ZERRODRIX
Era 1976 para 1977. Tempos de horror; minha mãe chorava todo dia por problemas na família. Morávamos em Madureira, ou Vaz Lobo, temporariamente; coisa de uns seis meses, mas não era fácil. Lá fora, a Máquina Tricolor dava shows e ganhava campeonatos, mas eu ainda estava com meus carrinhos e um playmobil.
Perto de casa, uma pequena lanchonete. Uma das melhores coxinhas de galinha que já comi em minha vida. Mãe sempre pedia para buscar um lanche lá. O rádio tocava uma canção:
- Soy latino-americano, e nunca me engano... nunca me engano!
Um dia, até a dor passa. Voltamos para Copacabana.
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Nos últimos dias, uns quinze, talvez sedento por redescobrir intensamente uma das minhas bandas da juventude, ouvi com intensidade o Joelho de Porco – provavelmente a melhor banda de rock-humor do Brazyl em todos os tempos, ainda que o humor esteja sempre presente em qualquer rock.
No YouTube, as delícias de se rever “A última voz do Brasil”, um dos eternos clássicos pop do nosso cancioneiro. Apresentação antológica no Festival dos Festivais, com direito a orquestra e coro.
David Drew Zingg, um dos pilares da fotografia mundial, com nariz de porco, claro, e seu sotaque inconfundível. Tico Terpins, também antológico. Prospero Albanese aos potentes gritos. E Zé Rodrix, com seu timbre ímpar e seu jeito de compor também (o piano de “A última...” é a cara dele).
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Parceiro de Sá e Guarabira, bem-sucedido na carreira solo e nos jingles, inevitável artífice do Joelho de Porco, Zé Rodrix é um dos gênios brasileiros que o povo não escutou direito – e a crítica não entendeu direito.
E mesmo que não fosse nada disso, tá lá tatuado na minha infância e na minha adolescência.
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Ontem, fiquei triste. Aniversário de um ano da morte de meu pai.
Quando nos deparamos com a dor interminável, o jeito é buscar alívio.
Lá estava eu, com obsessão catalânica, diante do computador, para mais uma sessão de “A última voz do Brasil”. Rir é sempre um bom remédio, ainda que o Joelho, sob risos, denunciasse um Brasil bizarro que aí está até hoje.
O vídeo tem quase dez mil acessos no YouTube. Expectadores deixaram seus comentários por lá. Um deles, patético:
- A banda é ótima... pena que o chato do Zé Rodrix apareça o tempo todo.
Perdoai-o, señor; ele não sabe o que diz. Teu Deus do céu, que palpite infeliz.
Último play. Stop. Desativar.
Leo sumiu, Taty estava ocupada, Bola letrou um caô.
Éramos eu, doze pães franceses, queijo cheddar, coca-cola. Hamburgers.
E um pouco de jazz.
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Acabo de chegar ao trabalho.
Zé Rodrix acabou de morrer, no mesmo dia em que meu pai, um ano depois. Poucas horas depois de tê-lo visto mais uma vez em vídeo. Deveria ter sido proibido o seu falecimento, assim como os de Candeia, Tom Jobim, Sivuca e Blecaute e muitos mais. A única hora em que o autoritarismo poderia ter alguma utilidade.
Minha família foi embora.
E a música do rádio, também.
Eu quero um Joelho de Porco para mim!
Paulo-Roberto Andel, 22/05/2009
É meu amigo, eu disse que o presente é mole porque nunca perdi ninguém. E por isso o futuro me apavora.
ReplyDeleteAcho mesmo que algumas pessoas não poderiam morrer nunca: Tom Jobim, Vinícius, Elis, Mussum, Machado de Assis, Jorge Amado,... , meu pai e minha mãe, seu pai e sua mãe...
Mó mentira esse papo de reencarnação. Não tem nada por aqui que se assemelhe a esses e nunca vai ter.
Avanti!
É meu amigo, eu disse que o presente é mole porque nunca perdi ninguém. E por isso o futuro me apavora.
ReplyDeleteAcho mesmo que algumas pessoas não poderiam morrer nunca: Tom Jobim, Vinícius, Elis, Mussum, Machado de Assis, Jorge Amado,... , meu pai e minha mãe, seu pai e sua mãe...
Mó mentira esse papo de reencarnação. Não tem nada por aqui que se assemelhe a esses e nunca vai ter.
Avanti!
É meu amigo, eu disse que o presente é mole porque nunca perdi ninguém. E por isso o futuro me apavora.
