O Rio tem mazelas. E gente
cruel, indiferente. Mas isso é pouco diante do grande cenário.
Ele, Rio, também tem cores e
mar, admiráveis vielas de subúrbio, o caos apoteótico do rush entre Presidente
Vargas e Rio Branco, o ir e vir dos baratos no Camelódromo.
O Rio tem a voz das ruas,
com botequins incessantes e imperdíveis. Da Cruz Vermelha até Guaratiba, de Realengo
até a Urca, do Leme ao Pontal com a devida imortalidade de Tim Maia.
Não, o Rio não é a
escrotidão do egoísmo, a opressão do poder paralelo, o abandono e o descaso. Na
verdade, o Rio é a criança humilde de mãos dadas com os pais num trem da
Central. Ou dois garotos conversando perto do Divino, onde um dia o mesmo Tim,
mais Benjor, Erasmo e Roberto escreveram linhas da história do Brasil.
O Rio é Tom Jobim martelando
seu piano no Arpoador lotado ou cantando para meia-dúzia num teatrão da UERJ. É
o samba de raiz pura, o jazz da Arlequim, o violão dos namorados no Engenho
Novo. O velho Bloco das Piranhas comandado pelo inesquecível Moisés em
Madureira. Grajaú, Andaraí, Vila Isabel. Humaitá, Botafogo e Jardim Botânico, o
bairro dos ricos onde há botecos humílimos também e gente descompromissada com
as convenções.
O Rio é o Maracanã
sequestrado que, um dia, voltará às mãos do povo. O sambódromo lotado. As filas
de cinema onde se pode ver tanto pastelões de Hollywood quanto os melhores
alternativos argentinos e europeus. Ou iranianos.
O Rio é pop e funk e brega,
mas quando precisa sabe ser mais Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção do que
nunca. Ou Deep Purple, Iron Maiden e Charles Aznavour.
E Copacabana? Que cidade do
mundo tem um bairro onde, dentro do elevador de um respeitável condomínio, um
travesti e um general reformado debatem o último jogo do campeonato carioca? E onde
dentro deste mesmo condomínio há apartamentos de três dois, um quarto ou
quitinetes, tudo junto? Que cidade tem um bairro que abraça Braguinha, Dorival
Caymmi e Fausto Fawcett ao mesmo tempo?
Nem falei de Ipanema,
Leblon, Tijuca. É que não dava. Para entrar no assunto é preciso escrever um
livro a respeito. Quem se lembra do verão da lata?
Por um dia, danem-se as
mazelas, as greves, o resto. Mas só por um instante. Ver a beleza do Rio não tem preço. E, num outro
dia, a cidade será como a bela mulher dentro de um vestido impecável. Oxalá.
Por ora, vamos cantando
nossos sambas, dramas e a certeza de, se ainda falta muita coisa por aqui,
melhorar é possível.
Tome um ônibus na Cinelândia
via Aterro e espie a paisagem por cinco minutos. Ou passe de manhã ao lado da
Quinta da Boa Vista. Tente adivinhar onde estavam os bambas do Estácio há um
século.
Aí você vai entender o que é
o Rio.
Paulo-Roberto
Andel
@pauloandel
Imagem: Ricardo Valença, 1998
Fala, Paulo! Realmente, a cidade é MUITO linda!!
ReplyDeleteMas fico muito desanimado com a degradação das ruas. Em Copacabana, por exemplo, lixo, sujeira e muitos ladrões e pivetes aproveitando a leva de turistas vindos de toda a parte da mundo. As calçadas, mal tratadas, cheias de buraco, nos envergonha.
O nosso maior problema ainda é a desigualdade social, apesar do crescimento da economia. Mas enfim, tirando isso, realmente não tem preço a beleza da nossa cidade.