira
Moranguinho e outras histórias
I
moranguinho
urge a carne escarlate
do teu ventre em minha boca
urge a pele escarlate, o dorso
as rugosas empolgantes
em cor de sangue vivo, muito vivo
urge a tua curva, a nuca o toque
cada pedaço das tuas nuances
tuas entranhas e pêlos
e num instante o mundo é nosso:
viramos do avesso por nós mesmos
imersos, invasivos, provocadores
eu e você na minha saliva
nenhum beijo se faz lágrima
lábios lânguidos a roçar à casca
gostos, traços, secreções
eu quero a tua pele só pra mim
te mergulhar em creme
e fazer de ti a refeição predileta -
ave nosso pecado!
ave o que nos faz de sina!
II
far
nenhuma solidão
é tão humana
quanto aquela
que reside
num quente e delicioso
corpo deitado
bem do nosso lado
III a
inútil – parte 1
agora durmo
e vejo meu próprio sonho:
translúcido
ele tem de uma inutilidade enorme
minhas palavras em vão
são inutilidade enorme
um cais de mil barcos
passageiros tão felizes
um viajante solitário e perdido
sem motivo e crença
ao largo, apenas rastilhos de pólvora
molhada e uma certeza
inútil pela própria natureza -
o resto e só beleza roubada
decomposta, ignara, distante
são cinco e meia da manhã
de um dia quase bonito
é morri ha sete anos atrás
virei minha assombração
um zumbi de copacabana
III b
inútil – parte 2
escorar a inutilidade
entre os escombros da razão
enquanto a chuva não cessa
os mendigos sofrem
e nenhuma ilusão é barata
pessoas sofrem nos pontos de ônibus
e nos terminais, nas centrais
alguém chora num hospital
e a minha inutilidade ri
de tão surreal e tola que é:
decomposta em madrugadas
fracassada, perdida
incapaz de enternecer
e entedia pois não tem lógica
é também mendiga de sentido
são cinco e meia em plena manhã
em pane, desgovernada
ventre de um dia inútil
enquanto a vida escorre
deságua em vão por nada
e o trabalho nos enobrece, oh!
a minha inutilidade ri
de si mesma, de tão oca que e -
fala sozinha, desamparada
ninguém entende ou se arrepia
os alvos estão todos errados
hoje é um belo novo dia
tão inútil quanto ontem
tão inútil quanto o verso
mal-ajambrado na poesia
escorar a inutilidade
em ser estrangeiro de si mesmo
enquanto a dor dói e marca
hoje e só um belo novo dia
e ninguém vai ligar para nada
são cinco e meia da manha
que parece não ter fim ou fase
vemos granadas sem pinos
foguetes fora de órbita
e tudo é tão sem-vão
é espaço, silêncio e perda
enquanto a vida navega
furiosa na contramão
um dia escuro e cinza
para que tudo seja tão longe
quanto é - sem questão!
@pauloandel
Tuesday, July 16, 2013
Pêssego
dá-me tua calda
doce, arisca
que arde imaginários
e acende o paladar
dá-me tua carne
dourada, macia
em pequenos nacos
e mil delícias
de te experimentar
dá-me teu colo, dorso
os espaços livres
as melhores saliências
e tudo que o doce bom
sabe provocar por si
dá-me teu silêncio
e teus feitiços de amor
numa estampa rija
em porcelana e bordas
e os versos fáceis
que trago na língua
são chantilly em fogo
a te devorar crua! crua!
@pauloandel
Gatas extraordinárias
1
Mal coloquei os pés na areia do Leme, depois de estacionarmos o carro, meu amigo Leo faz um gracejo e duas gatas alucinantes sul-americanas - venezuelanas, chilenas, qualquer cousa - viraram para trás, sorriram, disseram algo ininteligível e não fizemos nada além de tomar o rumo do mar – agora eu sou um respeitável senhor e não posso ficar de namoricos pelas ruas – o Leo pode – o namoro é tudo. Então rimos, ficamos com o ego inflado por cerca de cinco segundos e tudo virou passado como deve ser.