ReplyDeleteAcho mesmo que algumas pessoas não poderiam morrer nunca: Tom Jobim, Vinícius, Elis, Mussum, Machado de Assis, Jorge Amado,... , meu pai e minha mãe, seu pai e sua mãe...
Mó mentira esse papo de reencarnação. Não tem nada por aqui que se assemelhe a esses e nunca vai ter.
Avanti!
É Paulo, tem muita gente boa indo embora. Quem é bom, parece que vai mais cedo. O céu deve estar precisando de boas pessoas!!!!!!
ReplyDeleteAbraçooooooooo
Bonita homenagem, Paulão
ReplyDeleteVida longa à arte do Zé
[ ]s do Freitas
Pablito
ReplyDeleteSinta-se fortemente abraçado!!!!!
Sou solidaria a sua perda.
Bela homenagem...gens
Um MMMMMMUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU!!!!!
mais forte hoje!!!
Caríssimo Andel,
ReplyDeletefui ZéRodrix mais pra Casa de Campo que pra Joelho de Porco. Explicável, sou bem mais velho (ou mayor). Ele foi (é e era) inconfundível, razão porque não podia continuar no ar empesteado, onde todos - obrigatoriamente - precisam se confundir e ser confundidos. viver, vê-se, ainda é a menor parte. abraços, Pedro
É cumpade Paulo!
ReplyDeleteMe arrumo e v ou pra rua e na rua vou achando, muita gente que trabalha, se divertindo e cantando.
Saudoso Zé Rodrix.
Abraço Paulão!
Meu mestre Paulo com toda sinceridade te digo. Voltou a minha mente essa música que me faz lembrar fatos acontecidos nessa época.Belas lembranças pra mim triste noticia para todos nós.
ReplyDeletequerido amigo, infelizmente a perde de um ente querido é insuperável, perdi meu pai, também está fazendo um ano e cinco meses,sei bem como você se sente,temos a certeza que um dia partiremos para uma outra vida, mas não estamos prontos para aceitar essa verdade, o seu texto já disse tudo, hoje perdemos mais um dos nossos ídolos, e com certeza será esquecido como tantos outros, pois o brasileiro idolatra o produto importado, mas quem se lembra por exemplo: de Gonzaquinha, Tim Maia, Vinicius de Morais,Roni Cordi, Sérgio Murilo, e tantos outros astros de nosso cancioneiro, mas vão cultuar Elvis, visitar sua mansão-museu, não que ele não mereça a nossa homenagem, mas podiamos ser assim com nosso produto nacional, você falou em joelho de porco, cito também, língua de trapo, muito legal, hoje temos mais uma estrela no céu, junto de noel, meu querido poeta da vila, o zé, que como tantos brasileiros deu um duro danado para chegar lá e chegou, bjs
ReplyDeleteMorreu não. A música continua. Viva Zé Rodrix!
ReplyDeleteMeu querido Über amigo, fico com você no pensamento "autoritário": mãe, pai, filhos, amigos queridos e outras pessoas especiais...jamais poderiam partir.
ReplyDeleteBela e justa homenagem ao "Zé", que deve estar tranquilo na sua Casa de Campo.
Vou te levar umas "coxinhas de frango" na terça.rsrs
Beijossss
Os bons atraem os bons. Vocês são ótimos.
ReplyDeleteZé Rodrix provocou terremotos literários como esse seu. Um primor e merecido.
Um outro grande terremoto literário é o texto do Freitas sobre o mesmo Zé.
Obrigado por permitir meu acesso a esses textos primorosos.
Abraços
Luiz Ramos
O Zé, num determinado momento da minha viagem, deu corpo aos sonhos que teimavam em permanecer comigo.
ReplyDeleteEle me livrou deles, tornando-o palavras, músicas. Elas ficaram eternas. A realidade se encarregou de destruir tudo aquilo que imaginamos, mas jamais o conseguirá com a música.
Tudo que tem forma se extinguirá. Pensando assim, ele sumiu por uns tempos, mas cada vez que ouço o primeiro compasso de sua música, ele volta. Voltará sempre. Não? Um grande abraço.
Inegável talento. Duro pensar que possa ser menos um criativo neste planetóide. Quem não sonhou com uma casa no campo onde possa rever os amigos, os discos, os livros e nada mais?
ReplyDeleteShow de post, meu amigo Paulo!
ReplyDeleteTexto muito feliz, que traduz com muita eloquência e precisão a importância do Zé Rodrix - e de todas as suas respectivas associações - tanto para a música brasileira, quanto para as cabeças que fervilhavam na segunda metade da década de setenta.
Um grande abraço!