Paulo-Roberto Andel, 30/10/2009
Friday, October 30, 2009
Wednesday, October 28, 2009
Tuesday, October 20, 2009
LEVE / PROCURO
LEVE
e a palavra
leve
sugere que flana
pelo
breve:
a sutileza na tangente,
o anseio da secante,
o zênite da
r
e
t
a
permanente!
a palavra,
leve,
sugere a graça
dum boneco de neve –
tão leve quanto pluma
que voa ao vento
sem testemunhar
quem a desprendeu
num
momento
PROCURO
o progresso chegou ao meu bairro:
cenas de ordem e progresso
paredes e casas foram
derrubadas
e modificadas;
a rua, esburacada;
a pobreza, removida;
todavia
tudo parece tão longe
do que ainda
procuro
brilham o céu e o inferno
enquanto
o moderno
disputa espaço com
o eterno
e o efêmero manda lembranças
porque também é vida;
austero, ele reúne os outros,
mas todos permanecem
alheios
ao que ainda procuro
de um lado, os mortos;
de outro, os feridos –
em qualquer visada,
a solidão dos miseráveis;
meus olhos não sabem
disfarçar a frustração
de não ter encontrado
o que
procuro
frente ao ventre
que me cobiça,
a fartura dos seios,
a leveza da pele:
a beleza infinita que mora
na jovem ousada
na linda mulher amadurecida –
cada uma delas
traz um cântico
de imagens sedentas
de vida, tesão, desejos
enquanto uma outra vida
me oferta um amargo gracejo:
são todas distantes,
muito distantes
do que almejo
e procuro
bondade não é delírio
e o fascínio
não é bivaque
na mediocridade;
a cidade, rompida,
esconde seus rancores em festas,
folguedos
e armistícios;
não me furto a espiar por uma fresta
o meu temor redivivo:
ainda não estive frente à frente
com o que
ainda
procuro
suspiros de vida e morte,
presságios e agouros,
azar ou sorte;
medos e coragens
roçam faces nas ruas:
são veias abertas,
sofridas,
donde escorre o sangue
límpido,
o sangue bravio
que faz tambor
em meu peito –
e, por isso, reitera
i n t e n s a m e n t e
que ainda moro longe,
muito longe
do que procuro
banhado em mar salgado
de ilusões,
náufrago do real;
colosso sem grandeza nacional,
sem pecados
ou
religiões:
nas vias, as procissões
se agigantam
e saúdam o deus da vida nova,
do além prometido,
onde todos são bons
e tudo é perfeito –
mas tudo me parece
tão suspeito,
tão diferente,
que percebo subitamente
a ausência
do que procuro
e ainda procuro, procuro
p r o c u r o
Paulo-Roberto Andel, 20/10/2009
Friday, October 16, 2009
Thursday, October 15, 2009
RECORDANDO CACASO
Biscoitos finos de um dos maiores poetas da língua portuguesa.
3 Poemas
Cacaso (Antônio Carlos Ferreira de Brito)
Descartes
Não há
no mundo nada
mais bem
distribuído do que a
razão: até quem não tem tem
um pouquinho
Fatalidade
A mulher madura viceja
nos seios de treze anos de certa menina morena.
Amantes fidelíssimos se matarão em duelo
crepúsculos desfilarão em posição de sentido
o sol será destronado e durante séculos violas plangentes
farão assembléias de emergência.
Tudo isso já vejo nuns seios arrebitados
de primeira comunhão.
Lar doce lar
(para Maurício Maestro)
Minha pátria é minha infância:
por isso vivo no exílio
Cacaso (Antônio Carlos Ferreira de Brito) nasceu em Uberaba (MG), no dia 13 de março de 1944. Com grande talento para o desenho, já aos 12 anos ganhou página inteira de jornal por causa de suas caricaturas de políticos. Antes dos 20 anos veio a poesia, através de letras de sambas que colocava em músicas de amigos como Elton Medeiros e Maurício Tapajós. Seu primeiro livro, "A palavra cerzida", foi lançado em 1967. Seguiram-se "Grupo escolar" (1974), "Beijo na boca" (1975), "Segunda classe" (1975), "Na corda bamba" (1978) e "Mar de mineiro (1982). Seus livros não só o revelaram uma das mais combativas e criativas vozes daqueles anos de ditadura e desbunde, como ajudaram a dar visibilidade e respeitabilidade ao fenômeno da "poesia marginal", em que militavam, direta ou indiretamente, amigos como Francisco Alvim, Helena Buarque de Hollanda, Ana Cristina Cezar, Charles, Chacal, Geraldinho Carneiro, Zuca Sardhan e outros. No campo da música, os amigos/parceiros se multiplicavam na mesma proporção: Edu Lobo, Tom Jobim, Sueli Costa, Cláudio Nucci, Novelli, Nelson Angelo, Joyce, Toninho Horta, Francis Hime, Sivuca, João Donato e muitos mais. Em 1985 veio a antologia publicada pela Editora Brasiliense, "Beijo na boca e outros poemas". Em 1987, no dia 27 de dezembro, o Cacaso é que foi embora. Um jornal escreveu: "Poesia rápida como a vida".
