I
Cruzei a cidade na noite de sexta-feira e fui parar no único bairro do mundo onde me sinto em casa: Copacabana, é claro. Acontece que agora sou um haole, um estrangeiro, um turista, só que com o olhar mais atento de todos os habitantes locais. Bem antes de fechar a corrida, perguntei ao motorista se preferia receber em dinheiro ou pix. Deu pix na cabeça. Vale o escrito.
Parei no Teatro Brigitte Blair. Fiquei contente. Um palco de resistência, com programação variada e grande ênfase musical. Aconchegante e vintage, a cara de Copacabana. Fui assistir o show da Conexão Planetária, para conferir a ótima impressão que tive do EP no Spotify. Nenhuma surpresa: ótimo no áudio, ótimo ao vivo e saboroso. A Conexão é um duo formado por Mariana Moulin (voz) e Marco Lima (guitarra), também compositores, acompanhado nas apresentações por Ivo Ricardo (baixo), Rabicó (bateria) e Rodolfo Bragantini (guitarra). Raras vezes vi um show tão bom e azeitado de uma banda que está começando um trabalho, mesmo que tenha músicos tarimbados. Há ecos de soul, rock, pop, MPB e peso agradável nas guitarras (sem barulheira) que fazem um contraponto excelente à doce voz de Mariana. Enfim, me diverti por uma hora e meia e espero revê-los em breve.
II
Depois de um bom show, cabe uma boa janta ou lanche, uma boquinha talvez. Meu plano era visitar Katia, no outro lado de Copacabana, começo da Barata Ribeiro. Deixei o Brigitte Blair ainda cheio, parei numa esquina e mandei mensagem pelo WhatsApp. Katia não respondia, nem Rodrigo, meu amigo que mora nos arredores do teatro. Então andei uma quadra, duas, nenhuma resposta e parei na porta de um restaurante a quilo que ainda funcionaria por uns dez minutos. Uma boquinha leve, dois pedacinhos de frango, meia colher de arroz, um pedacinho de pernil e quarenta reais no peso. Socorro!
Sentando à mesa, Katia respondeu. Já tinha uma pizza em casa, mas não estava muito empolgada. Respondi e avisei que sairia em instantes do restaurante. Meu prato tinha tão pouca comida que terminei em dois minutos. Paguei a conta, a caixa foi simpática, logo peguei o Uber e tanto a pergunta quanto a resposta se repetiram: "Você prefere pagamento em dinheiro ou pix?", "Prefiro pix, senhor". Tempos modernos.
III
O elevador do prédio de Kátia é um paradigma de Copacabana, com duas portas pantográficas - uma somente para o térreo. Leo, o cão oficial, pequenininho e super legal, me espera com latidos.
Com o pratinho do restaurante caro, a fome ainda batia. Eu sou um comilão: tracei a pizza que a Kátia rejeitou, ela ligou pro Caravelle, pediu uma lasanha e uma outra pizza de chocolate. Então conversamos e rimos, passamos tempo, falamos de amigos queridos - alguns, infelizmente mortos - e comemoramos quando o pedido chegou. Num mundo onde tanta gente passa fome, poder comer é um privilégio.
Como tudo que é bom dura pouco, chegou a hora de ir embora. O Leo correu de um lado para o outro, me despedi da amiga e fui para o terceiro Uber. Depois de cochilar no sofá, o Rodrigo respondeu mas já era tarde, fica para a próxima.
"Tudo bem? Você prefere o pagamento em dinheiro ou pix?"
"Prefiro pix, senhor."
No comments:
Post a Comment