Pequenos fragmentos
de uma paixão inútil
Quando estava sozinho naquele
quarto de hotel semana passada e surgiu uma garota de ocasião, pensei em você.
Ontem, trocando beijos inúteis com outra mulher, cobicei você. Tem sido assim
nos últimos anos, desde que reparei em seu olhar algo de naja e isso me
encantou, o encanto de cobra verde que Glauber Rocha mencionou certa vez. Achei
que fosse apenas desejo, tesão, admiração física, achar você linda e atraente,
linda e sexy, linda e adorável. Mal trocamos palavras, sequer viajamos, não nos
beijamos, não oferecemos carícias um ao outro num cinema em dia de filme chato.
Estamos longe, moramos longe, nossas vidas não se cruzam, não sei de nossa
afinidade. Mas eu penso em você. Incomoda-me saber que talvez não esteja feliz
dentre os lençóis em certa noite com algum companheiro – queria estar a seu
lado, nem que fosse somente para apagar a luz e ver as estrelas imaginárias do
teto de concreto num quarto qualquer. Estamos longe, muito longe, mas o fato é
que, sem maior motivo, tenho pensado sempre em você. Era e é querer o teu
gosto, teu sexo, tua mão esquerda entrelaçada à minha, mesmo que fizéssemos
quase nada numa lateral do Central Park ou num restaurante em Guaratiba. Podia
ser um simples passeio pela rua Halfeld em Juiz de Fora, podia ser uma exibição
de balé contemporâneo no João Caetano da Praça Tiradentes. Podia ser também um café
no CCBB um uma leve caminhada pelas ruas mais discretas do Leme. São fragmentos
de uma paixão inútil: você não pensa em mim, não me cobiça, não se interessa
pelo que eu faço e não há a menor possibilidade de que esse quadro se altere
por ora. Pensei que quando chegasse à idade madura, estaria livre destes
percalços da paixão: a coisa de pensar a cada instante, de querer a todo custo,
a intranqüilidade saudável da adolescência rediviva. Tudo em vão. Não há eco.
Não há retorno. Agora você dorme noutro quarto, outro cavalheiro tem acesso às
delícias do teu corpo, a tua boca mora longe de mim. Agora eu fico insone
noutro quarto, vasculho seios e coxas e intimidades de mulheres para tentar
encontrar você e não consigo. Tudo parece sem sentido. Por que me deixei cair
em tal armadilha, logo que eu já passei por tantos caminhos e estava tão
vacinado contra este tipo de situação? Já se foram dois, três, cinco anos e
permaneço inebriado, encarcerado neste sentimento inútil que não desaparece
mesmo que mil mulheres atravessem o meu caminho – nos sonhos mais lascivos,
mais temperados com o ardor erótico, só você se revela. Sou um homem velho,
vivido e há muito devia ter deixado estas hipérboles de lado, mas ainda não
consegui. Nem sequer te procurei; um dia, na primeira vez em que te vi, estavas
tão linda e deliciosamente provocante em tua sobriedade que, tranquilamente, eu
poderia ter ido para casa e desfeito meu casamento. As águas não têm sido
mansas em meu barco de atravessar o oceano, mas tudo o que eu queria era estar
em minha Copacabana que hoje faz aniversário, queria ser as outras águas do
Leme e ter você nua - te envolver,
refrescar, molhar teus cabelos e servir-te de um longo e delicado abraço que,
aos poucos, te apertasse por completo, de cima a baixo, até que fosse
plenamente minha. Hoje, Copacabana não dorme e eu, ao longe, descanso depois de
uma noite de sexo sem felicidade, espio o teto de meu quarto e procuro por
você. Não há sinais. Agora você dorme noutra cama e noutra cama, nenhuma delas
comigo, e reside em outros sonhos, faz planos, espera outros acontecimentos. Eu
não sou sequer o teu dia seguinte, a esperança, não faço parte dos teus planos.
Preciso dormir e voltar a sonhar outros sem a tua presença. Mas, se isso
realmente acontecer, saiba sempre de tua eterna importância dentro do que mais
prezo: amor. Não preciso chorar: a vida é só um instante entre dores, perdas e
mistérios inexplicáveis. Um dia, a paixão pode passar; o amor, contudo, é monumento
permanente.
Paulo-Roberto Andel, 07/07/2012
@ pauloandel
@ pauloandel
Visite www.benditoflu.com.br
No comments:
Post a Comment