A pedra do Leme, misteriosa, iluminada, provocante e escura. No térreo, casais namorando, gente olhando para o horizonte como se ali estivesse o fim do mundo, eu pensando em todas as coisas que não deveria ter dito ou escrito hoje e tantas vezes – claro que devia ter dito e escrito, seu idiota! - tudo tão inútil e lindo, seu idiota! – bobagens fascinantes que quase ninguém liga – o tempo jogado fora que jamais voltará – mas disse a verdade! – na verdade não mudaria uma vírgula que fosse! – o amor que não é escrito morre em palavras ao vento -, Leo rindo como sempre e caminhamos. Sempre rindo e sempre cantando, “Tradição” e pensei em Vanessa, que mora por ali.
Houve uma hora em que vimos uma assustadora e gigante pegada de um possível ET em Copacabana. Acontece que o bairro já tem extraterrestres demais, de modo que uma celebridade interplanetária poderia sentir-se incomodada com a concorrência – e, claro, não colocaria seu pezão ali.
Mais um cem metros, duas gatas extraordinárias – lindas coxas - fazem exercício físico na areia para futevôlei ou beach soccer. Demos uma espiada na quadra seguinte, era vôlei mesmo, claro que Caldeira reprovaria.
A praia do Leme era um silêncio de morte.
2
Grandes estruturas de ferro à frente, caminhamos bem perto da orla para que pudéssemos passar, Rimos ao cogitar que algum casal taradão poderia transar ali tranquilamente pois não havia uma viv’alma além de nós e, mais além ainda, é algo bom para os casais: o desafio.
Acontece que a praia mudou. O pessoal já não transa à beira-mar como antigamente. Centenas de metros e nenhum nativo fumando maconha sequer. Ao longe, as luzes da orla e do Forte de Copacabana faziam sua própria Via Láctea – estrelas, estrelas, vizinhas do mar sereno e frio da noite. Todo mundo chama o antigo Meridién de Meridién mesmo, não vai mudar nunca.
Pensamos nos tempos em que éramos escoteiros – talvez sejamos escoteiros pelo resto da vida. Bivaque, jornada, céu aberto e mar sem fronteiras – fogo de conselho. Caminhar na areia é três vezes mais pesado do que em terra firme, tudo muito divertido. Começou a chover antes de chegarmos à bandeirinha de perigo no mar, típica para estrangeiros.
Metros adiantes, garotas suculentas no Balcony procurando clientes para sexo, a velha Help resiste arduamente. Algumas delas sempre provocam uma pergunta: “O que você está fazendo aqui?” – claro que podiam estar em lugares melhores, onde suas curvas e tesão fossem melhor apreciados, mas a vida não é justa, nunca foi e, por isso, tudo é um grande negócio onde hipocritamente as pessoas fingem não ter sentimentos.
3
Lentamente, voltamos para o fim do Leme, os aparelhos são confortáveis e divertidos para ginástica, porque nem tudo funciona direito na cidade? Fizemos algumas séries, falamos de mulheres – há coisa melhor? -, das coisas que não entendemos nelas – há coisa pior? -, até futebol, qualquer bobagem. Garotos jogando uma pelada na quadra redonda da praça.
Dez, vinte, trinta minutos, Katia nos liga pra conhecermos seu novo solar – fica num oásis de Copacabana, perto da Chacrinha, coisa de sonho – em cinco minutos estamos ai! – Leo, siga aquele carro! Aumente o volume do Van Halen!
Entramos na rua errada, subimos a ladeira, o segurança da cancela foi muito gentil, contornamos e havia um descidão. No meio, uma loura tipo Elizabeth Shue vinte anos mais nova me chama, pergunta algo, Leo parou o carro: - Vocês querem vaga, estou tirando o meu daqui? - Dois mil obrigados? – Claro, por favor. Linda de morrer, ficamos embasbacados com sua educação e presteza – definitivamente não era uma mulher qualquer – era longe da casa de Katia, mas é claro que aceitamos, seria uma descortesia não fazê-lo.
