4x
Anos escorrem feito água rumo ao
ralo da pia. Dia desses, eu brincava de secar Bruno e Zé numa partida do
Flamengo pela Copa do Brasil. Bebíamos no Calamares da Lopes Quintas enquanto
Roberto Assaf parecia jururu ao ver o resultado. Depois, Edwin Luisi chegou por
lá acompanhado de um amigo e perguntou sobre o placar. Feitas as contas, faz
dez anos. Podia ser oito, desde o Santo André.
E também foi dia desses que
Hamilton morreu tão estupidamente no asfalto. Dia desses Alex fugiu para sempre,
Xuru também. A eterna história da Souza Lima.
Gosto quando o 409 faz a curva na
Jardim Botânico à direita, rumando para o Horto. Dá uma saudade tremenda.
Lembro quando tentei jogar tênis e não consegui. Ficou a onomatopeia de Gnomo: “Ahhhhhhhhhhh,
brother”.
7y-3
Não tem mais Calamares, virou uma
academia com suas lindas mulheres à tona. O Rio Master, vizinho, permanece. Boa
a ideia de Bruno: fazermos uma janta em sua casa. Amadeo está por lá, Zé e Leo
viriam depois. Comprei ravióli, fácil de fazer, mais molho branco: cebola
picada, pimentão vermelho, linguiça, ervilha, azeitona, creme de leite.
A sala do 704 ficou bem maior.
Confortável. Receptiva. Amadeo suja a parede, Bruno deixa um bilhete colado
nela que dá direito à réplica.
Na televisão, o inacreditável
bispo Waldomiro vocifera e achamos graça, sem macular a imagem de Deus mas sim
do pobre homem, pobre ser humano que arregimenta a ingenuidade de outro ser
humano. Então falamos de vida e morte, dos tempos, das coisas, alguns risos, o
que ainda faz sentido nesta terra onde a estúpida ganância prevalece a troco de
nada. Um dia seremos carne podre decomposta e, a seguir, desaparecida. Vale a
pena ser cretino ou imbecil ou arrogante? Tudo é estupidez. Felizmente, também
temos risos. Gosto dos caras, relembro quando jogávamos futebol no Carioca ou
sinuca no Tocão.
Zé ainda está em casa e atende o
telefone. Talvez traga algum doce para a sobremesa. Raul jamais virá, uma pena.
Horas antes, fiquei triste.
Márcia que cuidava da loja de discos da rua do Rosário, faleceu subitamente.
Era jovem, bonita e fumava. O inevitável soa injusto. É vida, é vida, é injustiça e imprecisão.
9-12
Leo vem do aeroporto, Zé veio sem
carro, ambos batem à porta, claro que Zé foi o último – tudo culpa da eterna
faculdade. Antes disso, Amadeo chegou e sorriu como sempre. Ali, somos
adolescentes politicamente incorretos: alguém sacaneia a viadagem de um
artista, o jogo do Brasil é de uma chatice comovente, não tem Luciana Gimenez
para nos servir de humorista e o jeito é apelar para Galvão Bueno.
Gosto de ver o molho borbulhando
na frigideira. Capeletti e ravioli. Zé trouxe uma torta suculenta da Fornalha,
ainda tinha sorvete de creme, cervejas, refrigerante e uma lata de Molico em
cima do armário que Bruno jura ser da namorada. Fazemos piadas de tudo, algumas
muito incorretas, como o humor exige.
Nada, entretanto, supera as
imagens da televisão: “A Fazenda”. Ver Penélope e Capella no programa me
surpreendeu. Gretchen, evidentemente não. Nicole é linda, Viviane também, uma
lourinha ganha todas as nossas atenções. Os diálogos não importam: vale ver e
apreciar.
Alguém me disse que Gretchen
parece o Coringa num filme do Batman. Faz sentido.
Alguém me disse que nosso amigo
da polícia ganhou excelente aumento para morar num ótimo apartamento da região.
Não faz sentido.
Alguém me disse que o Moraes está
preocupado porque não tem ainda três milhões para comprar seu imóvel em
Brasília. Eu e Leo rimos muito. Estamos falidos, mas felizes. Aqui faz sentido.
A felicidade pode muito bem andar de mãos dadas com a falência e dividir um
chope num bar da orla, ou no Joia. Ou no Eclipse.
4-(12-8)
Meia-noite, pensamos no futuro. Theo,
filho de Zé, já bate à porta em julho. Outro amigo também pensa nisso, Lucas
talvez. Ursula me telefona. As coisas parecem simples: um jantar, amigos
queridos, comida apetitosa, risadas, programas de televisão imbecis servindo de
ruído. O sentido da vida é tão-somente esse: viver fraternidades numa
quarta-feira discreta. Antes, era no Calamares, agora é no 704, amanhã pode ter
outra sede mas o sentido continuará o mesmo. A vida no bojo é uma merda: trabalhar
sessenta anos, pagar contas, aporrinhar-se, perder amor, enterrar irmãos e
pais, ver a miséria. Nas horas de folga, reunião de amigos faz bem, mesmo que
dure só três ou quatro horas. É o que temos, é o que vivemos.
9 x (-45)
Bons tempos no futebol do Carioca. Zé nos dá uma carona de táxi. Pinheiro Machado, Santa Bárbara fechado, Largo do Machado, Catete, Lapa. Leo salta porque ontem é hoje. Agradeço o taxista e subo.
Foi uma simples grande noite,
ainda que o ralo da pia permaneça um autêntico vingador.
paulorobertoandel31052012
Meu grande camarada, Mestre Paulo Andel!!
ReplyDeleteFiquei muito feliz em ler seu texto (e que texto!!) sobre nosso petit rendez-vous de ontem!!
Petit quanto à duração, porém enorme quanto à alegria e à satisfação de reencontrar velhos e bons amigos.
Amigos de tempos que já mudaram, de tempos que não mudam e tempos que irão mudar.
O passar do tempo, dizem, apaga tudo. Ouso discordar, com toda vênia, dos que disseram isso. Ouso até dizer, com toda certeza de meu peito, que tal brocardo não se refere à amizade, pelo menos essa amizade que nutrimos por nós e pelo CT. Agradeço muito ao Grande Senhor Hórus, filho da celestial e magnânima Ísis e do Supremo Ser Osíris,Deuses de minha adoração pessoal, por ter tido sorte sempre em me cercar de boa gente. Lá em Campos, o Macgyver, o Geleia, Sarita, Ratinho, etc. . Aqui no RJ, você, a galera do Supremo Conselho do CT etc.. Não nomeei todos, pois teria que passar uns bons três dias escrevendo. À sorte ou ao destino, agradeço muito, mas muito mesmo àquela que se chama Isabel Machado, amor de minh'alma, mulher fantástica e companheira ideal da minha jornada neste orbe (te amo, Isabel!!). Peço desculpas se fugi um pouco do tema, a culpa é do meu coração e o meu amor por todos!!! É nózzzzz, Mestre Paulo!! Obrigado!!!