Friday, September 18, 2009

E O MUNDO NÃO SE ACABOU...














TRÊS ACTOS

I

Dá pena de ver os “grandes meios de comunicação” brasileiros. Subservientes a poderosos grupos econômicos, verdadeira materialização de vassalagem barata, lá estavam eles a previr o fim do Brasil em 2003 (nove anos antes do apocalipse mundial que vem por aí). Tiros n’água. O Brasil ia acabar por causa de um escândalo denunciado por Roberto Jefferson, o que seria equivalente a um Fernandinho Beira-Mar denunciar a indústria do crime organizado. Tiros n’água. Então, no fim de 2008, a grande-crise-que-ia-varrer-o-Brazyl-do-mapa apareceu; dessa vez, o barco rachava. Lula, eternamente ridicularizado por “articulistas” que desdenham de sua ignorância (na verdade, uma maneira de ocultar o verdadeiro motivo do ódio, que é o mesmo deles quando descem com uma empregada doméstica no elevador social), lançou ao vento mais uma de suas frases bem-humoradas, falando da “marolinha” que seria a gran crise ao chegar aqui. Oito meses e meio depois, vemos que faltou Viagra para a ereção do colapso mundial no Brasil – ele já chegou bem brochadinho por aqui, e pouco fez para saciar sexualmente a turminha do contra (melhor dizendo, a turminha a favor de si mesma). Os bancos não faturam como nunca (quer dizer, SEMPRE faturaram)? Bolsa-família não é choque de capitalismo na miséria? O que querem? Que se tire dinheiro de famintos para investir em rampas eletrônicas dos aeroportos?

Foram atingidos gravemente de morte os dispensáveis "executivos indispensáveis" de grandes companhias. Os desocupados de Ipanema e Leblon, crentes em seu mar verde-arroxeado que a América do Sul termina na subida da Niemeyer. Os falastrões de plantão que acreditam na social-democracia do capitalismo furioso e especulativo. E claro, as ararazuis denominadas parajornalistas que “escrevem” para “milhões” de pessoas (que as “lêem”) em ex-revistas como “Veja” e semijornais como “O Globo”. A turba pobre tomou um susto com a safadeza inicial dos bancos (sempre eles, não é de agora e nem desde 2003); depois, tudo assentou. O que temos de oferta de trabalho ainda é pouco, mas infinitas vezes superior aos governos de Estado mínimo e concentração de renda máxima.

Naturalmente, os dados de emprego divulgados ontem pelo Ministério do Trabalho não tiveram a mesma repercussão das galhofas de outrora, contra a “marolinha”. O Brasil, com todos os erros (e acertos) de seu governo atual, foi dos primeiros no mundo a dar suculenta banana para a gran crise. E la nave va. Ver o texto dos ararazuis é risível: orgulhosos, prepotentes, vendo suas previsões apocalípticas ruírem como lama na chuva, são “obrigados” a desconversar sobre o tema. Piada.

Assis Valente já debochava desse tipo de comportamento nos anos vinte. Foi muito mal-ouvido. O realismo fantástico que cerca as ruas, as telas e o texto. Vivemos num mundo onde 90% das pessoas passam fome, e essa deve ser uma prioridade supra-religiosa, supra-social, até supra-humana se for o caso. Não adianta tratar a gente pobre do mundo como se fosse lixo. Só existe chance de evolução humana com atendimento a princípios de justiça social. Lembram dos “emergentes” da Barra, buscando conforto entre grades e prédios com nomes franco-ingleses? Pois é, a Linha Amarela chegou e, do outro lado, a Rocinha impera. Na porta do maravilhoso shopping, com sua patética Estátua Cover da Liberdade, dezenas de vendedores de churrasquinho, refrigerantes e vans piratas. Não há como fugir. Perda de tempo. Remoções? Trata-se do nazismo fracassado de Lacerda. A cidade precisa ser integrada. O Estado. O país.

“Pânico” e CQC estão dentre os que mais nos fazem rir no Brasil, por conta de seus diferenciados talentos. No entanto, é preciso reconhecer que os órfãos do frango a um real bateram com a cara na porta. O ventre na roleta. O trem já era.


II

Twitter. Faço parte. Divulgo meus blogs nele. Tentei trabalhar poemas curtos, limitados aos 140 caracteres da brilhante invenção; ainda não deu certo. Recebo recados, a maioria sem qualquer relevância. Envio frases de cronistas e poetas. Tem algum humor. É divertido. Pedi ajuda a meu amigo Ricardo Bolinha para que destrinchasse o que havia de útil ali. O trabalho está em andamento.

