Flanava pelas ruas de Botafogo, quando firmei ponto num boteco da rua Farani, velho ponto de concentração dos universitários de Santa Úrsula. Ficam os jovens de um lado para o outro, vagando, buscando flertes com a juvenília das moças, formosas, esculpidas nas academias de ginástica, mas que não dispensam uma cerveja dourada.
Era começo de noite, eu batucando de leve numa das mesas algum samba dos cinquenta, esperando por velha amiga linda dos tempos idos. Era calma de bar: algum burburinho, ir e vir das gentes ao mictorium, um ou duas mesas ainda não ocupadas.
A amiga veio, matamos saudades, trouxe outra linda a tiracolo e trocamos de mesa. Conversa leve, bate-papo furado que é uma das especialidades cariocas. Pastéis, drinques, o simpático vendedor de amendoim.
De repente, tumulto. Gritaria. Guerra de bar.
Um rapaz, que dificilmente tinha mais de vinte e cinco anos parecia possesso. Urrava. Xingava quem passasse por perto. Sinceramente, não sei como não apanhou, nestes dias de hoje. Todos os próximos foram por demais calmos. Um senhor veio apartar, quase levou uma cabeçada. Socos não.
Metros à frente, dois brilhantes membros da Guarda Municipal de Maia, a que prega o "choque de ordem na cidade", assistiam a tudo, silenciosos. Eles pensam que não lhes cabe intervir. Na verdade, medrosos porque não estão armados. Mesa ao lado da nossa, um rapaz bradou:
- Esses manés só sabem é multar carro!
Vários minutos, consegui entender a briga: o possesso reclamava troco de oito reais não recebido. Babava. Algo anormal. Custos a custos, tiraram-no do bar. Uma outra moça bonita, menos do que a da minha mesa, com uma criança de colo, assistia a tudo, silenciosa, impassível. Era a esposa do babão.
Quem faltava? A PM. Abriram a porta, apareceram feito cor de som. Encostaram o babão num canto, nada muito significativo. Foi embora. Antes, gesto típico dos cariocas: sonora vaia dos frequentadores. Aí, gostei.
Alguém cochichou que o pai do babão era freguês do bar, amigo da dona. E o vociferante estava, a princípio, "cheio de pó". Parecia mesmo.
Quase tudo normal, bebericamos mais. A loura linda da mesa foi embora mais cedo, a amiga linda ficou e, mais tarde, surgiu um gaúcho cheio de bossa para falar de futebol. Rimos a valer, muito bom. Ganhei até uma aposta, a de que Alessandra Negrini tinha mais de trinta e quatro anos de idade. Cinquenta reais por saber dados de uma belezoca? Caiu bem.
Fim da noite, despedida dos amigos, parei em casa para escutar um Mingus depois do banho tomado.
A tal da droga é uma porcaria mesmo. Torna qualquer Zé Arruela um machão desafiador por conta de oito reais. Tira o respeito aos mais velhos, à esposa, ao filho de colo. Expõe os populares a uma perspectiva de violência desagradável e inútil.
Ainda por cima, demostra de uma só tacada a inoperância da PM e da GM.
Lembrei também que, numa mesa perto, umas outras meninas bonitas sentaram-se à mesa mais próxima do que, segundos antes, havia ocorrido o tumulto. Uma delas perguntava para minha amiga o que ocorrera, foi esclarecida. Depois, segundos, estava a tirar muitas fotos digitais, a posar com suas belezas e as amigas, a viver um pouquinho de paz entre os tempos de dor que vivemos, entre tudo o que aí está.
As ruas precisam de mais meninas bonitas sorrindo e posando.
E menos cheiradores de pó. Glamour da cocaína é coisa de otário.
Mingus usava drogas, mas fazia arte.
Ouvi o resto do disco e dormi. Um sono quase justo.
Exceto pelo fato de que mal alertei para as flores, a chegada da primavera.
Paulo-Roberto Andel, 21/09/2007
Texto maravilhoso,autorizo a minha biografia! :)
ReplyDeleteAdorei os elogios mas serei eu merecedora?? Se Andel diz eu assino em baixo.
Parabens!
Beijos