Friday, November 04, 2011

A MIOPIA


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Perdi a conta de quantas pessoas eu conversei estes dias, profundamente infelizes com futilidades. Na verdade, todas, com exceção de um grande amigo meu, que sei estar triste com razão e de outra amiga, cujo problema conhecerei mais tarde. E o que chamo de futilidade? O que não coloca em risco ou desgaste a vida da pessoa e de seus próximos. Acordar cedo não é motivo para ninguém se sentir triste. Trabalhar muito. Encarar o trânsito. Não comprar a roupa de moda da semana. Tristeza para mim é fome, violência, pobreza, miséria, ruína, doença. O resto é bobagem, com se um ou outro quisesse dar um dom de drama profundo ao ridículo da vida.

Sete bilhões de pessoas na Terra, a maioria extremamente miserável.

Bastava pensar nisso para não fazer um papel grotesco em público.

Com minhas dores, minha fome, meu cansaço e pensamentos inevitáveis, às vezes ouço calado. Noutras, falo o que é importante... para mim. Quem tem desapreço pelo outro não há de se comover com minhas querelas.


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O meu amigo realmente importante lá de cima me disse algo que me fez pensar e achei genial: "As pessoas se escondem atrás de seus deuses (e religiões) para justificarem toda sua falta de atitude".

Atitude para com o próximo. Com a vida. O outro.

Não é infeliz aquele que só poderá ir a Manhattan semana que vem.

É algo que sempre tenho visto em minha vida. Por não ter religião, sempre fui tratado em algum grupo social com reservas; enquanto isso, pessoas se divertiam alegremente à minha volta e, diante do problema de um terceiro, o equivalente ao que mais ouvi foi: "Melhor não falar nada, não quero me comprometer".

Outra afirmativa abominável é aquela que diz "Todo mundo tem problemas" no sentido de torná-los iguais. É o que se chama de erro de inferência clássica: generalizar o particular.

Encontrar alguém na rua quando você está visivelmente transtornado e ela te diz: "Está acontecendo alguma coisa?". Não sei até onde vão a ignorância e a hipocrisia, de mãos dadas ou calçadas separadas.

Continuo com fome.


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Parece claro que os fundamentos elementares da matemática, ciência tão importante e ainda não absorvida pelo homo sapiens, não conseguem esconder a inviabilidade econômica do que hoje é a Europa, mais os 7 tri torrados na dívida pública norte-americana. Durante décadas, venderam a mentira de uma prosperidade sustentada na economia neoliberal. Um dia a conta chegaria. Chegou.
Por outro lado, chego a me assustar quando ainda vejo tanta gente idiota referindo-se ao "comunismo" (entre aspas mesmo) como algo "atrasado" e "primitivo". Além de não lerem uma página sobre o assunto, encarregam-se de distorcê-lo. Seria interessante que os mesmos defensores ardorosos deste atual modelo de excludência fossem convidados a audiências via internet para justificarem o que pensam.

Talvez fosse mais engraçado do que 90% da programação de televisão no Brasil.

Justificar o injustificável.

Quem diria... a Europa se curva perante uma tabuada.


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Tenho dores.

Lá fora é uma sexta-feira.

Vamos ao shopping center, vamos ver a galera, vamos beber até cair, vamos zuar?

Vamos?

Me mantenha fora disso para sempre.


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Acabou o ano. As ruas estão mais vazias, as salas de trabalho estão mais silenciosas, o telefone oferece silêncio. Somos números, estatísticas. Emolduramos relatórios e vivemos para almoçar correndo, sair do trabalho correndo, chegar em casa correndo e, entre estes intervalos, vivenciar o inevitável nada. Em breve, chegam aquelas confraternizações sem amigos onde muitos vão beber até caírem. Qual o sentido de um dia no ano se todos os outros são vividos sem a fidalguia mínima?


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Definitivamente, nada pode ser mais inútil do que alguém que cumpre seus "deveres religiosos" e trata a crença como um plano de capitalização para o futuro, enquanto a vida real e fazer o bem são itens fora da pauta.

Como se perde tempo com o futuro sem viver o presente.

Se Deus houver, certamente ele não aprova isso.


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Será que depois de tanta fome, tanta dor e incompreensão, ainda tenho futuro?

Somos sete bilhões de pessoas na Terra.

Nunca fomos tão solitários com nossos modernos computadores. Vazios, quando lambemos a ganância e a usura em nossas peles. Inconsequentes, quando achamos que só somos responsáveis pelo que fazemos - e o que não fazemos, como fica?


9*t

A coluna de hoje não fala de sentimentos piegas, nem tem caráter evangelizador. Ela não fantasia e nem finge. É apenas uma crônica dos nossos dias e da nossa estupidez na condição de sociedade. Se você entendeu isso, meus sinceros agradecimentos. Se não, sem problemas: não há nada que não possa ficar mais claro depois de lido seis ou oito vezes.


xyzt

"Drume negrita/ Que yo va a comprar nueva cunita/ Que tendrá capite' y también ca'cabe'"

Ernesto Grenet Wood.


09dfe5
http://www.youtube.com/watch?v=o22eIJDtKho









1 comment:

  1. Perfeita sua crônica, como sempre.A miopia é geral. Há até quem se esconda atrás das palavras, que muitas vezes nem lhes pertencem, e tentem fazer dos "donos" das palavras um(a) idiota míope. Desculpe a palavra forte, como diria minha santa e saudosa mãe.

    As pesssoas estão/ficam míopes quando a "IMAGEM" é respeito ao próximo. Vida que segue...

    Fiquei preocupada hoje...

    Beijossss

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