A
GAROTA morena e jovem está na porta da casa de tolerância panfletando a
propaganda de serviços sexuais, enquanto espia o smartphone e usa um fone de
ouvido. Ela parece jovem, é mais jovem do que se pode supor, mas carrega as
marcas do tempo veloz de quem trabalha na prostituição. Ela atende clientes
também. Ela às vezes sorri, enquanto na diagonal da Rua do Senado um
panfleteiro conversa com transeuntes e veste uma camisa de time de futebol. Ela
também é séria e compenetrada em seu trabalho. A Rua do Senado é vazia e quente
perto de uma da tarde, quase sem carros, praticamente sem gentes. Mais adiante,
ouve-se um poderoso som de funk saído de um cortiço. Mais adiante, uma voz em
alto-falante ecoa do Quartel Central do Corpo de Bombeiros. Mais adiante, duas
jovens e belas garotas, elegantemente vestidas, saem do palácio corporativo da
Petrobras rumo ao almoço ou qualquer outra coisa. Elas são bonitas e jovens, bem
jovens, tão jovens quanto a garota morena que panfleta honestamente na porta da
casa de tolerância, jovens demais mas com trajes de sobriedade empresarial bem sucedida. As duas garotas cochicham e riem, do mesmo jeito que a
garota morena fez cento e cinquenta metros atrás ou adiante - conforme o referencial, mas também conversam seriamente
e tudo se resume a uma distância muito pequena quando se pensa em andar, mas
imensa quando o caso é entender o Brasil, as desigualdades, as oportunidades e
o futuro de jovens mulheres que, por incrível que pareça, andam pela mesma
calçada – e nela, podem acontecer os únicos encontros de suas vidas, mas no máximo com um esbarrão e só.
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