Depois de estacionar, o possível namorado, marido, irmão ou pai – não descobrimos – foi bastante simpático. A garota subiu, ele pegou o carro para sair, conversou conosco com fidalguia e nos sentimos bem. Nunca mais veremos aquela linda mulher – mas o que importa? Tudo na vida é efêmero.
Descemos a ladeira.
Que garota linda! Por um segundo, até ocupou meu pensamento.
4
A casa de Katia é nova, aconchegante e linda feito a anfitriã. O que podíamos fazer por lá? Rir. Não falamos de nada que nos entristecesse ou quase, mesmo que eu estivesse muito triste – e isso não tem importância. Telefonei para minha gata de chocolate e dei-lhe um beijo de boa noite. Depois, conversamos sobre negócios na sala. Vai dar tudo certo. Um suco de uva delicioso. Ficamos uma hora na prosa, depois todos tinham que dormir.
5
Perto de meia noite, mais suco e salgados, agora na Cruz Vermelha. Eu e Leo continuamos não entendendo nada sobre o dia e a noite. Ora, vamos rir, é a única coisa que interessa! Dividimos grana, falamos de domingo, o que vem por aí, a desimportância do futuro por agora.
Dei um abraço no amigo, ele seguiu para outro lado, ainda cumprimentei os chapas no Vieira, o bar sendo lavado como poucas vezes vi.
Tristeza ao ver o morador de rua com suas mil bagagens na calçada enquanto chovia forte.
Garotos fumando maconha perto do posto de gasolina. Adilson simpático na portaria do prédio. Chegaram mensagens do e-mail, várias que não tinha lido e teria sido melhor não ler, tudo sem amor.
Um banho frio.
Don Airey no velho Hammond, o Deep Purple firme no quarto. Só entende quem namora.
Don Airey no velho Hammond, o Deep Purple firme no quarto. Só entende quem namora.
Tudo continua escuro, mas não é o céu do Leme, não é o fim do mundo e o que hoje parece desconforto amanhã à noite vira alívio. Um horizonte é apenas um horizonte e só. Apenas um quarto com luz apagada, som moderado, o teto de bom abrigo e uma noite para se dormir um pouco mal. Todos devíamos ter um botão off para os pensamentos, de modo que fossem desligados – ou mesmo deletados. Quem merece atenção além das gatas extraordinárias?
Monday, July 15, 2013
A via láctea
eu e meu eu
nós dois tão perdidos
feito você
por entre as estrelas
vasculhar o céu
até te encontrar
e entender o que se namora -
eu já não sou o mesmo
e sou muitos
mas cada um dos meus eus
procura a tua luz
num infinito
você tem outro céu
outra estrela ou outro amor
nós somos a mesma via láctea
e trocamos olhares
perigosamente distantes
nenhum avatar é perigo -
a vida é um perigo enorme -
o que eu amo não consigo -
eis nosso mesmo lugar:
meu amor, crime e castigo
eu tenho outro céu
e outra paixão
mas amor é outra coisa:
é procurar a estrela predileta
no meio da via láctea
entre milhares de estrelas
até encontrar você
até encontrar você
o resto do mundo voa longe
as mentiras são tão sinceras
e tudo o que eu namoro
à luz da via láctea
está preso em você
estampado em você
o mundo inteiro contra
e eu pensando
em te querer até o mesmo céu
derreter de paixão
cobiçando
um sereno canto e mãos dadas
enquanto o luar
finge nos prometer -
loucamente temos fé! -
assim seja ou o que será
se o teu Deus
for o mesmo que me chama
@pauloandel
(Sobre "A via láctea", Renato Russo, 1996)
nós dois tão perdidos
feito você
por entre as estrelas
vasculhar o céu
até te encontrar
e entender o que se namora -
eu já não sou o mesmo
e sou muitos
mas cada um dos meus eus
procura a tua luz
num infinito
você tem outro céu
outra estrela ou outro amor
nós somos a mesma via láctea
e trocamos olhares
perigosamente distantes
nenhum avatar é perigo -
a vida é um perigo enorme -
o que eu amo não consigo -
eis nosso mesmo lugar:
meu amor, crime e castigo