Em 2002 é lançado o livro "Lero-Lero", com suas obras completas.
Os poemas acima foram extraídos da publicação "Inimigo Rumor 8", Viveiro de Castro Editora, Rio de Janeiro – 2000, págs. 06 a 19.
Fonte: http://www.releituras.com
3 Poemas
Cacaso (Antônio Carlos Ferreira de Brito)
Descartes
Não há
no mundo nada
mais bem
distribuído do que a
razão: até quem não tem tem
um pouquinho
Fatalidade
A mulher madura viceja
nos seios de treze anos de certa menina morena.
Amantes fidelíssimos se matarão em duelo
crepúsculos desfilarão em posição de sentido
o sol será destronado e durante séculos violas plangentes
farão assembléias de emergência.
Tudo isso já vejo nuns seios arrebitados
de primeira comunhão.
Lar doce lar
(para Maurício Maestro)
Minha pátria é minha infância:
por isso vivo no exílio
Cacaso (Antônio Carlos Ferreira de Brito) nasceu em Uberaba (MG), no dia 13 de março de 1944. Com grande talento para o desenho, já aos 12 anos ganhou página inteira de jornal por causa de suas caricaturas de políticos. Antes dos 20 anos veio a poesia, através de letras de sambas que colocava em músicas de amigos como Elton Medeiros e Maurício Tapajós. Seu primeiro livro, "A palavra cerzida", foi lançado em 1967. Seguiram-se "Grupo escolar" (1974), "Beijo na boca" (1975), "Segunda classe" (1975), "Na corda bamba" (1978) e "Mar de mineiro (1982). Seus livros não só o revelaram uma das mais combativas e criativas vozes daqueles anos de ditadura e desbunde, como ajudaram a dar visibilidade e respeitabilidade ao fenômeno da "poesia marginal", em que militavam, direta ou indiretamente, amigos como Francisco Alvim, Helena Buarque de Hollanda, Ana Cristina Cezar, Charles, Chacal, Geraldinho Carneiro, Zuca Sardhan e outros. No campo da música, os amigos/parceiros se multiplicavam na mesma proporção: Edu Lobo, Tom Jobim, Sueli Costa, Cláudio Nucci, Novelli, Nelson Angelo, Joyce, Toninho Horta, Francis Hime, Sivuca, João Donato e muitos mais. Em 1985 veio a antologia publicada pela Editora Brasiliense, "Beijo na boca e outros poemas". Em 1987, no dia 27 de dezembro, o Cacaso é que foi embora. Um jornal escreveu: "Poesia rápida como a vida".
Em 2002 é lançado o livro "Lero-Lero", com suas obras completas.
Os poemas acima foram extraídos da publicação "Inimigo Rumor 8", Viveiro de Castro Editora, Rio de Janeiro – 2000, págs. 06 a 19.
Fonte: http://www.releituras.com
Wednesday, October 07, 2009
TÃO/ TÃO OUTRO
CLIQUE NO POEMA-IMAGEM PARA MELHOR VISUALIZAÇÃO.
TÃO
TÃO
TÃO OUTRO
eu nunca fui tão outro/ para que deixasse de me ver no que faço ou penso/ eu nunca fui tão outro/ para trair as verdades que cortejo/ eu nunca fui tão outro/ para exercer seduções mentirosas, cobiça vazia ou desencanto atroz/ eu nunca fui tão nunca quando quase fui tão outro/ e, assim, estou debruçado em meu exagero do mesmo/ entre percalços e enganos/ prestes a mergulhar no infinito mar de fé/ no que ainda existe de compaixão e sinceridade/ no que ainda resiste da fidalguia e da solidariedade/ há um mundo somente/ e vejo a gente descrente/ tão solitária nas multidões/ tão rasa perante a profundidade da vida/ eu nunca fui tão outro/ para rasgar o que um dia escrevi/ e malversar outros corações/ eu nunca fui tão outro/ para desperceber o hoje, o novo, o agora/ eu nunca fui tão outro/ para estar por ora tão longe/ do que pensei na mocidade/ e que, hoje, faz papel de velha senhora
Paulo-Roberto Andel, 07/10/2009
Tuesday, October 06, 2009
A SANGUE-FRIO (UM IMPIEDOSO BLUES PARA A DECADÊNCIA)
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Para Truman Capote e Muddy Waters.
Paulo-Roberto Andel, 06/10/2009