Monday, October 23, 2006

A praia vermelha

Era pequeno pedaço de escombros que habitava-me
Tardio, queria ser presença de um desajustado amor
Poderia ser indesejável morador se a tanto chegasse
Talvez um tento contra se de real importância fosse

Contudo, não era exatamente o caso que atingia-me
Nem a quem deu-me mão macia pela madrugada fria

Parecido mesmo, era com afecção que chama-se acne
Daquelas que não se espreme, apenas põe-se o creme
Deixa-se estar, secar até que o cravo e o pus morram
Sem marcas manchadas, sangue e nem rasgos de pele

Mais do que eu, éramos nós portadores de escombros
Em certo momento, notamos o que era desimportante

Fizemos dos pedaços espinhas, na vizinhança atlântica
Elas ficaram nuas, cruas, sem mais força de incomodar
Tornaram-se cacos pelos quais não apreço não havia
Incapazes do aprazível, atraente ou mesmo desejável

Viajando no coletivo urbano, seriam simples passageiros
Esperando o final do tempo, o fim da linha, breve adeus
Paralela era a lua oclusa entre nuvens parecendo lençóis
E nós, em silêncio, namorando horizonte negro brilhante

Removíamos certos cacos que nunca mais vão retornar
Espinhas que secaram e perderam-se, morreram tão sós
Ao passo em que nós, reticentes, confortáveis na baía
Formávamos juntos o barco de cruzar oceanos bravios

Do choro, restou apenas o prenúncio de nova alegria
Lagrimalegria do poeta Caetano, mais que pertinente
Corações perfeitos do poeta Renato, ali exatamente
O calor da mão macia que aludia ao melhor do amor


Paulo Roberto Andel, 23/10/2006

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