eu tenho outro céu
e outra paixão
mas amor é outra coisa:
é procurar a estrela predileta
no meio da via láctea
entre milhares de estrelas
até encontrar você
até encontrar você
o resto do mundo voa longe
as mentiras são tão sinceras
e tudo o que eu namoro
à luz da via láctea
está preso em você
estampado em você
o mundo inteiro contra
e eu pensando
em te querer até o mesmo céu
derreter de paixão
cobiçando
um sereno canto e mãos dadas
enquanto o luar
finge nos prometer -
loucamente temos fé! -
assim seja ou o que será
se o teu Deus
for o mesmo que me chama
@pauloandel
(Sobre "A via láctea", Renato Russo, 1996)
Thursday, July 11, 2013
Beijo III
nossa luz opaca
e alguma Madeleine
na vitrola eletrônica:
você me pede um beijo
mas não diz nada
apenas graceja
e fecha os olhos
mergulha no mar
das incertezas -
somos lábios contra
lábios, fogo contra
fogo, lábios em chamas
e eu te mordo
eu te namoro e mordo
você tem velas acesas
nas veias e calda
de chocolate no corpo
daí te beijo, beijo
Deus é uma porta aberta
o céu sem fronteiras:
duas almas nuas
satisfeitas enquanto o chão
parece infinito
e o diabo veste azul
num lençol retorcido
@pauloandel
e alguma Madeleine
na vitrola eletrônica:
você me pede um beijo
mas não diz nada
apenas graceja
e fecha os olhos
mergulha no mar
das incertezas -
somos lábios contra
lábios, fogo contra
fogo, lábios em chamas
e eu te mordo
eu te namoro e mordo
você tem velas acesas
nas veias e calda
de chocolate no corpo
daí te beijo, beijo
Deus é uma porta aberta
o céu sem fronteiras:
duas almas nuas
satisfeitas enquanto o chão
parece infinito
e o diabo veste azul
num lençol retorcido
Wednesday, July 10, 2013
Verões do Leme
viste o meu sorriso
e disseste: eu sou
teu luar de praia
enquanto navegamos
com toda calma
em busca de perdão -
eu não! – eu não!
meu pecado
é tempero quente
de amortecer
a tua devassidão
até provocá-la
subvertê-la
chacoalhar tudo
e deixar
cada coisa devidamente
fora de seu lugar
@pauloandel
Tatiana
te pediu romance?
nuance?
alguma chance?
meu amor, você perdeu
a calçada de pedra
num único lance
e deslumbrou-se
num céu de esmeraldas
eu não sou daqui
nem num instante
eu tenho outro lugar
e não preciso de você
enganou-se por soberba
e desfez a noção da hora:
eu tenho tempos modernos
e dispenso as preces -
sei muito bem do meu agora
@pauloandel
Pra quê
Por Susan Sontag e Miles Davis
Cai o dia e penso numa
pergunta inevitável, demolidora, feito aquelas que agradariam na réplica uma
mulher genial como Susan Sontag - The
only interesting answers are those that destroy the questions – ou qualquer
pessoa genial. Susan gostaria de uma grande pergunta porque a resposta seria
irresistível e avassaladora. Então olho para o teto do quarto, nenhuma estrela,
uma tristeza enorme por vários motivos e penso mais: que pergunta poderia ser
tão demolidora a ponto de exigir uma resposta mortífera? Pois bem, cheguei a
uma simples, mas que tem me feito matutar: “Pra quê?”. É que se chega a um
ponto da dialética onde o “pra quê?” é definitivo: um sinal claro da desnecessidade,
da desimportância do que se está fazendo ou querendo. Mas não é apenas um “pra
quê?” no sentido de se estabelecer a compreensão das coisas ou pessoas, mas sim
para investigar a utilidade, a importância delas, principalmente quando
investimos tempo e energia demais. Uma certa hora, você se dá conta do tempo
que está perdendo com uma coisa, pessoa, ideia ou sentimento e questiona: pra
quê? Uma briga, uma cantada, uma troca de ideias, uma tentativa de aproximação
ou conquista de harmonia, uma reconciliação, uma busca de amizade, uma integração
intelectual, qualquer conversa fiada e tudo sai ao contrário, tudo é longe do que se queria, muitas