Engraçado quando você vê conhecidos com quem, há muito, não tem contato. Conhecer alguém no esplendor dos vinte anos e, agora, lê-lo(a) perto dos quarenta. Em dez chances, nove correspondem ao sujeito(a?) ter se tornado um verdadeiro pateta. Não me perguntem sobre estatísticas.

Tempos atrás, eu flavana nas ruas do Centro, munido de meus sensacionais bermudão e chinelos pelas nove da noite, quando encontrei um ex-chapa dos tempos de faculdade. Usava um terno vulgar, mas ostentava autoridade - o Brasil é uma terra onde um sujeito de terno se sente superior. Cinco minutos de conversa. O cara me olhava de cima a baixo. Perguntou se eu estava trabalhando; devia supor que não. Expliquei que, como meu trabalho é intelectual e plantonista, além de morar perto da labuta, posso tomar meu banho e colocar roupa de brasileiro para voltar às vielas. Convidei-o para um chope com nossos amigos de sempre, recusou; agora está “muito feliz com sua esposa e não tem tempo para atividades que não sejam com ela, exclusivamente”. Entendo a volúpia: anos sem atividade sexual. Não me disse, mas era fácil notar. Quem fala demais tem pouco a mostrar. Ou lembrar dos tempos da academia de ciências: “no kiss, no love, no sex, virgin forever!”. Falava do sucesso do emprego, das maravilhas de se dar aula em cursinhos e de como se impressionava ao rever antigos colegas da faculdade com, digamos, o “mesmo” aspecto de antes. Para mim, seria alívio: dose é encontrá-los humanamente piores do que antes. Não devia, mas falei.

O ônibus suburbano do sujeito demorava, o meu também. Cansado das baboseiras, dei a cartada final para me livrar da M.P.I. (mala pesada inarrastável):

- Vou pegar um táxi. Tem algum lugar onde fique melhor para você pegar tua condução?

Versão otimista:

- Puxa, creio que não. Aqui é o melhor lugar mesmo. Obrigado e boa sorte.

(Ufa! Me livrei.)

Vida real:

- Não tenho dinheiro para dividir a despesa do táxi e minha hipocrisia não me permite admitir isso. Uso terno, mas estou bem mais durango do que o camelô da esquina.

Dez reais para me livrar de um chato insuportável. Muito bem pago!

Na rua, dá para fazer isso. No Twitter, não. O sacripanta leu meia dúzia de crônicas, comprou um Paulo Coelho no encalhe, ouviu Maria Gadú (excelente cantora, aliás) e já sai pelos quatro cantos do mundo ostentando sua, bem, “entelectualidade”. Mantenho meu silêncio. A maravilhosa invenção internauta desfralda as bandeiras e, por isso, qualquer bobalhão se considera um novo Mainardiota (com toda justiça, por sinal, já que o parajornalista esquisitão de Ipanema não acrescenta absolutamente nada de importante à vida literário-acadêmica mundial – é apenas uma ararazul), com tudo de pior que isso possa significar.

O homo sapiens estragou o avião, estragou a camada de ozônio e usa a internet como verdadeira bostalhada. O problema está em nós? Claro.

Por falta de opção, continuo lá.

Twitter: o mais fantástico meio de comunicação mundial entre pessoas que não têm nada de importante a dizer.

Quando piorar, vira televisão!


III

“A televisão me deixou burro/ muito burro demais/ oi! oi! oi!/ agora todas coisas que eu penso/ me parecem iguais/ oi! oi! oi!... / oh! cride, fala prá mãe/ que eu nunca li num livro/ que o espirro fosse um vírus sem cura/ vê se me entende pelo menos uma vez criatura!/ oh! cride, fala prá mãe!... é que a televisão me deixou burro/ muito burro demais/ e agora eu vivo dentro dessa jaula junto dos animais...” (Fromer/ Belotto/ Antunes, 1985)


Paulo-Roberto Andel, 18/09/2009


http://tvmiscelanea.blogspot.com

3 comments:

  1. Sempre um prazer em te visitar, caro amigo!

    Adoro vir aqui.

    Beijokas

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  2. Meu amigo,
    o texto está sensacional.
    Você realmente se supera a cada nova investida, seja no campo das reflexões político-sociais, seja no campo dos seios e do ventre da mulher brasileira que passeia às margens de todas as mazelas da humanidade.

    Você é o melhor!

    Tem crônica nova lá no blog.
    (Lembrei do Sevé, nosso garçom preferido dos tempos de outrora.)

    bçs

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  3. Fala mestre um abraço concordo totalmente com o Nelson Borges. Você esta nota 10000000000. Um abração desculpa por domingo.

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