milhas depois, nada tem a liga necessária, é como se você se olhasse diante do
espelho: pra quê? A amizade, o carinho, o amor, a atenção, o cuidado, a
preocupação, o respeito, o interesse no outro, na outra ideia, na outra compreensão,
tudo sobre coisas que não oferecem contrapartida, retorno ou mínimo cuidado do
outro lado daquela dialética, você respira fundo, reflete, caminha nos
pensamentos e a pergunta é inevitável: pra quê? O futuro é o próximo segundo,
os planos que não são realizados, os sonhos que não vão virar realidade mesmo
por que nada indica isso, as ideias que não têm chance de sair do papel, os anseios
que não tomam corpo e tudo se dilui numa modesta pergunta, à beira do
simplório: pra quê? Que ninguém se engane: esta reflexão típica de um bebum em
seu habitat natural não é amarga nem
fria e nem oca – ela tem a ver com o que fazemos de nosso tempo até ele se
tornar perdido e inútil – e nos tempos modernos o tempo é tudo – eu não tenho
mais o tempo de antes e cada segundo meu precisa agora durar um dia – pra quê? Pra
quê? A vida é hoje, o futuro é a morte e você perde preciosos minutos ou horas
no meio do nada em busca do lugar nenhum? Pra quê? Agora estou triste, o tempo
não é mais o mesmo e, olhando para trás, vejo quanto tempo gastei em minha vida
com dialéticas inúteis e sem sentido quando tudo o que eu precisava, bem antes,
era ter olhado naquele mesmo espelho e perguntado: pra quê? Agora não tenho
esperanças, o mundo é uma tarde de inverno, a vida é em vão, o que resta é
esmolar o tempo, os segundos, subir à lua, dez anos a mil ou a um milhão, o sol
nascerá e tudo teria sido poupado se eu tivesse feito a pergunta definitiva a
mim mesmo, aquela que nenhuma pergunta destrói e desapontaria Susan Sontag: pra
quê? Agora é só uma tarde de inverno, ensinar procedimentos a uma linda
estagiária, ver o céu de gris e réstias do sol, chorar pelos mendigos sofridos
no centro de uma grande capital, ver os prédios das grandes corporações
abarrotados com números e gente como figurantes de um cenário qualquer, pagar
contas, correr pelo trabalho, estudar o que não se quer, namorar quem não se
ama, engolir compromissos à toa, tudo é bonito ou lindo de morrer, mas falta charme e nada ocupa
minha cabeça que não seja uma mísera e fugaz pergunta: pra quê? Pra quê? Pra quê? The
only interesting answers are those that destroy the questions – The only
interesting questions have no answers away.
@pauloandel
O ballet da balada da morte
morremos tão jovens
tão longe do que devia ser fim
e agora sorrimos um para o outro
eu, você e nossos corações imperfeitos
perdidos
impecavelmente mortos
sorrimos frente a tudo
a morte foi nosso futuro -
para que planos e sonhos?
vamos viver em paz
na contradição que nos resta
ficamos tão longe do devido
e do razoável ou talvez justo
que renascemos -
e não somos mais do mesmo:
apenas saudável aragem
de um verão que não veio
um amor que apodreceu
e alimentou a terra - deu cria em flores
não quis paz nem guerra -
emudeceu-se, foi bússola
sem norte e fez do vento
o seu voar para outra estação
@pauloandel
tão longe do que devia ser fim
e agora sorrimos um para o outro
eu, você e nossos corações imperfeitos
perdidos
impecavelmente mortos
sorrimos frente a tudo
a morte foi nosso futuro -
para que planos e sonhos?
vamos viver em paz
na contradição que nos resta
ficamos tão longe do devido
e do razoável ou talvez justo
que renascemos -
e não somos mais do mesmo:
apenas saudável aragem
de um verão que não veio
um amor que apodreceu
e alimentou a terra - deu cria em flores
não quis paz nem guerra -
emudeceu-se, foi bússola
sem norte e fez do vento
o seu voar para outra estação
@pauloandel